Moody’s otimista com investimento da ENI em Moçambique
Lusa | cvt
18 de junho de 2017
A agência de notação financeira considerou, este domingo (18.06), que a assinatura da Decisão Final de Investimento da petrolífera italiana ENI em Moçambique é positiva do ponto de vista de crédito.
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A posição da Moody's foi tornada pública por meio da publicação de um comentário referente a assinatura da Decisão Final de Investimento (DFI) da petrolífera italiana ENI no projeto de extração de gás natural líquido (LNG, sigla em inglês), em Moçambique.
A agência de notação financeira considera que apesar de esperar que "o crescimento económico irá recuperar gradualmente ao longo dos próximos três a quatro anos, aproximando-se das médias históricas, o começo da produção e exportações do projeto do Coral Sul, bem como de outros projetos que começarão a produzir, vai alimentar um aumento substancial do crescimento".
Num 'comentário a um acontecimento relevante', que não constitui uma ação de 'rating' - a avaliação do país continua abaixo da recomendação de investimento, ou 'lixo', como é geralmente conhecido -, a Moody's aponta que "o projeto de 7 mil milhões de dólares [6,2 mil milhões de euros], cuja produção deverá começar em 2022, é positivo do ponto de vista do crédito porque beneficia a economia de Moçambique".
Retorno a longo prazo
Entre os principais benefícios, a Moody's sublinha "o aumento das receitas do Governo e das exportações, e assim das reservas em moeda estrangeira, mitigando duas áreas fulcrais da fraqueza da qualidade do crédito".
A assinatura do acordo, no entanto, "não vai aliviar o Governo dos problemas de curto prazo em servir a dívida, mas confirma o forte potencial do país na área do gás natural liquefeito".
Nos últimos anos, "o crescimento de Moçambique tem estado deprimido por causa do preço baixo das matérias-primas e de uma seca regional, bem como de constrangimentos orçamentais, mas a decisão de investimento do consórcio neste clima mostra que o Governo considerou dar proteção suficiente aos investidores para que a DFI ocorresse".
Com o início da produção em 2022, as receitas do Governo vão aumentar, "e esta melhoria na receita fiscal vai fornecer um apoio considerável na capacidade do Executivo servir a dívida".
Histórico do projeto da ENI
A 01 de junho, a ENI e o Presidente da República de Moçambique, Filipe Nyusi, realizaram uma cerimónia para assinalar o início oficial do projeto de extração de gás natural líquido.
O líder da ENI apontou o projeto Coral Sul como a maior decisão final de investimento do setor dos últimos três anos e que vai dar lugar à primeira plataforma de produção de gás natural líquido de África.
Tudo isto num projeto escrutinado por 15 parceiros de financiamento, pela petrolífera BP, que vai comprar toda a produção por 20 anos, e pela norte-americana Exxon que vai entrar no projeto.
Na base está uma área de exploração em que foram feitas as descobertas de gás natural mais importantes do mundo nos últimos 15 anos, concluiu.
A Eni East Africa (EEA) detém uma participação de 70% na Área 4, enquanto a Galp, a ENH e a Kogas detêm 10% cada.
Uma vez concluída uma transação já acordada entre a EEA e a Exxon Mobil, os interesses participativos a ENI e a Exxon Mobil devem ficar com 25% cada, cabendo 20% à CNPC, enquanto a Galp, a ENH e a Kogas continuarão a deter 10% cada.
A norte-americana Anadarko Petroleum também planeia um investimento significativo na Bacia do Rovuma com um projeto orçamentado em 15 mil milhões de dólares, mas cuja decisão final de investimento ainda não foi anunciada.
Faces de Tete e do carvão de Moçambique
A vida mudou na província de Tete desde a chegada de empresas multinacionais para explorarem o carvão. Os ventos da mudança trouxeram, para alguns, oportunidades para melhorar de vida; para outros, novas preocupações.
Foto: DW/Marta Barroso
Coque, o trabalhador
Coque tem 28 anos. Trabalha há quatro anos na empresa mineira britânica Beacon Hill. Lá, amarra lonas nos camiões que transportam o carvão até ao vizinho Malawi. Tal como muitos jovens na região, dantes Coque fabricava tijolos que vendia no mercado local. Mas hoje, diz, vive melhor. Por camião recebe 800 meticais, cerca de 20 euros, que divide com o colega que estiver com ele no turno.
Foto: Marta Barroso
Paulo, o diretor de operações da Vale
Apesar dos enormes incentivos fiscais de que gozam as empresas dos megaprojetos em Moçambique, como a brasileira Vale, Paulo Horta diz que um projeto de mineração como o de Moatize gera uma cadeia produtiva tão grande que a população local beneficia em grande medida com a sua vinda para Tete: através da criação de outras empresas, serviços, tributos gerados por terceiros e criação de empregos.
Foto: DW/Marta Barroso
Gomes António, vítima de maus tratos
Gomes António Sopa foi espancado e detido pela polícia na sequência da manifestação de 10 de janeiro de 2012, quando os habitantes de Cateme bloquearam a passagem do comboio que transportava carvão das minas até ao porto da cidade da Beira. Muitas das promessas feitas pela Vale, responsável pelo reassentamento de centenas de famílias, continuam por cumprir. Ainda hoje, Gomes António sente dores.
Foto: Marta Barroso
Duzéria, a curandeira
Os habitantes do Centro de Reassentamento de 25 de Setembro, no distrito de Moatize, queixam-se de que muitos aspetos culturais não foram respeitados durante o processo de reassentamento pelas empresas mineiras. A curandeira do bairro, por exemplo, diz que no planeamento do complexo não se teve em conta a construção de uma casa para o seu espírito.
Foto: Marta Barroso
Lória, a rainha
Provavelmente Lória Macanjo e a sua comunidade deverão ser reassentadas brevemente: a multinacional Rio Tinto está já a operar um mina de carvão em Benga, perto da sua aldeia, Capanga. Também aqui, debaixo da terra que herdou do pai, a empresa mineira descobriu carvão. Mas a rainha sabe do destino dos que já se mudaram e recusa-se a deixar a sua casa.
Foto: DW/Marta Barroso
Olivia, a cabeleireira
Olivia (esq.) tem 29 anos e veio em 2008 do seu país, o Zimbabué, fugindo à crise financeira que lá se vive. Tete é agora a terra das grandes oportunidades, tinham-lhe dito. Hoje, é cabeleireira no Mercado Primeiro de Maio e, tal como a amiga Faith (dir.) faz trabalhos de manicure. Diz que, por dia, consegue 500 a 1000 meticais, entre 15 e 25 euros. Com esse dinheiro consegue sustentar-se.
Foto: DW/Marta Barroso
Guta, o empresário
Ao todo, Guta emprega 130 homens nas áreas de carpintaria e construção civil na cidade de Tete. Diz que desde a chegada das grandes empresas à região não sentiu grandes alterações no seu negócio. Os projetos de mineração requerem quantidades às quais não consegue responder. Uma vez, conta, a Vale pediu que fornecesse, juntamente com outra carpintaria da cidade, 5000 portas em 60 dias.
Foto: DW/Marta Barroso
Canelo, o vendedor de amendoins
Canelo diz que tem 11 anos. E diz também que frequenta a segunda classe. Todas as tardes vende amendoins no centro de Tete. "Para ajudar a mãe que não tem trabalho." O pai também está desempregado. Canelo é uma de muitas crianças que vendem amendoins na cidade. Um saco pequeno fica por dois meticais, cerca de cinco cêntimos de euro, o maior custa cinco meticais, treze cêntimos de euro.
Foto: DW/Marta Barroso
Catequeta, o ativista
Manuel Catequeta mudou-se para Tete em 2001. O ativista dos direitos humanos sabe o que custa viver com a subida constante do custo de vida. O seu salário não lhe permite luxos. A sala de sua casa "de dia é sala, de noite vira quarto". Mas mudar de casa, para já, está fora de questão. Hoje em dia, uma boa casa na capital provincial passa dos 5.000 dólares, cerca de 4.000 euros, por mês.
Foto: DW/Marta Barroso
Júlio, o otimista
O músico Júlio Calengo vê oportunidades de negócio, agora que em Tete há tantas empresas novas. O seu objetivo é, em breve, montar uma empresa de limpeza: tanto nos escritórios das empresas mineiras como nos das firmas que entretanto apareceram na cidade. Interessados não vão faltar, diz Júlio. O que é preciso é ter criatividade e, claro, dinheiro.