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Música

Mornas e marrabentas aquecem "Festival Músicas do Mundo"

26 de julho de 2018

Depois de Porto Covo, entre 19 e 22 de julho, o Festival Músicas do Mundo (FMM) prossegue até sábado, dia 28, em Sines, na costa litoral alentejana. A DW, mais uma vez, acompanha o FMM, destacando as estrelas africanas.

Foto: FMM2018/M. Pires

Esta semana, em Sines, são várias as bandas africanas a passar pelo palco do Festival Músicas do Mundo (FMM), entre os mais de 50 concertos de músicos oriundos de 39 diferentes países em todos os continentes.

Às lendas que todos conhecem, como o agrupamento Bulimundo, de Cabo Verde, juntam-se alguns novos valores da música africana, como a cabo-verdiana Élida Almeida, que atuou esta quarta-feira (25.07) no palco do Castelo.

O FMM assinala, este ano, o seu vigésimo aniversário. A programação nestas duas décadas recaiu sempre sobre os ombros da equipa liderada por Carlos Seixas, diretor artístico e de produção.

"O Festival de Sines é, de há 20 anos para cá, o encontro de milhares e milhares de pessoas, que preservam ainda o verdadeiro significado do que é a tolerância, do que é diversidade e do que é o bem acolher o outro sem discriminar", afirma Seixas em entrevista à DW.

Mornas e marrabentas aquecem "Festival Músicas do Mundo"

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Estrelas conceituadas e novos talentos

O festival foi crescendo até hoje, envolvendo também a comunidade local. Carlos Seixas recorda, entre tantos, alguns dos músicos dos países lusófonos que passaram pelos palcos de Sines. Porque é impossível citar todos, destaca Waldemar Bastos, Paulo Flores e Nástio Mosquito (Angola), Hermínia e Mário Lúcio (Cabo Verde) ou ainda o agrupamento África Negra (São Tomé e Príncipe), sem se esquecer dos ritmos quentes da marrabenta de Moçambique.

"Já houve aqui representantes dos ritmos incontornáveis da marrabenta. Este ano, para esta edição, vieram os Timbila Muzimba, que são extremamente importantes naquilo que é a cultura dos povos de Moçambique", salienta o diretor artístico.

A orquestra com raízes nas províncias do norte e do centro de Moçambique atua esta quinta-feira à noite. Dos países africanos lusófonos, é de destacar ainda no sábado (28.07) o concerto do grupo Bulimundo, bem como da cantautora luso-cabo-verdiana, Sara Tavares, que atuam no último dia do festival na costa alentejana.

Grupo cabo-verdiano "FOGO FOGO" abrilhantou FMMFoto: DW/J. Carlos

"FOGO FOGO" em Porto Covo 

A plateia do "Músicas do Mundo" vibrou ao som da banda lusófona "FOGO FOGO", que atuou pela primeira vez na semana de arranque do festival em Porto Covo.

A banda de funaná nasceu há cerca de três anos e meio na Casa Independente, espaço cultural no coração do bairro do Intendente, em Lisboa. O grupo é constituído por cinco músicos de várias nacionalidades e faz uma homenagem aos ritmos cabo-verdianos.

"Inicialmente, começámos focados no funaná, até porque a ideia inicial era fazer bailes com o funaná", lembra o vocalista e guitarrista do grupo Danilo Lopes. "Mas depois fomos desenvolvendo a ideia e andando pela estrada, tocando outros ritmos africanos que nos são gratos também."

Depois de uma exibição recente na Alemanha, estar nos 20 anos do FMM Sines "é uma honra", acrescenta o teclista João Gomes.

"Todas as edições deste festival, de uma forma geral, têm muitos artistas que nos interessam e que nos inspiram. Por exemplo, está cá o Bulimundo, que é uma das nossas principais referências. A própria Sara Tavares, da qual também somos grandes fãs, a Élida Almeida…"

Ritmos cabo-verdianos ao rubro

Em entrevista à DW África, a cabo-verdiana Élida Almeida, nascida em 1993, na ilha de Santiago, diz que a música que faz é "resultado de uma mistura".

"Todos os dias ando a ouvir músicas e estilos diferentes, de países diferentes. Como gosto de me aventurar, há ainda muitos estilos que oiço e que me fascinam. Gostaria de me sentir um pouco mais dentro desses estilos para ver no que é que daria. Ando sempre a querer experimentar coisas novas", afirma.

E estas aventuras rítmicas não deixam de ter um significado, acrescenta: "O que sempre tentei fazer desde o primeiro single é colar boas mensagens a ritmos que podem ser dançantes". Há muitas músicas que por detrás de um belo ritmo e uma bela melodia têm uma mensagem muito forte a passar. Todas as pessoas que ouvem o [meu] disco no final pensam: o que é que eu posso fazer pelo meu país, qual é o meu papel nesse quotidiano. E acho que conseguimos."

Sara TavaresFoto: Günther Klebinger

A portuguesa Sara Tavares estreou-se nesta edição do FMM Sines, no início de uma nova fase da sua carreira. Tocou no palco do Castelo alguns dos temas do seu mais recente álbum "Fitxadu" (2017). A cantora compositora, filha de pais cabo-verdianos, fez-se acompanhar de alguns dos melhores músicos dos países africanos de fala portuguesa, que considera ser parte da sua família.

Em conversa com a DW, a cantautora disse que estar neste festival é a reafirmação de que há músicos africanos ou de origem africana com valor e talento. "Já toquei fora em muitos festivais do género. Mas acho que Portugal sofre de um problema que é sermos reconhecidos lá fora e só depois cá dentro", afirmou. "Às vezes dá-se mais valor às coisas importadas, mas também cá dentro há muita música exótica. É mais a necessidade de reconhecer isso nos músicos que estão cá dentro, e nós também afirmarmo-nos como tal", acrescentou.

Sara Tavares fala numa espécie de encontro: "encontrei-me com o festival de Sines e o Festival de Sines encontrou-se comigo, finalmente".

Morna a património mundial?

A cantora também apoia a ideia de elevação da morna a património mundial. "É uma música com grande classe e com uma profundidade enorme e deve ser reconhecida tal como o fado, a bossa nova. Dou toda a minha força, toda a minha vibração para que seja aceite".

A grande noite na reta final do Festival de Sines esteve nas mãos do grupo cabo-verdiano fundado em 1978, no interior da ilha de Santiago. Considerada uma das bandas lendárias na história da música de Cabo Verde, o Bulimundo levou o funaná até as zonas urbanas e à diáspora cabo-verdiana espalhada pelo mundo. É neste ambiente que tocaram muitos dos temas conhecidos do grande público. Isto depois da conversa com a DW, Silvestre Alfama (vulgo Silva), o mais velho do grupo, que aplaudiu a oportunidade de terem participado neste evento em Sines, por intermédio de um convite de Carlos Seixas, diretor de produção do FMM Sines.

Silva também apoia o projeto de candidatura da morna a património imaterial da UNESCO, mas considera que o funaná também tem potencial para um dia vir a entrar nesta classificação universal. "A morna e o funaná são a mesma moeda. Cada uma é a face da outra, porque em Cabo Verde as pessoas acham que o funaná é apenas o herdeiro africano. Mas isso, entretanto, não é verdade. O funaná tem muito do pai, que é o português. Os músicos tradicionais tocavam ou quase todos tocam bem as músicas daqui de Portugal quando querem, para além do funaná. Isso mostra, e acredito, que foi a mistura das duas coisas que deu origem ao funaná".

Élida Almeida, jovem talento cabo-verdiano, atua em SinesFoto: FMM2018/M. Pires

Cores, capulanas, comes e bebes...

O público do FMM não se interessa só pela qualidade da música e dos músicos que pisam os palcos em Porto Covo e Sines.

Augusta Andrade e o marido moçambicano, por exemplo, são uma presença constante no festival, já lá vão aproximadamente cinco anos. Estão num quiosque com o projeto "Gosto D'África", inspirado em produtos feitos com tecidos africanos, entre os quais a capulana, "porque as pessoas aqui gostam muito dos padrões africanos, da cor", afirma Augusta em conversa com a DW.

"Os tecidos e as cores têm a ver também com o tipo de música que há cá, neste festival."

Que significado têm para Augusta Andrade estes 20 anos do festival de Sines? "Quer dizer que as pessoas continuam a gostar de música diferente, não só daquela música comercial que passa sempre na rádio", responde.

Em Sines, a gastronomia africana também já tem lugar cativo, duas décadas depois: Hoje, até se faz concursos de pratos típicos, entre eles a cachupa (de Cabo Verde) ou a muamba de galinha (de Angola).

E ainda há um "mundo imenso" para ser explorado, segundo o diretor artístico do festival, Carlos Seixas: "A Sines ainda veio uma ínfima parte daquilo que é a criatividade extraordinária dos povos africanos, não só subsaarianos mas também do norte de África."

"Sinceramente, acho que é de tal maneira inesgotável o manancial de culturas, de povos e de expressões musicais que me sinto à vontade para dizer que as novas gerações, que vão continuar este festival, vão ter um imenso leque de opções, para trazerem muitos músicos novos de extraordinária qualidade", conclui Seixas.

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