Morreu o Papa Francisco
21 de abril de 2025
O Papa Francisco morreu esta segunda-feira (21.04), aos 88 anos, um dia depois de ter feito uma aparição na Praça de São Pedro no Domingo de Páscoa, informou o Vaticano em comunicado.
"Esta manhã, às 7h35, o bispo de Roma, Francisco, regressou à casa do Pai", disse o cardeal Kevin Farrell no comunicado publicado pelo Vaticano no seu canal Telegram.
Ele foi o primeiro Papa da América Latina e o primeiro jesuíta a dirigir a Igreja Católica. Nunca antes um líder da Igreja tinha escolhido este nome programático: Francisco. Porque Francisco fazia lembrar São Francisco de Assis (1182-1226).
Este filho de comerciante renunciou a todas as riquezas, sentiu-se chamado por Jesus para uma vida de pobreza radical e fundou a ordem franciscana com este espírito. O nome papal Francisco não se assemelha, portanto, ao esplendor dos palácios papais nem ao papel de chefe da Igreja e do Estado do Vaticano.
Para o argentino Jorge Mario Bergoglio, eleito Papa pelos cardeais em 2013, a escolha do nome foi o seu programa: defendeu os refugiados e os sem-abrigo como nenhum outro papa antes dele e lutou pela proteção da criação e do clima. Faleceu após quase doze anos no cargo. Com 88 anos, era o segundo papa mais velho da história.
Discurso incendiário
Antes da eleição papal de 2013, Bergoglio tomou a palavra num "pré-conclave”, o primeiro do género, em que os cardeais discutiram o estado da Igreja. Neste "discurso incendiário”, apelou a uma "ousada liberdade de expressão” na Igreja. A Igreja não deveria girar em torno de si própria.
A força deste discurso fez parte do filme de Wim Wenders "Papa Francisco: Um homem de palavra” de 2018. Também aí, o chefe da Igreja utilizou um discurso compreensível para promover a proximidade da Igreja às pessoas marginalizadas. Desde o início, o Papa "dos confins da terra”, como se apresentou na sua primeira aparição em 2013, dirigiu-se sobretudo aos excluídos.
Repetidamente Francisco mostrou-se um duro crítico da globalização e do capitalismo. Os seus discursos políticos mais fortes foram proferidos nos seus primeiros anos de papado. Atuava como advogado dos pobres e do Sul global: em 2014, perante o Parlamento Europeu em Estrasburgo, em 2015, perante o Congresso dos EUA em Washington e perante as Nações Unidas em Nova Iorque. Francisco falou de uma "Europa envelhecida e oprimida” e de um "consumismo desenfreado”.
"A exclusão económica e social é uma negação completa da fraternidade humana e um ataque extremamente grave aos direitos humanos e ao ambiente”, lamentou na Assembleia Geral da ONU em setembro de 2015.
Francisco exortou a comunidade global a implementar reformas rapidamente e a fazer mais nas áreas da ajuda ao desenvolvimento e da proteção do clima. Dedicou a sua encíclica mais importante, "Laudato Si", de 2015, a este tema. Esta carta doutrinária para a preservação da criação parece uma acusação política - mas raramente foi ouvida. Em 2023, Francisco escreveu uma nova carta clara sobre o assunto, intitulada "Laudato Deum". Quanto mais tempo passava no cargo, mais impaciente parecia este Papa.
Viajar até os pobres
As mais importantes das suas 47 viagens ao estrangeiro levaram-no à Ásia, África, América Latina e Arábia. Francisco procurou sempre estar próximo dos pobres, parando nos bairros de lata e convidando as pessoas a entrar. Na Europa, os seus destinos eram, em geral, na periferia do continente rico: Albânia ou Roménia, por exemplo.
A China e a Rússia, países jamais visitados por um Papa, continuaram também fora da agenda do 266º Bispo de Roma. Mesmo muitos meses depois do ataque russo à Ucrânia, em fevereiro de 2022, eram palpáveis os seus esforços para estabelecer um diálogo com o chefe da Igreja Ortodoxa Russa e Patriaca de Moscov. Tanto Francisco como Cirilo tinham-se encontrado em Cuba em 2016. Tendo em conta a agressão maciça da Rússia, isso já não era possível.
No seio da Igreja, o Papa jesuíta foi recebido com enormes expectativas. Antes dele, a liderança da Igreja tinha seguido um rumo conservador durante décadas e aumentado a centralização. No entanto, muitas esperanças em relação a Francisco foram goradas. Mas, pelo menos, ele promoveu debates abertos: Antes de Francisco, os sínodos no Vaticano, estes grandes debates que duravam até quatro semanas, eram em grande parte dias de entediantes reuniões com a leitura de manuscritos previamente preparados.
Com Francisco, as pessoas voltaram a falar e a discutir. Mas muitos sentiram a falta de mudanças concretas após o Grande Sínodo Mundial sobre a Sinodalidade da Igreja, que terminou em 2024, e que ele talvez não tenha tido a coragem de efetuar. Ele queria, como disse uma vez, "agitação” na Igreja. Geriu uma grande reforma da Cúria, o aparelho do Vaticano, que entrou em vigor em 2023 e reorganizou o governo do Papa. Nos seus últimos meses, colocou duas religiosas no topo de ministérios do Vaticano, os chamados dicastérios. Só os cardeais trabalham efetivamente nestes ministérios.
Ao longo de todo o seu papado, o argentino teve de lidar com casos de abuso sexual em grande parte da Igreja Católica Mundial e, repetidamente, com o clientelismo e a intriga no Vaticano. Francisco, que por vezes proclamou em voz alta a "tolerância zero” para com os abusos e o seu encobrimento, desiludiu muita gente com algumas das suas decisões. Apesar de ter destituído dezenas de bispos em todo o mundo nos seus últimos anos de vida, Francisco nem sempre arcou pessoalmente com as consequências. E parecia ter dificuldade em tomar medidas contra suspeitos de crimes no seu ambiente imediato.
Proximidade com judeus e muçulmanos
O que ficará como legado é a sua nova abordagem, enquanto Papa, aos judeus e aos muçulmanos. Francisco gostava de se apresentar como um "irmão bispo”. Assim, o argentino também se encontrou com representantes de outras religiões monoteístas.
Francisco foi o primeiro Papa a visitar a Península Arábica. E fê-lo várias vezes. Em Abu Dhabi, em 2019, assinou um documento político excecional com líderes muçulmanos e representantes de outras igrejas. E, em 2021, deslocou-se ao Iraque para promover o diálogo e a fraternidade entre religiões entre os xiitas. Quanto mais tempo Francisco esteve no cargo, mais intensos se tornaram os seus contatos com o Islão.
Em comparação, as suas palavras claras sobre a situação da população civil na Faixa de Gaza causaram alguma deterioração nos laços com o lado judeu. Francisco condenou rapidamente o terror do ataque promovido pelo grupo islamista Hamas, a 7 de outubro de 2023 e, mais tarde, apelou repetidamente à libertação dos reféns israelitas. No entanto, também ficou abalado com os relatos da pequena comunidade cristã da cidade de Gaza.
Desde 2021, os problemas físicos vinham afetando-o cada vez mais. Francisco teve de ir várias vezes ao hospital e foi submetido a operações sob anestesia geral. Em 2022, foi visto pela primeira vez numa cadeira de rodas e, mais recentemente, quase sempre. Os casos de cancelamentos de compromissos por motivos de saúde ou de funcionários que liam os seus discursos preparados eram cada vez mais frequentes. O "Ano Santo”, que inaugurou em dezembro de 2024, era-lhe muito caro.
Quanto mais envelhecia, mais se faziam sentir as consequências da pandemia do coronavírus e mais dividido por conflitos parecia o mundo, mais este Papa tornava-se um conselheiro. Francisco sozinho na escura e chuvosa Praça de São Pedro, nos dias da pandemia do coronavírus, quase implorando a Deus perante o sofrimento global - esta cena antes da Páscoa de 2020 continua a ser uma das imagens mais impressionantes do seu pontificado.