Morreu Denis Goldberg, ex-companheiro de luta de Mandela
Robert Turner | AFP | tms
30 de abril de 2020
O ativista Denis Goldberg foi um dos colegas mais próximos de Nelson Mandela na luta contra o apartheid na África do Sul. Ele passou 22 anos na prisão e foi o único branco a ser condenado ao lado de Mandela.
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Denis Goldberg morreu aos 87 anos na noite de quarta-feira, segundo o comunicado divulgado pela família do ativista esta quinta-feira (30.04).
"Sua vida foi bem vivida na luta pela liberdade na África do Sul", afirma o comunicado da família, citado pela agência France Press.
Goldberg passou 22 anos numa prisão só para brancos após ser detido junto com Mandela e outros ativistas, incluindo Walter Sisulu, Govan Mbeki e Andrew Mlangeni, em 1964.
Em 2016, durante uma homenagem em Londres, o ativista sul-africano disse que "há um longo caminho a percorrer" nas relações raciais na África do Sul. "A segregação racial foi forjada na mente de todos os sul-africanos", disse ele.
Uma vida de ativismo
Goldberg, engenheiro civil por formação, envolveu-se na luta armada do Congresso Nacional Africano contra o regime do apartheid em 1961, quando foi recrutado para a ala armada secreta do movimento. Lá, suas habilidades de engenharia foram úteis na criação de armas e materiais explosivos.
Em entrevista à DW, que concedeu na Cidade do Cabo em janeiro deste ano, Goldberg recordou o seu recrutamento. "Nelson Mandela disse que estava a criar um exército ilegal. [Ele disse], Denis, você tem o treinamento técnico. Você sabe como construir pontes. Você pode explodí-las. Você se juntará a nós?"
Goldberg foi considerado culpado por traição e sabotagem nos julgamentos de Rivonia.
O que disse Mandela quando saiu da prisão?
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"Há momentos em que acordo no meio da noite a me perguntar onde estou", disse Goldberg à DW. "Estou na prisão ou estou a pensar na prisão? 22 anos são uma grande parte da vida. Mas valeu a pena".
Exílio
Quando foi libertado em 1985, aos 52 anos, seguiu com a sua esposa para o exílio em Londres. Goldberg representou o ANC nas Nações Unidas em Nova Iorque e, em 2002, após a morte da mulher, ele retornou à África do Sul.
Na recente entrevista à DW, ele alertou que a África do Sul e o mundo não devem esquecer o passado e deixar o racismo florescer.
"Temos que dizer que assumiremos a responsabilidade de pôr um fim a isso o máximo que pudermos. E vejo dia após dia pessoas de todo o mundo a dizer bobagens, vamos evoluir."
Ascenção e queda do apartheid
Nenhum outro meio reflete a história de forma tão impressionante quanto a fotografia. O Museum Africa, em Joanesburgo, mostrou numa grande exposição fotográfica a história de repressão e libertação da África do Sul.
Foto: Museum Africa
Fotografias como testemunhas
O Museum Africa de Joanesburgo exibiu 600 fotografias que contam a história de repressão e libertação da África do Sul. Em meados dos anos 50, membros da organização de direitos civis Black Sash (ou "Faixa Preta", na tradução literal) foram às ruas contra o regime do apartheid. A Black Sash foi fundada por mulheres brancas. Em 1990, Nelson Mandela chamou-a de "consciência da África do Sul branca."
Foto: Museum Africa
A câmera como arma
Peter Magubane, um dos mais famosos fotojornalistas negros, começou como motorista e mensageiro da lendária revista Drum. O alemão Jürgen Schadeberg treinou-o na câmara. Magubane tornou-se mundialmente famoso com imagens da revolta nas townships, áreas habitadas na época por não brancos. Muitas vezes, ele escondeu sua câmera das autoridades, em uma Bíblia oca. Na foto, é preso pelas autoridades.
Foto: Museum Africa, Johannesburg
O fim de Sophiatown
O regime do apartheid começou nos anos 50 a dividir áreas residenciais de acordo com as "raças". Como parte da lei Group Areas Act, o bairro multiétnico de Sophiatown, centro cultural da maioria negra, foi demolido e os moradores realocados à força. No lugar de Sophiatown, sugiu o Triumph, um bairro no qual eram permitidos exclusivamente moradores brancos.
Foto: Museum Africa
Comboios sobrelotados
Intermináveis eram as viagens que levavam os moradores dos subúrbios negros para os seus empregos ao centro da cidade. Muitos morreram durante as viagens nos comboios sobrelotados. Mas também havia momentos de espiritualidade. O fotógrafo Santu Mofokeng registou-os numa série impressionante de imagens. O papel da fé e da religiosidade ainda é um dos principais temas para a sociedade sul-africana.
Foto: Museum Africa, Johannesburg
Julgamento por Traição
Nesta fotografia de 1956, a imprensa acompanha o chamado Treason Trial ("Julgamento por Traição"), em que 156 sul-africanos foram acusados de trair o país. Um ano antes, eles haviam publicado a "Carta da Liberdade" que propagou uma derrota do apartheid. Entre os réus estava também Nelson Mandela. O processo resultou em uma solidariedade dos grupos de oposição contra todas as barreiras raciais.
Foto: Museum Africa, Johannesburg
Ícone da Luta de Libertação
Uma das imagens mais famosas da exposição do Museum Africa é hoje um monumento no centro de Soweto, em memória à revolta dos jovens estudantes que protestaram contra a política racial discriminatória em 1976. Hector Pieterson, de 12 anos, foi baleado na manifestação. O fotógrafo Sam Nzima captou a tragédia. A imagem ficou conhecida em todo o mundo.
Foto: DW/Ulrike Sommer
Luto e rancor
Volta e meia a exposição do Museum Africa mostra fotografias de luto coletivo. Os funerais tornam-se grandes eventos políticos, como o enterro dos Craddock Four, quatro membros do grupo da oposição United Democratic Front. Eles foram sequestrados e assassinados em 1985. Mais tarde, soube-se que o ato foi iniciado por oficiais das forças de defesa sul-africanas que agiam de forma oculta.
Foto: Rashid Lombard
Uma nova era
Uma nação esperançosa celebra o vencedor. Em 3 de maio de 1994, está claro: Nelson Mandela será o primeiro Presidente de uma África do Sul democrática. "Foi um momento incrível," lembra o fotógrafo George Hallet. Ele havia retratado exilados sul-africanos por 20 anos. Para acompanhar as primeiras eleições livres com sua câmera, Hallet voltou para sua terra natal.
Foto: George Hallett
Herança pesada dos homelands
Durante décadas, os "homelands" ou "bantustões", as áreas reservadas à população de cor e com alguma autonomia governamental, foram sofrendo cortes: de acesso à educação e cuidados de saúde ao progresso económico. 20 anos após as primeiras eleições livres, muitas regiões ainda lutam contra as consequências da segregação racial territorial.