Morreu Ebrahim Ismail Ebrahim, ativista contra o apartheid
AFP | Lusa
6 de dezembro de 2021
Ebrahim Ismail Ebrahim passou parte da sua vida na prisão de Robben Island, onde se cruzou com Nelson Mandela. O ex-combatente morreu esta segunda-feira (06.12) de uma doença prolongada na sua casa em Joanesburgo.
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De acordo com o Congresso Nacional Africano (ANC, na sigla em inglês), o ex-combatente morreu na sua casa em Joanesburgo, aos 84 anos. O partido no poder na África do Sul saudou "um membro de longa data do ANC, um patriota que serviu o seu país em muitas funções com humildade, dedicação e distinção”. Conhecido como "Ebie”, nasceu a 1 de julho de 1937, na Índia e teve um passado semelhante ao dos grandes nomes na luta contra o domínio branco racista na África do Sul.
A sua vida seguiu o curso do movimento de liberação, começando com protestos não-violentos, eventualmente tornando-se um combatente de guerrilha, tendo estado preso em Robben Island duas vezes e acabando por ter um lugar no governo democrático, em 2009.
Os primeiros passos
Quando ainda era uma criança, viu o seu pai ser preso duas vezes por quebrar leis que preveniam indianos de viajar livremente dentro da África do Sul. Quando tinha 13 anos já participava em políticas de liberação. Inspirado pela resistência pacifista de Mahatma Gandhi na India, Ebrahim compareceu em discursos de Albert Luthuli, o líder do ANC que, em 1960 se tornou o primeiro africano a ganhar o prémio Nobel da Paz. Tentou juntar-se a campanhas de protesto, mas os partidos de libertação não o permitiram devido à sua tenra idade.
Nelson Mandela e o combate ao apartheid
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Enquanto indiano, inicialmente Ebrahim não pôde juntar-se ao ANC. Em vez disso, juntou-se ao Congresso Indiano Natal e tornou-se um delegado no Congresso do Povo, em 1955. Essa reunião juntou ativistas de todas as "raças", o que possibilitou uma massiva consulta de como os sul-africanos queriam ser governados. Isto resultou na Carta da Liberdade, um documento fundacional que sustenta a democracia sul-africana.
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De ativista a combatente
Como aconteceu a muitos outros no movimento, o massacre de Sharpeville, em 1960, mudou a perspetiva de Ebrahim relativamente à resistência pacífica. O ativista acabou por se tornar um combatente na ala armada da ANC, após ver a polícia abater 69 protestantes a tiro.
Ebrahim foi preso em 1963 em Robben Island, onde estudou com Mandela e partilhou a cela com o Jacob Zuma, que também se tornaria Presidente da República. "Na prisão fomos agredidos, passámos fome e frio, sendo expostos ao tempo frio amargo, que matou um dos meus amigos próximos”, escreveu mais tarde numa memória. Apesar das dificuldades, o ativista aproveitou o seu tempo na prisão para adquirir dois graus universitários.
Ebrahim foi libertado em 1991 e teve um lugar no Parlamento, nas primeiras eleições democráticas. Em entrevista à AFP, em junho de 2021, disse que estava preocupado porque os frutos da democracia não tinham sido divididos de forma igual, apontando à pobreza extrema e desemprego.
Ascenção e queda do apartheid
Nenhum outro meio reflete a história de forma tão impressionante quanto a fotografia. O Museum Africa, em Joanesburgo, mostrou numa grande exposição fotográfica a história de repressão e libertação da África do Sul.
Foto: Museum Africa
Fotografias como testemunhas
O Museum Africa de Joanesburgo exibiu 600 fotografias que contam a história de repressão e libertação da África do Sul. Em meados dos anos 50, membros da organização de direitos civis Black Sash (ou "Faixa Preta", na tradução literal) foram às ruas contra o regime do apartheid. A Black Sash foi fundada por mulheres brancas. Em 1990, Nelson Mandela chamou-a de "consciência da África do Sul branca."
Foto: Museum Africa
A câmera como arma
Peter Magubane, um dos mais famosos fotojornalistas negros, começou como motorista e mensageiro da lendária revista Drum. O alemão Jürgen Schadeberg treinou-o na câmara. Magubane tornou-se mundialmente famoso com imagens da revolta nas townships, áreas habitadas na época por não brancos. Muitas vezes, ele escondeu sua câmera das autoridades, em uma Bíblia oca. Na foto, é preso pelas autoridades.
Foto: Museum Africa, Johannesburg
O fim de Sophiatown
O regime do apartheid começou nos anos 50 a dividir áreas residenciais de acordo com as "raças". Como parte da lei Group Areas Act, o bairro multiétnico de Sophiatown, centro cultural da maioria negra, foi demolido e os moradores realocados à força. No lugar de Sophiatown, sugiu o Triumph, um bairro no qual eram permitidos exclusivamente moradores brancos.
Foto: Museum Africa
Comboios sobrelotados
Intermináveis eram as viagens que levavam os moradores dos subúrbios negros para os seus empregos ao centro da cidade. Muitos morreram durante as viagens nos comboios sobrelotados. Mas também havia momentos de espiritualidade. O fotógrafo Santu Mofokeng registou-os numa série impressionante de imagens. O papel da fé e da religiosidade ainda é um dos principais temas para a sociedade sul-africana.
Foto: Museum Africa, Johannesburg
Julgamento por Traição
Nesta fotografia de 1956, a imprensa acompanha o chamado Treason Trial ("Julgamento por Traição"), em que 156 sul-africanos foram acusados de trair o país. Um ano antes, eles haviam publicado a "Carta da Liberdade" que propagou uma derrota do apartheid. Entre os réus estava também Nelson Mandela. O processo resultou em uma solidariedade dos grupos de oposição contra todas as barreiras raciais.
Foto: Museum Africa, Johannesburg
Ícone da Luta de Libertação
Uma das imagens mais famosas da exposição do Museum Africa é hoje um monumento no centro de Soweto, em memória à revolta dos jovens estudantes que protestaram contra a política racial discriminatória em 1976. Hector Pieterson, de 12 anos, foi baleado na manifestação. O fotógrafo Sam Nzima captou a tragédia. A imagem ficou conhecida em todo o mundo.
Foto: DW/Ulrike Sommer
Luto e rancor
Volta e meia a exposição do Museum Africa mostra fotografias de luto coletivo. Os funerais tornam-se grandes eventos políticos, como o enterro dos Craddock Four, quatro membros do grupo da oposição United Democratic Front. Eles foram sequestrados e assassinados em 1985. Mais tarde, soube-se que o ato foi iniciado por oficiais das forças de defesa sul-africanas que agiam de forma oculta.
Foto: Rashid Lombard
Uma nova era
Uma nação esperançosa celebra o vencedor. Em 3 de maio de 1994, está claro: Nelson Mandela será o primeiro Presidente de uma África do Sul democrática. "Foi um momento incrível," lembra o fotógrafo George Hallet. Ele havia retratado exilados sul-africanos por 20 anos. Para acompanhar as primeiras eleições livres com sua câmera, Hallet voltou para sua terra natal.
Foto: George Hallett
Herança pesada dos homelands
Durante décadas, os "homelands" ou "bantustões", as áreas reservadas à população de cor e com alguma autonomia governamental, foram sofrendo cortes: de acesso à educação e cuidados de saúde ao progresso económico. 20 anos após as primeiras eleições livres, muitas regiões ainda lutam contra as consequências da segregação racial territorial.