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Uma vítima ganesa da explosão de pedidos de asilo no Brasil

26 de setembro de 2024

Morte recente de um cidadão ganês num aeroporto de São Paulo trouxe à tona o aumento de pedidos de refúgio no Brasil. O caso levou também o Ministério da Justiça a mudar as regras sobre passageiros em trânsito no Brasil.

Aeroporto Internacional de São Paulo
À espera do processamento do seu pedido no aeroporto, o cidadão ganês Evans Ossêi Ússu acabou por falecer no localFoto: picture-alliance/ZUMA/Fepesil

O ganês Evans Ossêi Ússu tinha como destino final o México. Foi deportado e, tendo feito escala no Aeroporto Internacional de Guarulhos, em São Paulo, no Brasil, para lá foi reenviado. Evans viajava para fazer uma cirurgia na coluna, mas como não conseguiu entrar no México, solicitou refúgio no Brasil com este propósito a 8 de agosto.

À espera do processamento do seu pedido no aeroporto, o seu quadro de saúde piorou e, quando foi encaminhado ao hospital, já era tarde demais. O ganês faleceu a 13 de agosto.

Morte recente do cidadão ganês Evans Ossêi Ússu trouxe à tona o aumento de pedidos de refúgio no BrasilFoto: privat

A sua prima, Priscilla Ossêi Wussu, contou à DW que Evans pediu quatro vezes para ser levado para um hospital.

"Sabe quando é que o levaram para o hospital? Quando as pessoas pretas no aeroporto começaram a manifestar-se. Ele disse ao meu tio que estavam a fazer manifestações em massa, por isso estavam a prepará-lo para o hospital. E essa foi a última conversa. Não voltámos a saber nada dele. As autoridades ignoraram o meu primo. Isto é racismo a sério", lamenta.

Contactado pela DW, o aeroporto disse que passageiros que aguardam admissão pela Polícia Federal ficam sob os cuidados das companhias aéreas até à conclusão do processo. Informou ainda que, ao ser acionada, a sua equipa providenciou imediatamente atendimento e encaminhou o passageiro ao Hospital Geral de Guarulhos.

Já a companhia aérea LATAM informou que, no dia 11 de agosto, quando Evans passou mal, solicitou atendimento ao serviço médico do aeroporto, tendo acompanhado a remoção e o internamento do passageiro e contactado as autoridades.

Quando questionada pela DW, a Polícia Federal não entrou em detalhes sobre o caso.

Ministério da Justiça altera regras

A seguir ao que aconteceu em São Paulo, o Ministério da Justiça determinou que qualquer "passageiro em trânsito que desembarcar na área internacional dos aeroportos, e que não tiver visto de entrada no Brasil, terá de seguir viagem para o destino final da sua passagem ou retornar à localidade de origem do voo".

Em nota, o Ministério justificou que o país tem sido "rota de organizações criminosas que atuam com contrabando de migrantes", que desistem do destino final e pedem refúgio no Brasil com o objetivo de "seguir rota rumo ao norte das Américas, principalmente os Estados Unidos e Canadá".

Ministério da Justiça determinou que qualquer "passageiro em trânsito que desembarcar na área internacional dos aeroportos, e que não tiver visto de entrada no Brasil, terá de seguir viagem para o destino final"Foto: picture-alliance/AE

O defensor público federal Murillo Ribeiro Martins considera a medida ilegal. "O próprio Estatuto dos Refugiados traz uma previsão que o facto de um migrante ter ingressado de forma irregular no país não é motivo para impedimento da solicitação de refúgio. A lei garante isso e os tratados internacionais que o Brasil assinou também garantem essa possibilidade de solicitar refúgio", explicou à DW.

Segundo a Polícia Federal, em 2021, a média anual de pedidos de asilo no aeroporto de Guarulhos era de 1.400. Até agosto deste ano foram registados 7.156 pedidos - ou seja, houve um aumento de mais de 500%.

Entre os processos de cidadãos de países africanos com origem em Guarulhos e atualmente em andamento, somalianos, camaroneses, ganeses e etíopes são a maioria.

"Precisamos de justiça"

Segundo Murillo Ribeiro Martins, a Defensoria abriu uma ação cível para apurar as responsabilidades de todos os envolvidos no caso de Evans. As polícias civil e federal abriram inquéritos criminais.

Priscilla Ossêi Wussu, prima de Evans Ossêi Ússu, pede justiçaFoto: privat

"E é justamente com esse objetivo, de se pensar na responsabilização dos culpados e consequentemente de trazer uma reparação e eventualmente se pensar em medidas de não repetição. Na visão da Defensoria Pública, o falecimento do senhor Evans é algo que poderia ter sido evitado, mas facto é que o encaminhamento dele ao hospital se deu de forma tardia", afirma o defensor público.

Evans teve uma infeção urinária que evoluiu para infeção generalizada. Priscilla Ossêi Wussu afirma veemente que a família irá pedir uma reparação.

"Precisamos de justiça. Não queremos que isto volte a acontecer a ninguém. Também precisamos de uma indemnização para a família, porque era ele que tomava conta dos seus irmãos. Ele adotou três crianças da sua irmã mais velha", destacou.


 

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