O único centro neurocirúrgico de tratamento da doença no país suspendeu cirurgias em abril passado. Unidade de cariz filantrópico atende mais de 70 pacientes por semana.
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O projeto de tratamento da doença caracterizada por um aumento na quantidade de água no interior da caixa craniana, existe há mais de dez anos. Em 2015, foi fundado o Centro Neurocirúrgico e de Tratamento da Hidrocefalia (CNCTH) que atende doentes de várias partes do país, por ser o único de referência em Angola.
A falta de apoio direto do Governo angolano preocupa a direção da instituição. O neurocirurgião José Sousa, coordenador do centro, esclarece as razões do fim das intervenções cirúrgicas.
"Fizemos uma paragem estratégica, digamos assim. Primeiro porque há escassez de material de grande porte que usamos para intervenção à hidrocefalia, mas também em solidariedade com as mães e pacientes carentes que temos recebido todos os dias aqui, que não têm condições para coparticipar com o valor mínimo que solicitamos para a intervenção cirúrgica," explica.
Questões financeiras
No atual Orçamento Geral do Estado (OGE), segundo o médico, há uma rubrica para o tratamento da hidrocefalia. Mas, passados já dois trimestres deste ano, a verba ainda não foi cabimentada ao projeto.
Para uma cirurgia, cada paciente participa com um valor de mínimo de 150 mil kwanzas (ou 384 euros). Mas nem todas as famílias conseguem pagar esta quantia. Por isso, a direção do centro quer que as cirurgias sejam gratuitas. Uma intenção que só pode materializar-se com o funcionamento do Estado, diz José Sousa.
"Estamos a lutar para que haja gratuidade das cirurgias é assim que fizemos a paragem", garante.
"Começamos assim a advocacia, reuniões com o Ministério [da Saúde] e não só, mas, até aqui ainda não retomamos porque estamos ainda em falta material. O Ministério prometeu nos abastecer com material sempre que possível, desde que haja disponibilidade no estoque. Falamos na reunião e agora falta colocar em prática", revela ainda o médico.
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Filantropia na base do funcionamento
O centro depende da ajuda de algumas instituições e pessoas singulares que, às vezes, financiam a cirurgia de uma criança vítima de hidrocefalia. A maior dificuldade, segundo o coordenador, é o orçamento.
Os técnicos do centro trabalham como voluntários. Recursos humanos e materiais hospitalares gastáveis são as principais necessidades do centro localizado na zona do Kifica, comuna do Benfica em Luanda.
"Imagine um centro desse calibre a funcionar apenas com colaboradores, pessoas voluntárias que vêm aqui para dar o seu saber. Até quando é que podemos realmente reduzir a morte das crianças com a hidrocefalia? Um centro que fica todos dias parado e só trabalhamos quando a equipa está completa para ajudarmos as crianças", lamenta.
E já há mortes a registar desde a paralisação das intervenções cirúrgicas:
"Até agora, registamos 15 pessoas que perderam a vida nesta fase que estamos à espera do apoio, sem contar aquele que vão perdendo a quantidade de vida," descreve o médico.
"O tempo em que a doença vai ficando no corpo, não há outro tratamento que pode ser feito se não for a intervenção cirúrgica. Se operássemos no mês passado, talvez a qualidade de vida que dessas crianças seria melhor", conclui José Sousa.
Durante uma semana, a DW tentou obter uma reação do Ministério da Saúde, mas não obteve sucesso.
No interior do hospital de campanha de Macurungo na Beira
As estruturas do centro de saúde que é referência no atendimento de cerca de 35 mil pessoas na região foram severamente danificadas com a passagem do ciclone Idai. Hospital de campanha já atendeu dois mil pacientes.
Foto: DW/F. Forner
A rotina
O hospital de campanha nos arredores do centro de saúde Macurungo, na Beira, está a funcionar desde 24 de março. "Montamos um centro médico avançado com uma tenda para cirurgia e consultas, além de mais duas tendas para avaliação pós-parto das mães", descreve a médica infectologista Telma Susana Vieira Azevedo, que liderou por dois meses a equipa da Cruz Vermelha em Macurungo.
Foto: DW/F. Forner
Um passeio pelas tendas em Macurungo
Um enfermeiro da equipa da Cruz Vermelha caminha pelas tendas de lona do hospital de campanha gerido em parceria com a ONG Médicos do Mundo. Já foram realizadas mais de duas mil consultas, além de uma média de sete partos diários. Este hospital é referência no atendimento de 35 mil pessoas na região, onde as condições habitacionais ficaram muito debilitadas após a passagem do ciclone Idai.
Foto: DW/F. Forner
No interior do hospital destruído
A noite de 14 de março na Beira foi marcada pelos fortes ventos que arrancaram telhas, chapas e coberturas das casas e edifícios públicos. O hospital de Macurungo sofreu sérios danos estruturais. Mesmo assim, algumas áreas do edifício continuam a ser utilizadas. “Nosso objetivo é conseguir reconstruir o centro de saúde e só depois deixar a Beira”, diz a médica Telma Susana Vieira Azevedo.
Foto: DW/F. Forner
Balanço pós-Idai
Segundo dados do fundo de redução de desastres do Banco Mundial (GFDRR), Moçambique ocupa a terceira posição no ranking de países africanos mais expostos a múltiplos riscos associados às mudanças climáticas, como ciclones periódicos, secas, inundações e epidemias. Esta foto mostra o coração do hospital de campanha montado em um dos bairros que mais carecem de atenção à saúde.
Foto: DW/F. Forner
Os grandes desafios de Beira
Esta é uma foto aérea do hospital de campanha em Macurungo na Beira. Além da reestruturação de hospitais, as cidades afetadas pelo ciclone Idai também encaram os desafios de reconstrução de moradias, escolas e das infraestruturas urbanas. A ONU estima que o país necessite de pelo menos 200 milhões de dólares de ajuda internacional nestes três primeiros meses pós-ciclone.
Foto: DW/F. Forner
O estoque de medicamentos
Além de servirem como consultórios e locais de operação, algumas tendas do hospital de campanha foram construídas para armazenar equipamentos, medicamentos e demais suprimentos médicos. Nesta foto, o médico Luís Canelas opera um dos computadores que realiza exames de ultrassonografia. O hospital de campanha também realiza exames laboratoriais, como exames de sangue e testes de malária.
Foto: DW/F. Forner
Apoio à população
Em momento de descanso, o enfermeiro da Cruz Vermelha de Cabo Verde Mariano Delgado brinca com uma das pacientes no pátio externo. Estima-se que cerca de 400 mil crianças foram afetadas. "Precisamos fazer um trabalho mais ativo de equipas móveis para ir às populações deslocadas", diz Michel Le Pechoux, representante adjunto do UNICEF em Moçambique.
Foto: DW/F. Forner
Pulverização contra a malária
Homens uniformizados com luvas e protetores fazem a pulverização contra a malária em casas nas ruas de Búzi, a 150 km ao sul da Beira. Os casos de malária aumentaram e um mutirão tenta conter a proliferação do mosquito transmissor.
Foto: DW/F. Forner
Cadastro de pacientes
Esta é a tenda de triagem onde os pacientes são recebidos para a marcação de consultas. "Recebemos pacientes com doenças crónicas, hipertensão, doenças cardiovasculares e parasitárias, bem como pacientes que sofrem de desnutrição e portadores do VIH/SIDA", explica a infectologista da Cruz Vermelha portuguesa Telma Susana Vieira Azevedo.
Foto: DW/F. Forner
À espera de consultas
As salas de espera no centro de saúde Macurungo ficam diariamente superlotadas com pacientes que sofrem das mais variadas doenças. O cólera está sob controle, mas os casos de malária estão a ser acima do habitual. "As chuvas fazem com que haja poças d’água que são óptimas para a proliferação dos mosquitos havendo mais vetores para transmitir a doença", diz a infectologista Telma Susana Azevedo.
Foto: DW/F. Forner
Atendimento
Esta é uma das tendas do hospital de campanha Macurungo destinada às consultas médicas e atendimento aos pacientes. Nesta foto, o doutor Miguel e o enfermeiro de Cabo Verde Mariano Delgado dividem o espaço realizando atendimentos e curativos.
Foto: DW/F. Forner
Nos bastidores
Num momento de descanso após o almoço, estes três profissionais de saúde aproveitam a pausa no início da tarde antes de continuar com os atendimentos. Esta sala com macas também serve de refeitório e sala de reuniões. As equipas de médicos, enfermeiros e pessoal de apoio técnico trabalham diariamente sem cessar e se revezam a cada três semanas.