Robert Mugabe renunciou como Presidente do Zimbabué após 37 anos no poder, anunciou nesta terça-feira (21.11) o presidente da câmara dos deputados do país, Jacob Mudenda.
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Robert Mugabe já não é o Presidente do Zimbabué. O chefe de Estado de 93 anos, no poder desde 1980, renunciou ao cargo esta terça-feira. O anúncio foi feito pelo presidente do Parlamento, Jacob Mudenda, que leu a carta de demissão de Mugabe durante o debate de uma moção de censura contra o agora ex-governante.
"Eu, Robert Gabriel Mugabe (...) apresento formalmente a minha demissão de Presidente da República do Zimbabué, com efeitos imediatos", escreveu Mugabe na carta lida por Jacob Mudenda. "Demito-me voluntariamente. (...) Esta decisão foi motivada pelo (...) meu desejo de garantir uma transição do poder sem problemas, pacífica e não violenta", explicou ainda Mugabe.
As palavras foram recebidas com aplausos e vivas por parte dos deputados, que se encontravam reunidos desde o início da tarde para iniciar o processo de destituição do Presidente. “É um acontecimento histórico", disse um dos membros do Parlamento ouvido pela Associated Press.
"Temos muito a aprender com isto. O Presidente está preocupado com a paz e a segurança, os zimbabueanos estão preocupados com a paz e a segurança, todos queremos a mesma coisa: avançar e fazer do Zimbabué um grande país", acrescentou.
“Não me surpreende. Isto já se esperava há duas semanas. Foi o último prego no caixão. Ele fez muito por este país, merece descansar. É com certeza uma nova era para o Zimbabué”, disse outro deputado à agência de notícias.
População festeja na rua
A população recebeu com euforia o anúncio da resignação do Presidente, após quase quatro décadas na liderança desta nação africana.
Apesar de o país permanecer numa grave crise política desde a passada semana, quando os militares se rebelaram contra o chefe de Estado, a notícia chegou de surpresa. Gritos de alegria e buzinas de automóvel inundaram a capital, enquanto as pessoas se abraçavam espontaneamente na rua, segundo relatos das agências noticiosas internacionais.
Bandeiras do Zimbabué e gritos de "descanse em paz, descanse em paz" acompanhavam danças e cânticos, enquanto o sol descia sobra a capital zimbabueana.
Outras imagens mostravam crianças junto a tanques, e dançando ao som da música que ecoa pelas ruas da capital, Harare. Muitos populares também celebravam a intervenção do exército, que acelerou o afastamento de Mugabe.
Mnangagwa a Presidente?
Robert Mugabe vinha recusando todos os apelos nacionais e internacionais para abandonar o poder, mesmo depois de ter perdido a liderança do seu partido, a União Nacional Africana do Zimbabwe -- Frente Patriótica (ZANU-FP).
A atual crise política no Zimbabué começou quando os militares tomaram o controlo do país, depois de, na semana anterior, Mugabe, de 93 anos, ter despedido o seu vice-Presidente, Emmerson Mnangagwa. O ex-número dois assumiu o cargo de presidente do ZANU-PF e foi nomeado candidato às eleições presidenciais de 2018.
21.11 Mugabe demite-se - MP3-Mono
Segundo o líder da bancada parlamentar do partido no poder, Lovemore Matuke, Mnangagwa – que abandonou o país após a sua demissão – vai assumir a liderança do Zimbabué no prazo de 48 horas. Por sua vez, o presidente do Parlamento afirmou apenas que amanhã, quarta-feira, será nomeado o novo Presidente do país.
Futuro incerto
Quanto a Robert Mugabe, o futuro ainda é incerto, após a demissão. “É surpreendente, mas muitos zimbabueanos dizem ‘ele tem 93 anos, está nos últimos dias da sua vida, deixemos estar o passado’. Depois, há outros que consideram que Mugabe tem de sofrer as consequências, mas não querem arrastar um homem velho para o TPI – ‘deixem-no descansar em algum lado, mas não o queremos aqui no Zimbabué, porque ele lembra-nos aquilo que passámos’”, explica Joy Mabenge, coordenador regional para a África Austral da Coligação Crise no Zimbabué.
Entretanto, os Presidentes de Angola, João Lourenço, e da África do Sul, Jacob Zuma, anunciaram esta terça-feira – ainda antes da demissão de Mugabe - uma viagem amanhã, quarta-feira, até Harare, para avaliar a situação política no Zimbabué, como dirigentes da SADC.
De herói a vilão: a vida de Robert Mugabe
Depois de 37 anos no poder, chega ao fim a governação do humilde camponês que se tornou, aos olhos de muitos, um ditador. Robert Mugabe renunciou à Presidência do Zimbabué.
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Origens humildes
Nascido, em Harare, no seio de uma família humilde – o seu pai era carpinteiro e a sua mãe professora – Robert Gabriel Mugabe foi educado numa escola jesuíta até se tornar professor primário. Entre os anos de 1942 e 1960, exerceu na antiga Rodésia, Zâmbia e no Gana. Estudou Inglês, História, Educação e tirou uma licenciatura em Economia, na Universidade de Londres.
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Uma década detido
Aos 36 anos, Mugabe dá inicio à sua luta política focada na independência da Rodésia do Sul do Reino Unido. Funda a União Nacional Africana do Zimbabué – Frente Patriótica (ZANU-PF) em 1963 e, um ano depois, é preso. Em 1974, altura em foi libertado, Mugabe vai para Moçambique, onde liderou uma guerrilha contra o Governo de minoria branca de Ian Smith. Em 1979, Mugabe voltou ao seu país.
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Mugabe torna-se primeiro-ministro
Em 1980, Robert Mugabe é eleito primeiro-ministro da ex-Rodésia do Sul. Em abril deste ano, é declarada a independência do país que passa a chamar-se “Zimbabué”. Na altura, Mugabe afirmou: "O facto de os brancos nos terem oprimido no passado quando detinham o poder jamais poderá justificar que, hoje, os negros os oprimam só porque agora detêm o poder".
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Povo esperançoso
A subida de Mugabe ao poder trouxe a esperança. O líder do ZANU-PF prometeu melhorias na vida dos cidadãos. Começou por introduzir o ensino primário gratuito, assim como o acesso a assistência médica básica para os mais desfavorecidos, ainda que estas medidas apenas tenham chegado a uma parte da população. Mugabe foi mesmo comparado a Nelson Mandela.
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Chegam os massacres
Dois anos mais tarde, em 1982, Mugabe rompe a coligação do seu partido (ZANU-PF) com a União Popular Africana do Zimbábue (ZAPU) de Joshua Nkomo. Nesta disputa pelo poder, Nkomo teve o apoio das etnias Ndebele. É nesta altura que tem lugar um dos piores massacres que o país tem memória. As forças armadas leais a Mugabe cometeram atrocidades, matando cerca de 20.000 civis.
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Mugabe a Presidente
Em 1987, Mugabe torna-se Presidente do Zimbabué. Já aqui se falava na deterioração do seu estado de saúde. No entanto, o sexagenário deixava claro que a reforma não estava para breve: “O partido irá encontrar um sucessor. Eu vim do povo. O povo na sua sabedoria irá selecionar alguém, assim que eu diga que me vou aposentar. Mas ainda não é altura. Nesta idade ainda posso seguir em frente”, disse.
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Um homem, várias perspetivas
Em 1994, enquanto milhares de cidadãos do Zimbabué continuavam dependentes de ajuda humanitária, não tendo acesso aos cuidados básicos, o presidente era distinguido pela Coroa britânica, em Londres. No Zimbabué, os primeiros protestos deixavam perceber que no país não havia motivo de orgulho no Presidente. No final dos mesmos anos 90, as manifestações contra o poder começaram a intensificar-se.
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A trágica reforma agrária
Em resposta ao descontentamento social, Mugabe lança a reforma agrária no início de 2000, uma medida que levou à nacionalização forçada das propriedades agrícolas que pertenciam à população branca para serem redistribuidas pelos negros. No entanto, os mais beneficiados foram a família de Mugabe e a elite partidária do ZANU-PF que ficaram com várias explorações. A produção agrícola caiu muito.
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"Deixem-me ser Hitler vezes dez"
Até aqui, Mugabe já tinha ganho as eleições de 1984, 1990 e 1996. A cada nova eleição sucediam-se as acusações de fraude, o que fez com que, em 2002, os Estados Unidos e a União Europeia aplicassem sanções ao país. Aos que o apelidavam de ditador, disse: "Sou o Hitler da nossa época. O Hitler que tem por objetivo a justiça para o povo. Se isso é ser um Hitler, deixem-me ser Hitler vezes dez".
Foto: picture-alliance/dpa
"Fatídico" 2008
Em 2008, Mugabe perdeu mesmo a maioria no Parlamento, tendo o Movimento para a Mudança Democrática (MDM) de Morgan Tsvangiari conseguido um maior número de lugares. As eleições ficaram marcadas pelo elevado número de mortes em consequência de confrontos. O ano de 2008 ficou ainda marcado pela inflação, que atingiu valores recorde, e pela epidemia de cólera que matou milhares de zimbabueanos.
Foto: dpa
Aniversários excêntricos
Do percurso do vilão não se esquecem também as famosas festas de aniversário. Enquanto grande parte do seu povo vivia na miséria, Mugabe exibia a sua excentricidade. No seu 93º aniversário, comemorado este ano, estima-se que Mugabe tenha gasto cerca de 1,9 milhões de euros numa festa que contou com cem mil convidados. Na mesma altura, cinco milhões de zimbabueanos dependem de ajuda internacional.
Foto: Getty Images/AFP/J. Njikizana
Grace, a não sucessora
Em 2015, começa a falar-se da possibilidade da primeira-dama, Grace - segunda mulher de Mugabe, 40 anos mais nova, e que já mantinha um caso com o Presidente enquanto era sua secretária - poder ser a sua sucessora. O que intensificou os conflitos dentro do ZANU-PF. Emmerson Mnangagwa, o vice de Mugabe, foi humilhado e demitido de funções e fugiu do país após um braço-de-ferro com Grace Mugabe.
Foto: Reuters/Philimon Bulawayo
15 de novembro de 2017 - o início do fim
Na festa dos seus 93 anos, em fevereiro, Mugabe nem sonhava o que 2017 tinha reservado para si. Em outubro, foi eleito embaixador da boa vontade da Organização Mundial da Saúde, mas uma chuva de críticas internacionais fez com que a nomeação fosse retirada. Cerca de um mês depois, militares próximos de Mnangagwa protagonizavam um aparente golpe de Estado que culminou com a detenção do Presidente.
Foto: Reuters/Zimpapers/J. Nyadzayo
Adeus Mugabe
A 19 de novembro esperava-se que Mugabe anunciasse a sua demissão depois de ter sido deposto da liderança do seu partido. Mas, num discurso à nação, rejeitou que a intervenção militar no país tenha sido "um desafio" à sua "autoridade como chefe de Estado". Dois dias mais tarde, foi anunciada a sua renúncia, ao mesmo tempo que o Parlamento debatia uma moção de censura contra o agora ex-governante.