Mulheres guineenses reclamam reposição de feriados
Lusa
31 de janeiro de 2023
Antiga diretora-geral da Polícia Judiciária guineense diz que os feriados banidos pelo Governo fazem falta.
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Um grupo de mulheres da Guiné-Bissau exigiu a reposição de feriados nacionais recentemente suprimidos pelo Governo, com o argumento de aumento de produtividade na Função Pública.
Reunidas num colóquio para debater "o quotidiano da mulher num mundo digital de novas tecnologias", as mulheres foram convocadas pela Rede Oeste Africana para Edificação da Paz (WANEP, em sigla inglesa) e pelo Conselho Nacional das Mulheres da Guiné-Bissau, liderada por Lucinda Barbosa Aukarié.
No discurso de abertura do encontro, a antiga diretora-geral da Polícia Judiciária guineense descreveu "as grandes conquistas" ocorridas na Guiné-Bissau "com grande contributo da mulher" para destacar a necessidade de se ter um dia de reflexão sobre a sua condição.
No passado dia 21 de janeiro, o Governo guineense publicou um decreto que extingue os feriados nacionais nos dias 23 de janeiro (data de início da luta armada pela independência), 8 de março (Dia Internacional das Mulheres) e 3 de agosto (Massacre de Pindjiguiti).
O Governo justificou a decisão com a "dinâmica que se impõe nos dias que correm, fruto da globalização, da liberalização económica e da livre circulação de pessoas e bens, além da crise financeira e alimentar, que tem sacudido o mundo, o que impõe novas perspetivas que assentam numa cultura de produção e de produtividade".
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O feriado é dia de reflexão, não é de festa
"Nós queremos demonstrar aqui a nossa indignação pela exclusão do dia 8 de março, que é o Dia Internacional das Mulheres, no quadro dos feriados nacionais. O feriado é dia de reflexão, não é de festa, mas sim de reflexão pelas lutas das mulheres a nível nacional e internacional", observou Lucinda Barbosa Aukarié.
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O decreto do Governo não fez alusão ao dia 30 de janeiro, que normalmente costumava ser feriado nacional, Dia da Mulher Guineense, em homenagem à heroína nacional Titina Silá, morta pela tropa colonial portuguesa, em 1973, mas as mulheres reunidas no colóquio reclamam a sua reposição.
A coordenadora da WANEP na Guiné-Bissau, Denise dos Santos Indeque, considerou que será uma ilegalidade se este feriado for mesmo suprimido.
"Não só é um ato atentatório às conquistas da mulher, como também é contraproducente, uma vez que este dia já foi regulamentado e alicerçado na lei, ou seja, no Código do Trabalho, aprovado pela Assembleia Nacional Popular", defendeu Indeque.
Para a coordenadora da WANEP na Guiné-Bissau, acabar com os feriados nos dias dedicados às mulheres "coloca em causa todos os esforços" alcançados pelo país, desde a independência em 1973, na afirmação dos direitos das mulheres, disse.
Ser mulher na Guiné-Bissau significa vida dura
A maioria das mulheres guineenses tem uma vida difícil. Têm de percorrer dezenas de quilómetros para ir buscar lenha. Muitas morrem ainda jovens. A taxa guineense de mortalidade materna é uma das mais altas do mundo.
Foto: DW/B. Darame
Primeira a acordar, última a ir dormir
No campo, uma mulher trabalha a dobrar. Costuma acordar antes dos restantes membros da família e é a última a deitar-se no final do dia. São as mulheres que têm de caminhar até à mata para procurar lenha e água, às vezes em zonas de difícil acesso, a vários quilómetros da aldeia, como nesta fotografia na vila de Quinhamel, na região de Biombo, no norte da Guiné-Bissau.
Foto: DW/B. Darame
Vender para sustentar a família
Com um pano estendido no chão, as vendedoras vão expondo os seus legumes, malaguetas verdes, pepinos, cenouras, alfaces. São cultivados em quintais ou em pequenos campos. "Vender para sustentar a família" é o lema das mulheres guineenses. Mais de metade vende em feiras improvisadas, como aqui no Mercado de Bandim, o maior mercado de céu aberto da cidade de Bissau.
Foto: DW/B. Darame
Economia dominada por homens
À beira das estradas, as mulheres sentam-se em bancos e mesas de madeira e vendem laranjas, mangas, bananas e outros frutos - como aqui em Bissack, bairro nos arredores de Bissau. As vendedoras têm uma receita que ronda os 10 euros diários. Em média, uma guineense consegue ganhar 907 dólares por ano, bastante menos que os homens que conseguem em média 1.275 dólares.
Foto: DW/B. Darame
Recolher areia para sobreviver
Tia Nhalá não sabe que idade tem, mas sabe que todos os dias deve acordar cedo, às 05h00, para recolher areia no bairro de Cuntum, em Bissau. Sem qualquer proteção no rosto, sem luvas e pés descalços, Nhalá, que aparenta ter 67 anos, trabalha duramente durante largas horas. Recolhe areia que depois vende a pessoas que a usam em obras de construção civil.
Foto: DW/B. Darame
Venda ambulante em condições perigosas
No Bairro de Belém, em Bissau, meninas deambulam de porta em porta para vender frutas. Organizações da sociedade civil denunciaram já várias vezes que as vendedoras ambulantes correm riscos, como o de serem violadas sexualmente, pois estão muito expostas e vulneráveis. Também há denúncias de que algumas mulheres são forçadas a fazer esse trabalho.
Foto: DW/B. Darame
Vender peixe é um bom negócio
As vendedoras de peixe geralmente possuem arcas velhas para a conservação do pescado. Colocam-nas nos portos - como aqui na Ilha de Bubaque (Bijagós) - para servir de local de armazenamento quando receberem peixe fresco dos pescadores. Nos últimos anos, a venda de peixe tornou-se num dos negócios mais rentáveis para as mulheres guineenses.
Foto: DW/B. Darame
Um dos piores países para ser mãe
As condições precárias nas zonas rurais da Guiné-Bissau têm reflexos nas estatísticas: em 126 partos morre uma mulher, segundo dados das Nações Unidas. Em comparação, no Japão, em 20.000 partos morre uma mulher. A taxa de mortalidade materna na Guiné-Bissau é uma das mais altas do mundo. Ainda assim, não existe no país uma estratégia política dirigida à mulher no meio rural.
Foto: DW/B. Darame
País difícil para as crianças
Cada mulher guineense tem em média cinco filhos. O país tem uma das taxas de fecundidade mais altas do mundo. Mas muitas crianças não chegam a celebrar o seu quinto aniversário. Segundo dados das Nações Unidas, 129 de 1.000 crianças morrem até aos cinco anos de idade, muitas durante no parto, o que torna a Guiné-Bissau um dos piores países do mundo para se nascer.
Foto: DW/B. Darame
Trabalhos domésticos no feminino
Em Mansoa, região de Oio, norte da Guiné-Bissau, as casas de adobe agrupadas debaixo de enormes árvores desenham intricados caminhos onde secam redes de pesca, peles de antílopes e roupas rasgadas de criança. A comida prepara-se num fogão improvisado a lenha, em frente da casa. Trabalhos domésticos como cozinhar, cuidar das crianças ou limpar cabem tradicionalmente às mulheres.
Foto: DW/B. Darame
Carregar à cabeça é a única solução
Nas zonas mais recônditas da Guiné-Bissau, como na aldeia de Suru, região de Biombo, a cerca de 20 quilómetros de Bissau, não há uma rede de estradas que facilite o transporte das mercadorias. Não há carros que façam as ligações entre as aldeias. Carregar à cabeça, por vezes mais de cinco quilos, é a única solução para que essas mulheres possam fazer chegar os produtos ao destino.
Foto: DW/B. Darame
Lenha e água a quilómetros de distância
Nas mais de 80 ilhas e ilhéus completamente isolados e sem grande presença do Estado guineense, as populações vivem no regime do "salva-se quem poder". As mulheres percorrem dezenas de quilómetros para ir buscar lenha e água potável. Em muitos casos - como aqui na Ilha de Bubaque (Bijagós) - atravessam rios caminhando, com os pés descalços, sem roupas adequadas e carregadas.
Foto: DW/B. Darame
Ultrapassando rios e braços de mar
Devido à falta de barcos nas aldeias insulares do arquipélago dos Bijagós, o fornecimento e o transporte de bens é extremamente difícil. É recorrente ver mulheres atravessando rios ou braços de mar bastante profundos. Estes caminhos para procurar lenha e água doce são bastante perigosos para quem não sabe nadar.
Foto: DW/B. Darame
Desigualdade começa na educação
A maioria das mulheres guineenses vive em situação de extrema pobreza. Em médias, as mulheres frequentaram a escola apenas 1,4 anos, menos de metade do que os homens guineenses, que têm em média 3,4 anos de escolaridade, segundo o Relatório de Desenvolvimento Humano das Nações Unidas. Só investindo na educação e na saúde será possível melhorar a situação das mulheres da Guiné-Bissau.