A Namíbia considerou "inaceitável" a oferta da Alemanha sobre as reparações pelo genocídio dos grupos étnicos herero e nama pelas tropas coloniais alemãs. Berlim compromete-se a pedido de desculpas e continua a negociar.
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O Presidente da Namíbia, Hage Geingob, considera que as reparações oferecidas pela Alemanha pelo genocídio dos grupos étnicos herero e nama na sua então colónia no início do século 20 são "inaceitáveis" e precisam de ser "revistas".
"Continuamos determinados a completar esta missão-chave", disse Geingob, na terça-feira (11.08), no final de uma reunião com o enviado especial para as negociações com a Alemanha, que já duram há cinco anos. O chefe de Estado pediu uma revisão da oferta, que terá o valor de 10 milhões de euros.
Ruprecht Polenz, comissário especial do Governo alemão para o diálogo com a Namíbia, ficou surpreendido com a reação da Namíbia. "Não sei de onde vem esse número. Nunca falei com o lado namibiano sobre números específicos. A Alemanha quer assumir a sua responsabilidade política e moral pelos crimes. O resto é especulação. Os dois lados concordaram com a confidencialidade nas negociações", declarou.
Pouco antes, o Governo tinha emitido uma declaração com a sua posição sobre o estado das negociações, especificando que a oferta da Alemanha, atualmente em cima da mesa, "ainda não é aceitável" para a Namíbia. "A atual oferta de reparação feita pelo Governo alemão continua pendente", disse a Presidência da Namíbia, embora sem divulgar detalhes específicos sobre a proposta.
Pedido de desculpas
A Namíbia salientou que a Alemanha se recusa a falar de "reparação" nestas negociações, palavra que também foi evitada durante as negociações do país com Israel após o Holocausto.
A Alemanha recorreu à fórmula "cicatrização de feridas", considerada inadequada pela Namíbia. Os dois países estão agora a trabalhar num quadro de acordo que fala de "reconciliação".
Berlim comprometeu-se, contudo, a pedir desculpas incondicionais pelo massacre dos grupos étnicos namibianos. O Governo alemão está pronto para pedir desculpas incondicionais ao povo namibiano, garante Ruprecht Polenz.
A pressão da Namíbia sobre a Alemanha está a aumentar. Segundo analistas, como Frederico Links, do Instituto Windhoek de Pesquisa de Políticas Públicas (IPPR), isso deve-se aos problemas económicos que estão a agravar-se na Namíbia.
"A economia da Namíbia está em recessão desde 2016. Tivemos duas secas severas consecutivas. A pandemia de Covid-19 piorou a situação. Portanto, não há muito dinheiro a circular no país. As negociações com a Alemanha são uma forma de o país se livrar de um buraco fiscal", explica.
Compensação monetária
No que diz respeito à compensação, a Namíbia está a fazer progressos na identificação e orçamentação de vários projetos que o país necessita em áreas como o abastecimento de água, eletrificação rural, estradas, habitação, educação ou desenvolvimento agrícola, entre outras.
Geingob instruiu o seu negociador, o embaixador Zed Ngavirue, a requerer de Berlim uma proposta reformulada. Apesar dos progressos nas negociações, Berlim não prevê o pagamento de indemnizações individuais, ao contrário das exigências dos representantes dos povos herero e nama, que apresentaram uma queixa contra a Alemanha em Nova Iorque em 2017.
O primeiro genocídio do século 20
Os ocupantes alemães na Namíbia mataram dezenas de milhares de indígenas herero e nama entre 1904 e 1908. Os massacres são considerados o primeiro genocídio do século 20.
A 12 de janeiro de 1904 houve uma primeira revolta dos herero contra o domínio colonial alemão, seguida, em outubro, pela insurreção da população nama.
Estima-se que os soldados do Imperador Guilherme II tenham chacinado 65.000 hereros de uma população de 80.000 e pelo menos 10.000 dos 20.000 nama.
Este genocídio é considerado um precedente para outras limpezas étnicas.
Em 2015, os dois países começaram a negociar um acordo que combinaria um pedido oficial de desculpas da Alemanha, bem como a ajuda ao desenvolvimento.
Em novembro de 2019, o Parlamento alemão usou pela primeira vez a palavra "genocídio" para se referir a este massacre. O negociador alemão, Ruprecht Polenz, adiantou que o acordo com a Namíbia estava próximo.
Racista e cruel, a história colonial da Alemanha
A exposição no Museu Histórico Alemão, em Berlim, é a primeira grande exibição que explora os capítulos do domínio colonial da Alemanha. Uma história da ambição falhada de uma superpotência.
Foto: public domain
A cara do colonialismo
Com o chanceler Otto von Bismarck, o Império Colonial Alemão estabeleceu-se nos territórios da atual Namíbia, Camarões, Togo e em algumas partes da Tanzânia e do Quénia. O imperador Guilherme II, coroado em 1888, tentou expandir os domínios coloniais. O imperador alemão queria um "lugar ao sol", como disse mais tarde, em 1897, o chanceler Bernhard von Bülow.
Foto: picture-alliance/AP Photo/DW
Colónias alemãs
Foram conquistados territórios no Pacífico (Nova Guiné, Arquipélago de Bismarck, Ilhas Marshall e Salomão e Samoa) e na China (Tsingtao). A Conferência de Bruxelas em 1890 determinou que o imperador germânico iria obter os reinos do Ruanda e Burundi, ligando-os à África Oriental Alemã. No final do século XIX, as conquistas coloniais alemãs estavam praticamente completas.
Foto: picture-alliance / akg-images
Um sistema de desigualdades
A população branca nas colónias era uma minoria, raramente representava mais de 1% da população. Uma minoria privilegiada, contudo. Em 1914, cerca de 25 mil alemães viviam nas colónias, menos de metade no Sudoeste Africano Alemão (atual Namíbia). Os 13 milhões de nativos das colónias alemãs eram vistos como subordinados, sem recurso ao sistema legal.
Foto: picture-alliance/dpa/arkivi
O primeiro genocídio do século XX
O genocídio contra os povos Herero e Nama no Sudoeste Africano Alemão (atual Namíbia) é o mais grave crime na história colonial da Alemanha. Durante a Batalha de Waterberg, em 1904, a maioria dos rebeldes Herero fugiram para o deserto, onde as tropas alemãs bloquearam sistematicamente o acesso à água. Estima-se que morreram mais de 60 mil Hereros.
Foto: public domain
A culpa alemã
Apenas cerca de 16 mil Hereros sobreviveram ao extermínio. Foram depois detidos em campos de concentração, onde muitos acabaram por falecer. O número exato de vítimas continua por apurar e é ponto de controvérsia. Quanto tempo terão sobrevivido os Hereros depois de fugirem para o deserto? Eles perderam todos os seus bens, os seus meios de subsistência e as perspetivas de futuro.
Foto: public domain
Reformas em 1907
Depois das guerras coloniais, a administração das colónias alemãs foi reestruturada com o objetivo de melhorar as condições de vida. Bernhard Dernburg, um empreendedor de sucesso (na imagem, transportado na África Oriental Alemã), foi nomeado secretário de Estado dos Assuntos Coloniais em 1907 e introduziu reformas nas políticas coloniais da Alemanha.
Foto: picture alliance/akg-images
A ciência e as colónias
Com as reformas de Dernburg foram criadas instituições científicas e técnicas para lidarem com assuntos coloniais. Assim estabeleceram-se faculdades nas atuais universidades de Hamburgo e Kassel. Em 1906, Robert Koch dirigiu uma longa expedição à África Oriental para investigar a transmissão da doença do sono. A imagem demonstra amostras coletadas nessa expedição.
Foto: Deutsches Historisches Museum/T. Bruns
Uma das maiores guerras coloniais
De 1905 a 1907, uma ampla aliança de grupos étnicos rebelaram-se contra o poder na África Oriental Alemã. Cerca de 100 mil locais morreram na Revolta de Maji-Maji. Apesar de raramente discutido, este continua a ser um importante capítulo da história da Tanzânia.
Foto: Downluke
A perda das colónias
Derrotada na Primeira Guerra Mundial, a Alemanha assinou o tratado de paz de Versalhes, em 1919, que previa que o país renunciava a soberania sobre as colónias. Cartazes como este demonstram o medo dos alemães de, como consequência, perderem poder económico e viverem na pobreza e na miséria no seu país.
Foto: DW/J. Hitz
Ambições coloniais do "Terceiro Reich"
As aspirações coloniais voltaram a surgir com o nazismo e não apenas em relação à colonização da Europa Central e Oriental, através do genocídio e limpeza étnica. O regime nazi pretendia também recuperar as colónias perdidas em África, como demonstra este mapa escolar de 1938. Os territórios eram vistos como fonte de recursos para a Alemanha.
Foto: DW/J. Hitz
Processo espinhoso
As negociações para uma declaração conjunta do genocídio dos povos Herero e Nama entraram numa fase difícil. Enquanto a Alemanha trava quanto a compensações financeiras, há também deficiências nas estruturas políticas internas da Namíbia. Representantes Herero apresentaram, recentemente, uma queixa à ONU contra a sua exclusão nas negociações em curso.