Seis meses depois, morte de Amurane continua por esclarecer
Sitoi Lutxeque (Nampula)
4 de abril de 2018
Seis meses depois do assassinato do antigo de Nampula, Mahamudo Amurane, nenhum suspeito foi detido. Polícia moçambicana diz que o caso já não está nas suas mãos. Partidos lamentam silêncio das autoridades.
Publicidade
Assinalam-se esta quarta-feira (04.04) seis meses do assassinato do primeiro edil do Conselho Municipal de Nampula vindo de um partido da oposição. Mahamudo Amurane, do Movimento Democrático de Moçambique (MDM), foi assassinado na sua residência particular, em outubro de 2017. O caso continua por resolver e não há previsões para o seu esclarecimento.
A Polícia da República de Moçambique (PRM), que antes prometeu investigar e responsabilizar os autores do crime, diz agora que o caso já não é da sua competência, pois está agora nas mãos da Procuradoria-Geral da República (PGR) em Nampula.
A família de Mahamudo Amurane continua a aguardar pelos esclarecimentos e a responsabilização dos autores, diz Selemane Amurane, irmão do autarca assassinado.
"A informação que até agora temos das autoridades é que ele foi barbaramente assassinado por um indivíduo desconhecido e que as autoridades estão a investigar. Por isso, não queremos atrapalhar as investigações através de especulações", afirma Selemane Amurane. "Nós, a família, estamos confiantes [no esclarecimento], porque esta dor não é só nossa, mas também de todo o povo moçambicano."
Assassinato "político"
Representantes de alguns partidos políticos entendem que Amurane morreu pela causa da libertação de Nampula e lamentam o silêncio das autoridades.
"Um cidadão desapareceu de maneira estranha e ninguém se pronuncia", afirma Mário Muquissince, presidente do partido Ação do Movimento Unido para a Salvação Integral (AMUSI). "Sabemos que foi silenciado porque foi um homem que lutou pela causa de libertar um povo [de Nampula] e uma etnia [macua] que sempre foi hostilizada. E acreditamos que o tratamento não tinha de ser este, de manter tudo no silêncio."
Seis meses depois, morte de Amurane continua por esclarecer
Filomena Mutoropa, membro da Assembleia Municipal de Nampula e secretária-geral do Partido Humanitário de Moçambique (PAHUMO), também condena a falta de esclarecimento deste crime.
"Nós estamos a pedir para que haja uma informação, pelo menos alguns indícios, sobre quem assassinou Amurane, e que se investigue mais, porque isso intimidou a cidade e a província de Nampula e intimidou os macua", diz Mutoropa.
Outros assassinatos
O jurista e analista moçambicano Alindo Muririua teme, no entanto, que o caso nunca seja esclarecido, à semelhança de outros crimes contra figuras públicas no país.
"Amurane foi assassinado pelo mesmo grupo que assassinou o constitucionalista Gilles Cistac, o juiz Dinis Silica, o [membro da Resistência Nacional Moçambicana] Jeremias Pondeca, entre outros. Nunca conheceremos o rosto dos assassinos", afirma o jurista.
Muririua desvaloriza os pronunciamentos da PRM, que alega que o caso Amurane está na agora na mãos da PGR: "Se não é da alçada da polícia, onde é que a Procuradoria vai buscar os resultados da investigação?"
Moçambique: Assassinato de figuras incómodas é uma moda que veio para ficar
O preço de fazer valer a verdade, justiça, conhecimento ou até posições diferentes costuma ser a vida em Moçambique. A RENAMO é prova disso, no pico da tensão com o Governo da FRELIMO perdeu dezenas de membros.
Foto: BilderBox
Mahamudo Amurane: Silenciada uma voz contra corrupção e má governação
O edil da cidade de Nampula foi morto a tiros no dia 4 de outubro de 2017. Insurgia-se contra a má gestão da coisa pública e corrupção no seu Município. Foi eleito para o cargo de edil através do partido MDM. Embora mais de sessenta pessoas já estejam a ser ouvidas pela justiça não se conhecem os autores do crime.
Foto: DW/Nelson Carvalho Miguel
Jeremias Pondeca: Uma voz forte nas negociações de paz que foi emudecida
Foi alvejado mortalmente a tiro por homens desconhecidos no dia 8 de setembro de 2016 em Maputo quando fazia os seus exercícios matinais. O assassinato aconteceu numa altura delicada das negociações de paz. Pondeca era membro da Comissão Mista do diálogo de paz, membro do Conselho de Estado, membro sénior da RENAMO e antigo parlamentar. Até hoje a polícia não encontrou os autores do crime.
Foto: DW/L. Matias
Manuel Bissopo: O homem da RENAMO que escapou por um triz
No dia 4 de janeiro de 2016 foi baleado depois de uma conferência de imprensa do seu partido na Beira. Bissopo tinha acabado de denunciar alegados raptos e assassinatos de membros do seu partido e preparava-se para se deslocar para uma reunião da força de oposição quando foi baleado. A polícia moçambicana até hoje não encontrou os atiradores.
Foto: Nelson Carvalho
José Manuel: Uma das caras da ala militar da RENAMO que se apagou
Em abril de 2016 este membro do Conselho Nacional de Defesa e Segurança em representação da RENAMO e membro da ala militar do principal partido da oposição foi morto a tiro por desconhecidos à saída do aeroporto internacional da Beira. A questão militar é um dos pontos sensíveis nas negociações de paz. Os assassinos continuam a monte.
Foto: DW/J. Beck
Marcelino Vilanculos: Assassinado quando investigava raptos
Era procurador foi baleado no dia 11 de abril de 2016 à entrada da sua casa, na Matola. Marcelino Vilanculos investigava casos de rapto de empresários que agitavam o país na altura. O julgamento deste assassinato começou em outubro de 2017.
Foto: picture-alliance/Ulrich Baumgarten
Gilles Cistac: A morte foi preço pelo conhecimento divulgado?
O especialista em assuntos constitucionais de Moçambique foi baleado por desconhecidos no dia 3 de março de 2015 na capital Maputo. O assassinato aconteceu após uma declaração que fortaleceu a posição da RENAMO de gestão autónoma na sua querela com o Governo da FRELIMO. Volvidos mais de dois anos a sua morte continua por esclarecer.
Foto: A Verdade
Dinis Silica: Assassinado em circunstâncias estranhas
O juiz Dinis Silica também foi morto a tiro por desconhecidos, em 2014, em plena luz do dia, quando conduzia o seu carro na capital moçambicana. Na altura transportava uma avultada quantia de dinheiro, cuja proveniência é desconhecida. O juiz da Secção Criminal do Tribunal Judicial da Cidade de Maputo investigava igualmente casos de raptos. Os assassinos continuam a monte.
Foto: picture-alliance/dpa/U. Deck
Siba Siba Macuacua: Uma morte brutal em nome da verdade
O economista do Banco de Moçambique foi atirado de um dos andares do prédio sede do Banco Austral no dia 11 de agosto de 2001. Na altura investigava um caso de corrupção na gestão do Banco Austral. Siba Siba trabalhava na recuperação da dívida de milhões de meticais, resultante da má gestão do banco. Embora tenha sido aberta uma investigação sobre esta morte ainda não há esclarecimentos até hoje.
Foto: DW/M. Sampaio
Carlos Cardoso: O começo da onda de assassinatos
Considerado o símbolo do jornalismo investigativo em Moçambique, Carlos Cardoso foi assassinado a tiros a 22 de novembro de 2000. Na altura investigava a maior fraude bancária de Moçambique. O seu assassinato foi interpretado como um aviso claro aos jornalistas moçambicanos para que não interferissem nos interesses dos poderosos. Devido a pressões internacionais o caso chegou a justiça.