Cantor holandês de origem cabo-verdiana está a angariar apoiantes por todo o mundo para apadrinhar todas as crianças órfãs e desfavorecidas da Guiné-Bissau. Objetivo é mobilizar 100 padrinhos até o final deste ano.
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Nelson Freitas nasceu em Roterdão, na Holanda, onde cresceu e vive. Os pais são de Cabo Verde. Tal como estes, os avós também cresceram ali. Era a avó quem ia buscá-lo à escola, enquanto a mãe trabalhava.
Em conversa com a DW África, em Portugal, onde se encontra para vários concertos, Freitas conta que a sua infância foi feliz.
"Cresci com a minha mãe. Os meus pais se separaram quando eu tinha 10 [anos]. O meu pai foi viver nos Estados Unidos, mas sempre mantemos contato," recorda.
O músico tinha seis meses, quando foi pela primeira vez a Cabo Verde. Mas só sentiu o calor da terra dos seus pais quando tinha nove anos. Aí, começou a tomar contato com a realidade.
"Cabo Verde são ilhas pequenas, onde acho que há pobreza, obviamente. Mas as pessoas estão mais ligadas, há mais solidariedade entre as famílias," avalia.
É a pobreza nalguns países de África, mas sobretudo o exemplo dado pela mãe, que o sensibilizaram.
"Quando fui pela primeira vez para Cabo Verde, a minha mãe levava sempre malas de roupas. Malas com café e com sumos. E quando chegamos em Cabo Verde, ela estava sempre a entregar às pessoas. 'Toma aqui café. Toma aqui bebidas.' E eu [interroguei-a]: 'Mamã, porque é que estás a fazer isso?" revela Freitas.
"Eu achei isso estranho. Eu era miúdo e não sabia o que ela estava a fazer. E ela esteve a explicar. Então aprendi muito com ela," considera.
Assim começa o interesse de Nelson Freitas a favor das causas sociais.
A educação através da dança na Guiné-Bissau
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Ajudar crianças na Guiné-Bissau
Recentemente, o músico voltou à Guiné-Bissau, não para cantar, mas na qualidade de embaixador de boa vontade da Associação Padrinhos d’África, com a missão de conhecer melhor a realidade das crianças órfãs e desfavorecidas.
"Desta vez, fomos mesmo para isso. Até muitas pessoas nem sabiam que estava lá, porque não fui fazer show. Mas foi uma viagem super interessante [que serviu] para ver como é que as pessoas vivem, o que é que elas precisam mesmo," diz.
"E precisam de muito," afirma o artista.
"Precisam da possibilidade de ir para a escola. Precisam de comida básica. Precisam de roupas. Precisam de tudo," considera Nelson Freitas.
Ficou com plena consciência do que é mais necessário.
"E como um dos embaixadores da [Associação] Padrinhos d´África, agora a ideia é arranjar mais pessoas para serem padrinhos desses miúdos órfãos," explica.
A campanha, já em curso, visa angariar mais de 400 padrinhos para todas as crianças carenciadas da Guiné-Bissau. A associação, presente também em Angola e Moçambique, acolheu a ideia com muita satisfação e carinho. E não será difícil, segundo o cantor.
"Não é muito complicado. Eu tenho quase um milhão de fãs nas redes sociais. Então, é através dessa plataforma que eu vou utilizar o meu nome. Pode ser Portugal, Holanda, Estados Unidos ou Angola. Pode ser em Cabo Verde, pode ser em qualquer lado do mundo. Acho que em qualquer lado podemos arranjar padrinhos. Porque com 70 euros por ano, o miúdo já vai para a escola e já pode comer. São cinco euros por mês," descreve Freitas.
A Associação Padrinhos d’África já atua na Guiné-Bissau, Angola e Moçambique, estando igualmente em perspetiva a sua presença em Cabo Verde e, possivelmente, em São Tomé e Príncipe.
Nelson Freitas empenhado nas causas sociais em África
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100 padrinhos em 2018
Não apenas os músicos podem ajudar, acrescenta o cantor.
"Qualquer pessoa pode fazer. Isso às vezes leva tempo. Há pessoas que sempre dizem: ‘Eu quero fazer’. Mas nunca fazem. Nunca fazem, pode ser por vários motivos. Às vezes as pessoas pensam ‘eu vou pôr dinheiro nessa conta, não sei para onde é que o dinheiro vai.’ Eu acho que muitas pessoas têm medo disso," pondera.
"Eu escolhi essa associação, porque eu sei que o meu dinheiro vai para o ponto certo," afirma Nelson Freitas.
"Quero pedir aos fãs no mundo inteiro para tentar ajudar nem [que seja] um pouquinho só," apela.
O objetivo até ao final do ano é conseguir duplicar para 100 o número de padrinhos, assegura o músico - que tem agenda repleta ao longo de 2018, abrangendo Portugal, Cabo Verde, Bélgica e Luxemburgo, entre outros. E, acrescenta, Alemanha, onde tem fãs e já esteve poucas vezes, não está fora do horizonte.
"É uma questão de tempo. Vamos chegar lá," afirma o músico.
O seu novo single "Nubian Queen" saiu em maio deste ano. É a segunda canção cantada em português depois do enorme sucesso de "Miúda Linda", que contabilizou mais de 45 milhões de visualizações.
"O single já está a fazer sucesso. [Já tem mais de] um milhão de visualizações no Youtube e já está a tocar nas rádios no mundo inteiro," conclui.
Ajudando a vestir os pequenos em África
Em Portugal, a ONG "Little Dresses for Africa" confeciona roupas para crianças carenciadas de diversos países africanos. Meninos e meninas de Moçambique, Cabo Verde e São Tomé e Príncipe estão entre os beneficiados.
Foto: LDFA Portugal
Roupa para os mais carenciados
A "Little Dresses for Africa" (LDFA) tem dado cor à vida dos meninos e meninas mais necessitados do continente. Desde 2007, esta organização humanitária com sede nos Estados Unidos junta voluntários em diversos países do mundo que confecionam peças de roupa destinadas a crianças carenciadas em países como Moçambique. Estas meninas da aldeia de Ndivinduane foram vestidas pela LDFA Portugal.
Foto: LDFA Portugal
Os meninos da aldeia de Kibera
Nascida no início de 2016, a delegação LDFA Portugal lançou-se ao trabalho e em três meses enviou mais de 500 peças para vários países africanos. Quénia foi o primeiro a receber ajuda, particularmente as crianças mais pobres de Kibera, a maior favela de África. Aqui, brincam ao lado de um verdadeiro esgoto a céu aberto e depósito de lixo.
Foto: LDFA Portugal
O valor simbólico das roupas
Embora a roupa seja um bem muito necessário, o vestido é muito mais que isso na vida destas crianças apoiadas pelo projeto português. As roupas transportam carinho e esperança, proporcionam autoestima e valorização, sabendo-se que, nestas comunidades, sobretudo as meninas são muito penalizadas por serem vítimas de abusos, gravidezes precoces e abandono escolar.
Foto: LDFA Portugal
O rosto da missão humanitária
Lisa Santos apaixonou-se pelo projeto e decidiu dar a cara por esta causa humanitária, ao criar a LDFA Portugal. A equipa dirigida por esta professora de piano, nascida em Moçambique, ascende a cerca de 150 pessoas. São todas voluntárias, dedicadas a fazer a diferença na vida das crianças fragilizadas, muitas vezes em situação de extrema carência.
Foto: DW/J. Carlos
Identificar necessidades
Antes, a equipa trata de identificar potenciais beneficiários, através de outros projetos que trabalham com crianças, nomeadamente orfanatos, infantários e escolas comunitárias. Ou através de contatos e de missões em Portugal que partem para África com o objetivo de ajudar os menores mais carenciados das aldeias locais.
Foto: LDFA Portugal
Uma roupa para toda a semana
Apesar de ser um país de desenvolvimento médio, Cabo Verde também beneficia da ajuda da LDFA Portugal. "O que é certo é que há muita pobreza escondida", diz Lisa Santos, que visitou vários infantários na Páscoa deste ano (2017). Entre outros exemplos de carência, aponta casos de crianças que usavam a mesma peça de roupa durante a semana "porque não havia mais nada para vestir".
Foto: LDFA Portugal
Comunicar para mobilizar donativos
É preciso sensibilizar as comunidades e envolver a sociedade, usando para isso os meios de comunicação e as redes sociais. Uma das dificuldades é conseguir donativos suficientes para suportar as operações. "Todas as doações são benvindas", afirma a mentora do projeto. "Muitas vezes somos nós, eu e as voluntárias costureiras, a comportar essa parte das despesas".
Foto: LDFA Portugal
Jantar solidário
Através da página no Facebook, há pessoas que se identificam com a causa e doam materiais para confecionar os vestidos. O grupo promove outras iniciativas, como o segundo jantar solidário realizado em meados de novembro (2017), cujo objetivo foi angariar fundos para apoiar a construção de 12 escolas e 12 poços de água em 12 vilas africanas.
Foto: LDFA Portugal
Oficinas de costura
As peças são confecionadas por voluntárias em oficinas de costura da LDFA Portugal e, nalguns casos, em casa em diversos pontos do país. "Temos um grupo residente que oferece mão de obra". O projeto dispõe os moldes e, seguindo os conhecimentos necessários, elas produzem as roupas simples, que nada têm a ver com a alta costura.
Foto: LDFA Portugal
Mais logística para envio de roupa
Além do Quénia, Gana, Moçambique, Guiné-Bissau e Cabo Verde, outro país beneficiado é São Tomé e Príncipe. Na foto, meninos do arquipélago vestem calções da ONG. As peças foram enviadas em contentor, juntamente com brinquedos, materiais escolares, medicamentos e calçados. "Há uma série de bens em falta e não conseguimos fazer mais envios de bens por razões logísticas", explica Lisa Santos.
Foto: LDFA Portugal
Aberto a novos projetos
A próxima missão, em agenda, voltará possivelmente a Moçambique, para um projeto que dá especial apoio a meninas. As crianças das aldeias de Boane e Ndivinduane foram as que receberam roupas anteriormente. "Estamos continuamente em produção e à procura de novos projetos para apoiar, desde que tenhamos intermediários", avisa a dirigente da LDFA Portugal.