Nigéria: as mulheres e meninas nas fileiras do Boko Haram
Muhammad Al-Amin | António Cascais
11 de março de 2017
O grupo radical islâmico recruta cada vez mais mulheres e meninas no norte do país. Organizações não-governamentais e Governo trabalham para o resgate e reintegração destas mulheres na sociedade.
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No norte da Nigéria, as mulheres fazem parte do conflito entre as autoridades e grupos radicais e terroristas, como o movimento extremista islâmico Boko Haram. Cada vez mais mulheres integram as fileiras do grupo radical, seja de forma voluntária, seja de forma forçada. Em vários casos, mulheres e raparigas, por vezes menores, são recrutadas para cometerem atentados suicidas.
De acordo com a Fundação nigeriana para a Defesa das Democracias (FDD) foram detetadas, nos últimos 3 anos, 123 mulheres e raparigas que se fizeram explodir em ataques suicidas. Algumas delas foram forçadas a cometer os atentados, segundo a mesma fonte. Outras, pelo contrário, aderiram voluntariamente ao movimento radical islâmico.
Ignorância, miséria e manipulação
O que leva estas mulheres a enveredar pelo caminho do radicalismo, ao ponto de cometerem suicídio e matarem indiscriminadamente? Zariyatu Abubakar, coordenadora de uma associação não governamental de defesa dos direitos femininos, no nordeste da Nigéria, afirma que os motivos são variados e complexos. "Existe muita ignorância”, frisa. Ao mesmo tempo, aponta "o problema da miséria e da pobreza”.
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"Há ainda os homens que lavam os cérebros às mulheres, contam-lhes mentiras, e conseguem, de alguma forma, convencê-las a cometerem estes atos deploráveis”, sublinha.
Segundo a Human Rights Watch, o Boko Haram sequestrou cerca de duas mil meninas e raparigas desde 2009. Essas meninas são vítimas de violações, trabalhos forçados e casamentos involuntários.
Resgatar as vítimas
Entre as vítimas de sequestros encontram-se mais de 200 alunas raptadas numa escola da cidade de Chibok em abril de 2014. O sequestro atraiu muita atenção a nível internacional, mas está longe de ser um caso isolado.
A ativista Zariyatu Abubakar diz que é necessário continuar a fazer um trabalho de apoio especificamente orientado para as mulheres. Há que incutir nas jovens no nordeste da Nigéria a ideia de que não estão condenadas à submissão e que têm à sua disposição estruturas de apoio, caso queiram denunciar casos de assédio ou ameaças.
"Nós fornecemos esse tipo de apoio. Tentamos encorajá-las a procuraram caminhos para a sua auto-defesa. O objetivo é que elas não se tornem dependentes de gente que as queira conduzir a maus comportamentos”, explica a ativista.
O Governo nigeriano introduziu um programa de apoio às mulheres recrutadas pelos radicais islâmicos no estado de Borno, no nordeste do país, a região mais atingida pelo problema.
O governador do estado de Borno, Kashim Shetima, explica que o programa visa também ajudar estas mulheres a regressarem às suas famílias. "Mantemos as mulheres numa casa onde as ‘desradicalizamos', e fornecemos apoio psicológico e social”.
Reféns do Boko Haram libertados na Nigéria: "Ainda dói"
As 293 mulheres e crianças libertadas na semana passada pelo exército nigeriano das mãos do Boko Haram foram levadas para um campo de refugiados perto da cidade de Yola. Mas o seu sofrimento está longe de terminar.
Foto: DW/Jan-Philipp Scholz
O sorriso perdido
"O que se percebe imediatamente é que as crianças aqui quase não riem", conta um funcionário do acampamento de Malkohi, na periferia da cidade nigeriana de Yola. Cerca de metade das perto de 300 pessoas que eram mantidas em cativeiro pelo Boko Haram tem menos de 18 anos. Um terço das crianças no acampamento sofre de desnutrição.
Foto: DW/Jan-Philipp Scholz
Primeiros dias de vida no acampamento
Lami Musa é mãe da mais recente moradora do acampamento de Malkohi. Deu à luz na semana passada. Um dia depois foi salva por soldados nigerianos. Durante a operação de resgate várias mulheres foram mortas pelos terroristas. "Apertei firmemente a minha filha contra o meu corpo e inclinei-me sobre ela", recorda a jovem mãe.
Foto: DW/Jan-Philipp Scholz
Filho perdido durante o cativeiro
Halima Hawu não teve tanta sorte. Um dos seus três filhos foi atropelado enquanto os terroristas a raptavam. Durante a operação de resgate um soldado nigeriano atingiu-a numa perna, porque os membros do Boko Haram usam as mulheres como escudos humanos. "Ainda dói, mas talvez agora o pior já tenha passado", espera Halima Hawu.
Foto: DW/Jan-Philipp Scholz
Poucos alimentos para as crianças
Babakaka, de três anos, teve de passar seis meses com o Boko Haram. Só raramente havia algum milho para as crianças, contam antigos prisioneiros. Quando foram libertados pelos soldados, Babakaka estava quase a morrer de fome. Babakaka continua extremamente fraco e ainda não recebeu tratamento médico adequado no acampamento.
Foto: DW/Jan-Philipp Scholz
Sobrevivência por um triz
A mãe de Babakaka foi levada para o Hospital de Yola juntamente com cerca de outras vinte pessoas gravemente feridas. Durante a fuga, alguém que seguia à sua frente pisou uma mina. A explosão foi tão forte que a mulher ficou gravemente ferida. Perdeu o bebé que carregava.
Foto: DW/Jan-Philipp Scholz
Roupas usadas do Ocidente
Exceptuando algumas doações de roupas velhas, ainda não chegou muita ajuda internacional às mulheres e crianças do acampamento de Malkohi. Aqui há falta de muitas coisas, sobretudo de pessoal médico. Não há qualquer vestígio do médico de serviço no acampamento. Apenas duas enfermeiras e uma parteira mantêm em funcionamento o posto de saúde temporário.
Foto: DW/Jan-Philipp Scholz
Dependentes de voluntários
"Não entendo por que motivo o nosso serviço de emergência nacional não faz mais", reclama a assistente social Turai Kadir. Por sua própria iniciativa, Turai Kadir chamou uma médica para tratar das crianças mais desnutridas. Na verdade, essa é a tarefa da NEMA, a agência nigeriana de gestão de emergências, que está sobrecarregada.
Foto: DW/Jan-Philipp Scholz
"Incrível capacidade de resistência"
Regina Musa voltou há poucos meses dos Estados Unidos para dar aulas de Psicologia na Universidade de Yola. Agora, a psicóloga presta aconselhamento psicológico a mulheres e crianças. "As mulheres têm demonstrado uma incrível capacidade de resistência", diz Musa. Durante o período traumático, muitas delas também se preocupavam com os filhos de outras pessoas. Autor: Jan-Philipp Scholz (em Yola)