Nino Vieira no Panteão Nacional: "Tem de haver justiça"
Iancuba Dansó (Bissau)
15 de novembro de 2020
Movimento "Nino não morreu" saúda trasladação do antigo Presidente da Guiné-Bissau para Amura, mas continua a exigir o esclarecimento do seu assassinato. Analista fala em "campanha demagógica para ganhar favores".
Publicidade
Na Guiné-Bissau, os restos mortais do antigo Presidente João Bernardo Vieira (Nino Vieira) vão ser transladados esta segunda-feira (16.11) do cemitério para o "panteão nacional", a fortaleza d'Amura, onde estão sepultados outros antigos Presidentes e heróis da luta armada de libertaçãol. A cerimónia vai ser presidida pelo chefe de Estado Umaro Sissoco Embaló.
Na passada quinta-feira, o Presidente guineese, decidiu, através de um decreto presidencial, atribuir a título póstumo o título de "Herói da Luta Armada de Libertação Nacional" a João Bernardo Vieira, combatente da liberdade da pátria assassinado há 11 anos.
A decisão de transladar os restos mortais de "Nino Vieira", do Cemitério Municipal de Bissau para o mausoléu de Amura, fortaleza onde funciona o Estado Maior das Forças Armadas, foi tomada pelo Conselho de Ministros, no dia 5 de novembro, depois de uma proposta de Sissoco Embaló.
"Acredito que é o reconhecimento de quem ultrapassa a vida privada ou privativa de círculo fechado de família, amigos e alguns conhecidos", considera Udé Fati, diretora da ONG Voz di Paz. "Os restos mortais de quem já foi Presidente da República é mais uma pertença da nação do que familiar", sublinha.
Publicidade
Investigações devem continuar, diz "Nino ka Muri"
Nino Vieira, um célebre combatente da Liberdade da Pátria, que leu a proclamação da independência da Guiné-Bissau, foi o primeiro Presidente eleito democraticamente no país e o que mais tempo esteve no poder. Assumiu o cargo entre 1980 e 1999 – ano em que foi para o exílio. Regressou a Bissau em 2005 e, nesse ano, venceu as presidenciais.
Foi morto na sua casa, em Bissau, aos 69 anos, em pleno exercício das funções do Presidente da República. O assassínio ocorreu horas depois do então chefe de Estado Maior das Forças Armadas, Tagme na Waié, ter sido assassinado, alegadamente num ataque à bomba.
Justino Sá, coordenador do Movimento "Nino ka Muri" (Nino não morreu), aplaude a transladação dos restos mortais do então chefe de Estado, mas exige que seja feita justiça:
"Pode-se fazer a transladação e depois continuar com a questão da investigação e consequente apuramento dos presumíveis responsáveis. Nós continuamos a insistir que tem que haver justiça em relação ao brutal assassinato do então Presidente João Bernardo Vieira", defende. "A imagem do assassinato do Presidente é nebulosa e paira em torno de todos os guineeses".
Já o analista político Rui Landim desvaloriza a transladação dos restos mortais do antigo Presidente, classificando o gesto decidido em Conselho de Ministros como "uma campanha demagógica para ganhar favores dos apoiantes de Nino Vieira".
"Se fosse para reconhecer e repor a história no lugar, devia ser através da Assembleia Nacional Popular (ANP) a adotar um diploma que faz de Nino Vieira um herói nacional e decidir criar um mausoléu para Nino Vieira", afirma.
Esta segunda-feira, Dia das Forças Armadas, será aproveitada para a transladação dos restos mortais de Nino Vieira. Por essa ocasião, o Governo guineense decidiu conceder "tolerância" de ponto" aos funcionários públicos, que assim vão ter folga neste dia.
Dez líderes africanos que morreram em exercício
A população costuma acompanhar com atenção o estado de saúde dos altos dirigentes – muitos especulam atualmente, por exemplo, sobre a saúde do Presidentes da Nigéria. Vários chefes de Estado já morreram em exercício.
Foto: picture-alliance/dpa
John Magufuli, Presidente da Tanzânia
Morreu a 17 de março de 2021, doente. O seu estado de saúde, pouco antes da falecer, esteve em volto a muito secretismo. Assumiu a liderança do país em 2015 e boa parte do seu povo enaltece os seus feitos, tais como a melhoria dos sistemas de saúde, educação e transporte. Mas também foi contestado por algumas políticas duras e por perseguir os seus críticos.
Foto: Sadi Said//REUTERS
1) Malam Bacai Sanhá, Presidente da Guiné-Bissau (2012)
Malam Bacai Sanhá morreu em 2012. Ele sofria de diabetes e morreu em Paris, aos 64 anos, menos de três anos depois de chegar ao poder. Sanhá tinha vários problemas de saúde.
Foto: dapd
2) João Bernardo "Nino" Vieira, Presidente da Guiné-Bissau (2009)
João Bernardo "Nino" Vieira foi assassinado em março de 2009. Tinha 69 anos de idade. Esteve no poder durante mais de duas décadas. Tornou-se primeiro-ministro em 1978 e, em 1980, tomou a Presidência. Ficou no cargo até 1999, ano em que foi para o exílio. Regressou a Bissau em 2005 e venceu nesse ano as presidenciais.
Foto: picture-alliance/dpa/L. I. Relvas
3) Mouammar Kadhafi, chefe de Estado da Líbia (2011)
Mouammar Kadhafi foi assassinado em 2011. Kadhafi, auto-intitulado líder da "Grande Revolução" da Líbia, foi morto por forças rebeldes em circunstâncias ainda por esclarecer. Estava no poder há 42 anos, desde um golpe de Estado contra a monarquia líbia em 1969, onde não houve derramamento de sangue. A sua liderança chegou ao fim com a chamada "Primavera Árabe".
Foto: Christophe Simon/AFP/Getty Images
4) Umaru Musa Yar'Adua, Presidente da Nigéria (2010)
Umaru Musa Yar'Adua morreu em 2010 aos 58 anos de idade. Morreu no seu país, vítima de uma inflamação do pericárdio – estava há apenas três anos no poder. Já durante a campanha eleitoral, Yar'Adua teve de se ausentar várias vezes devido a problemas de saúde. Depois de ser eleito, em 2007, a sua saúde deteriorou-se rapidamente.
Foto: P. U. Ekpei/AFP/Getty Images
5) Lansana Conté, Presidente da Guiné-Conacri (2008)
Após 24 anos no poder, Lansana Conté morreu de "doença prolongada" aos 74 anos de idade. O Presidente da Guiné-Conacri sofria de diabetes e de problemas cardíacos. Conté foi o segundo chefe de Estado do país, de abril de 1984 até à sua morte, em dezembro de 2008.
Foto: Getty Images/AFP/Seyllou
6) John Atta Mills, Presidente do Gana (2012)
John Atta Mills morreu de apoplexia em 2012. Tinha 68 anos. Atta Mills esteve apenas três anos no poder. Enquanto chefe de Estado, introduziu uma série de reformas sociais e económicas que lhe granjearam fama a nível local e internacional.
Foto: AP
7) Meles Zenawi, primeiro-ministro da Etiópia (2012)
Meles Zenawi morreu na Bélgica aos 57 anos de idade, vítima de uma infeção não especificada. Zenawi liderou a Etiópia durante 21 anos – como Presidente, de 1991 a 1995, e como primeiro-ministro, de 1995 a 2012. Foi elogiado por introduzir o multipartidarismo, mas criticado por reprimir violentamente os protestos do povo Oromo no norte da Etiópia.
Foto: AP
8) Omar Bongo, Presidente do Gabão (2009)
Omar Bongo morreu em Barcelona, Espanha, em junho de 2009, vítima de cancro nos intestinos. Bongo estava no poder há 42 anos e morreu aos 72 anos de idade. Foi um dos líderes que esteve mais tempo no poder e um dos mais corruptos. Bongo acumulou uma riqueza imensa enquanto a maior parte da população vivia na pobreza, apesar de o país ter grandes receitas de petróleo.
Foto: AP
9) Michael Sata, Presidente da Zâmbia (2014)
Michael Sata morreu no Reino Unido aos 77 anos. A causa da morte não foi divulgada. Após a sua eleição em 2011, circularam rumores sobre o estado de saúde do Presidente. As suas ausências em eventos oficiais alimentaram ainda mais as especulações, apesar dos seus porta-vozes garantirem que estava tudo bem.
Foto: picture-alliance/dpa
10) Bingu wa Mutharika, Presidente do Malawi (2012)
Bingu wa Mutharika morreu em 2012. Teve um ataque cardíaco e faleceu dois dias depois, aos 78 anos de idade. Esteve oito anos no poder e ganhou gama internacional devido às suas políticas agrícolas e de alimentação. A sua reputação ficou manchada por uma onda de protestos por ter gasto 14 milhões de dólares num jato presidencial.