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Nova lei eleitoral em Moçambique: Manipulação à vista?

12 de agosto de 2024

Nova lei em Moçambique, apoiada pela FRELIMO e RENAMO, impede tribunais distritais de mandarem recontar os votos em eleições. Consórcio Mais Integridade considera a medida descabida e uma ameaça à democracia.

Nova lei eleitoral, apoiada por FRELIMO e RENAMO, transfere a recontagem dos tribunais distritais para unicamente órgãos controlados por partidos
Foto: Alfredo ZUNIGA/AFP

A recente decisão do Parlamento moçambicano de retirar aos tribunais distritais a competência para ordenar a recontagem de votos, transferindo essa responsabilidade para a Comissão Nacional de Eleições (CNE) e o Conselho Constitucional - medida apoiada pelo partido no poder, a FRELIMO, e pelo maior partido da oposição, a RENAMO, tem levantando preocupações sobre a transparência das eleições gerais de outubro.

Em entrevista à DW, Edson Cortez, presidente do Consórcio Eleitoral Mais Integridade, critica duramente esta alteração, considerando-a "descabida e patética". Segundo Cortez, "foi uma decisão política de dois partidos que não têm popularidade".

Cortez também manifesta preocupação pelo facto de a decisão ter sido tomada num altura em que os juízes estavam em greve, o que, segundo ele, pode ser visto como uma manobra do Governo para enfraquecer ainda mais a independência do sistema judicial.

Edson Cortez, do Consórcio Eleitoral Mais IntegridadeFoto: Romeu da Silva/DW

DW África: Qual é a posição do Consórcio Mais Integridade em relação à recente decisão do Parlamento de  retirar dos tribunais distritais a competência de ordenar a recontagem de votos? Essa decisão pode impactar a transparência e a justiça eleitoral em Moçambique?

Edson Cortez (EC): O Consórcio Eleitoral Mais Integridade manifestou-se contra esta medida, porque acha que vai reduzir o já exíguo espaço de transparência em todo o processo eleitoral, uma vez que, com a retirada dos tribunais distritais, apenas órgãos políticos tomarão a decisão final sobre as eleições. Quando falo de órgãos políticos, refiro-me à CNE, que é controlada pelos partidos FRELIMO e RENAMO, e também ao Conselho Constitucional. Portanto, temos aqui um caso de jogadores e árbitros em causa própria, o que é problemático para um país que está a tentar consolidar a sua democracia.

DW África: Como avalia a justificação da FRELIMO e da RENAMO para a aprovação das alterações, citando a necessidade de consenso e a urgência das eleições? O Consórcio vê essas justificativas como válidas ou como um risco para a justiça eleitoral?

EC: Não, não são válidas. São totalmente descabidas e, sinceramente, patéticas. Foi uma decisão política de dois partidos que não têm popularidade a nível eleitoral e que procuram a todo o custo manter o seu número de assentos e avançar para um processo eleitoral quando têm muito poucas hipóteses de obter grandes resultados num processo eleitoral livre e transparente.

DW África: A RENAMO, tradicionalmente, tem denunciado a falta de transparência eleitoral, mas votou a favor das alterações. Como vê essa mudança de postura? O que isso pode indicar sobre a atual dinâmica política?

EC: Não me surpreenderia se a FRELIMO e RENAMO já tivessem decidido quantos assentos iriam distribuir no Parlamento. Porque, para mim, não faz sentido que um partido que esteve a reclamar do papel do Conselho Constitucional nas últimas eleições faça uma mudança de 180 graus.
 
DW África: A Associação Moçambicana de Juízes criticou a "politização dos processos judiciais" com essa nova legislação. Qual é a avaliação do Consórcio sobre a independência dos tribunais em contextos eleitorais, especialmente após essa decisão?

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EC: Penso que estávamos a assistir a um certo nível de independência dos tribunais. E não podemos esquecer que os juízes [estiveram] em greve [entretanto, suspensa]. Acho que o Executivo da FRELIMO deve ter pensado que seria uma boa oportunidade para retirar aos juízes a capacidade de intervir no processo eleitoral.

DW África: Quais seriam as implicações para o sistema democrático de Moçambique?

EC: É um grande retrocesso. Estamos a assistir a uma espécie de [sequestro] do sistema legislativo.

DW África: O Consórcio Mais Integridade planeia alguma ação ou campanha específica sobre esta questão?

EC: A ideia é que, quando terminar a próxima legislatura, faremos advocacia para mostrar que é necessário um debate inclusivo sobre a legislação eleitoral. Esse debate não tem deser realizado à porta das eleições. Estamos a tentar promover um debate logo que a nova Assembleia da República tome posse.

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