ONG trabalha para conservar documentos resgatados depois de golpe militar de 2012. A tarefa é minuciosa e tem resultados. A maioria dos manuscritos está catalogada e 20% dos milhares de documentos estão digitalizados.
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A invasão islamista no norte do Mali pôs em risco de destruição milhares de manuscritos de Tombuctu, documentos históricos sem preço, que relatam a busca pelo conhecimento no mundo islâmico há muitos séculos. Mas os documentos foram salvos. Tudo graças a Abdel Kader Haidara, a quem, por esse feito, a Alemanha entregou o Prémio de África na edição de 2014.
Abdel Haidará criou a organização não-governamental "Salvar e valorizar os manuscritos para a defesa das culturas islâmicas" (SAVAM DCI), em Bamaco. Atualmente dezenas de pessoas trabalham na conservação dos manuscritos resgatados em Tombuctu.
A estrutura, criada em 2014 com o apoio dos parceiros internacionais, cataloga, digitaliza e preserva documentos manuscritos no século XI. Abdel Kader Haidará, presidente executivo da ONG, é hoje um homem feliz, porque uma grande parte do acervo de Tombuctu foi resgatado e encontra-se em lugar seguro.
"No início, os manuscritos estavam empilhados em um canto ou dentro de contentores, muitas vezes em más condições de conservação, desordenados e cheios de pó. Hoje, mais de 70% desses manuscritos estão limpos, catalogados em francês e árabe. Bem conservados em caixas próprias colocadas em algumas estantes”, observa.
Digitalizados 20% dos documentos
Os trabalhos técnicos de limpeza e catalogação devem, segundo a organização, ficar concluídos até ao final do ano. Ainda assim falta digitalizar uma grande parte dos manuscritos: até agora esse trabalho abrange somente 20% dos documentos.
Nova vida para os manuscritos de Tombuctu
Mas dos dois primeiros gabinetes para a digitalização, a ONG conta atualmente com 12. À DW África a chefe destes serviços, Souleymane Diarra, conta que ali trabalham equipas que ganharam muita experiência e maturidade.
"Com o avanço dos trabalhos conseguimos dar passos significativos. A experiência só se consegue trabalhando e é o que temos feito. Por outro lado, as pessoas gostam do trabalho que fazem. Algo que contribuiu muito para este sucesso, porque compreenderam que os manuscritos fazem parte de um tesouro que é património nacional”, explica.
Recorde-se que Tombuctu foi, em tempos, o centro islâmico da pesquisa e erudição em África.
Exploração científica dos manuscritos
Enquanto as equipas trabalham afincadamente, Abdel Kader Haidara, já tem os olhos postos num outro desafio cultura: a restauração completa dos documentos e, principalmente, a pesquisa para a exploração científica do conteúdo dos manuscritos.
Para os observadores trata-se de um trabalho importante, uma vez que o objetivo final é tornar totalmente acessível a todas pessoas interessadas, nomeadamente, pesquisadores, o conteúdo de um tesouro até hoje mal conhecido.
"A exploração científica dos manuscritos não pode ser feita sem pesquisas. Existem manuscritos que são tão importantes que necessitam de um estudo aprofundado e isso só será possível quando forem traduzidos em algumas línguas nacionais e internacionais. É assim que poderemos conhecer o verdadeiro conteúdo desses documentos tão valiosos.”
Para que este novo desafio seja concretizado são necessários recursos financeiros que ainda não estão disponíveis, mas Haidara confia na generosidade dos parceiros internacionais.
Entre estes, estão vários governos, universidades e fundações de muitos países, nomeadamente a Alemanha. Parceiros cuja ajuda também já permitiu à organização "Salvar e valorizar os manuscritos para a defesa das culturas islâmicas" construir ou reabilitar 38 bibliotecas das 45 previstas no quadro de um amplo projeto cultural no Mali.
Conservar os manuscritos de Tombuctu
A invasão islamita no norte do Mali pôs em risco de destruição milhares de documentos históricos. Estes foram salvos por Abdel Kader Haidara, feito pelo qual a Alemanha lhe outorgou o Prémio de África na edição de 2014.
Foto: DW/P. Breu
Tesouros históricos
Os manuscritos de Tombuctu são documentos históricos sem preço, que relatam a busca pelo conhecimento no mundo islâmico há muitos séculos. Tombuctu foi, em tempos, o centro islâmico da pesquisa e erudição em África.
Foto: DW/P. Breu
Contrabandeados em caixas de chumbo
Quando os islamitas começaram a destruir monumentos no norte do Mali em 2012, um grupo de cidadãos consternados transportou clandestinamente centenas de milhares de manuscritos de Tombuctu para a capital maliana, Bamako, no sul do país. Aqui foram depositados num edifício de residências, para aguardar a restauração e digitalização.
Foto: DW/P. Breu
O salvador dos manuscritos
Abdel Kader Haidara organizou a operação de resgate. O proprietário de uma biblioteca não só se preocupou em salvar os seus próprios manuscritos, mas também todos os documentos históricos de Tombuctu em risco de destruição.
Foto: DW/P. Breu
Nasce uma biblioteca digital
Os manuscritos estão agora a ser digitalizados na biblioteca de Bamako. Cada página é fotografada individualmente. A imagem é controlada e depois catalogada num arquivo central. O gigante da internet, Google, já manifestou interesse na coleção.
Foto: DW/P. Breu
Acesso geral aos manuscritos
A digitalização tem dois objetivos: preservar os manuscritos para a posteridade, caso os originais não resistam à humidade e ao calor de Bamako. E garantir o acesso a todos os interessados. Antes do conflito armado no norte e do resgate dos documentos não existia qualquer plano para os digitalizar.
Foto: DW/P. Breu
Caixas feitas à medida
Depois de serem digitalizados, os manuscritos são colocados em caixas de cartão isentas de ácidos. Aqui podem ser guardados para a posteridade. Uma vez que os manuscritos não têm todos o mesmo tamanho, as caixas tiveram que ser produzidas em trabalho manual.
Foto: DW/P. Breu
Uma biblioteca vazia
Na Biblioteca Comemorativa de Mamma Haidara, em Tombuctu, não há um único livro. E não é certo que a biblioteca volte a albergar documentos históricos no futuro. Muitos responsáveis acreditam que os documentos estão a salvo em Bamako. Mas também há quem receie pela identidade histórico-cultural de Tombuctu, caso os manuscritos não regressem a casa.
Foto: DW/P. Breu
Biblioteca em ruínas
O Instituto Ahmed Baba Institute foi criado com capitais da Fundação Aga Khan, África do Sul e Arábia Saudita. Para além de albergar a biblioteca, também tinha equipamento para a digitalização e restauração. Hoje, o instituto está vazio e dilapidado.
Foto: DW/P. Breu
Monumento aos manuscritos perdidos
Quando chegaram a Tombuctu, os islamitas deitaram fogo a muitos manuscritos no pátio do Instituto Ahmed Baba. Pretendiam assim demonstrar o seu poder ao ocidente e à UNESCO. Cerca de 4000 manuscritos foram destruídos. Os restos queimados servem hoje de memorial ao património perdido.
Foto: DW/P. Breu
Tombuctu vai cair na insignificância?
Quando Tombuctu perdeu a sua importância económica no século XX, descobriu o turismo como fonte de receitas alternativa. Mas o conflito de 2012 espantou os turistas, pelo que Tombuctu corre agora o perigo de perder também a sua relevância cultural, tanto mais que já não tem os manuscritos. E ninguém sabe se eles vão regressar.
Foto: DW/P. Breu
Sobram alguns manuscritos
Ainda existem algumas bibliotecas privadas. Mas em Timbuktu já é considerada uma biblioteca uma dúzia de páginas que cabem numa pele de carneiro. Este habitante de Timbuktu herdou alguns manuscritos do seu avô. É o que possui de mais valioso.
Foto: DW/P. Breu
Um futuro incerto
A situação política no Mali é tensa, e o exército maliano é demasiado fraco para garantir a estabilidade e segurança. Muitos habitantes de Tombuctu que fugiram da cidade optaram por não regressar. Eles não confiam na paz precária e a sua cidade enfrenta um futuro incerto.