Paulo Flores sobe ao palco do Coliseu de Lisboa esta sexta-feira (21.05) para apresentar o novo álbum que festeja a independência de Angola. Para o músico, o livre pensamento ainda é um direito por conquistar no país.
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"Independência", o novo trabalho discográfico de Paulo Flores, é o seu testemunho dos 45 anos de Angola como país independente. Mas o álbum também celebra os 48 anos de vida do músico, natural do Cazenga, em Luanda.
"Este álbum procura essencialmente uma reflexão que, mais do que música, tinha a ver com o conteúdo e com o texto da mensagem que eu queria passar, que tem a ver com as dependências sobre as quais a nossa independência ainda está dependente", começa por dizer o artista.
Segundo Paulo Flores, o álbum não representa apenas o sentimento de alma do músico que é considerado um dos cantores mais populares de Angola.
"Lembrei-me do álbum ‘Independência’ do Teta Lando, que foi o segundo dele, e eu achei que seria interessante falar com o Yuri [da Cunha]; ele também gostou dessa ideia de nos vermos, tantos anos depois”, conta. “E é curioso que parece que sentimos ainda as mesmas carências que Teta Lando cantava quando lançou a ‘Independência’ dele", acrescenta.
Falta de liberdade de pensamento
Retomar o tema – adianta o músico – é também um convite à reflexão sobre como conquistar uma independência plena. "Não vai ser pelas armas, não vai ser pela violência. Vai ser pelo pensamento que é o que mais nos é privado, em particular em Angola e nos contextos do mundo moderno", frisa.
Os temas interpretados por Paulo Flores aspiram a esse direito, mas também exaltam os desafios ainda vigentes que a conquista da independência impôs aos angolanos. "Porque a principal conquista será quando nós nos libertarmos dos nossos próprios medos. Quando deixarmos de ser prisioneiros da nossa própria mente e nos libertarmos de todos os traumas", explica.
Para o artista, os angolanos devem ganhar a capacidade de pensar por si próprios, acreditando num futuro mais risonho. "Embora o disco faça uma reflexão meio desesperada, ao mesmo tempo não tem como nós não acreditarmos... Porque, de facto, nós já passámos por tanta coisa que, hoje em dia, é quase como se fosse uma questão de tempo", prevê.
"Sinto que, às vezes, Angola ainda nem sequer está preparada – porque não há essa condição – para assimilar tudo o que estou a escrever. Mas fica para a memória futura. Fica como exercício e como narrativa dos nossos tempos. E principalmente era importante para mim contar algumas histórias do meu imaginário, algumas histórias que eu vivi e que sinto que têm sido apagadas pelo tempo", refere o músico.
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O seu legado para o futuro
Paulo Flores confessa que tem recebido mensagens "emocionantes", não só de gente da sua geração, que transmite esta ansiedade pela liberdade e por uma Angola melhor, mas também de um público mais jovem.
Por esta razão, no dia do concerto no Coliseu dos Recreios, o músico espera receber muitos aplausos. "Mais do que os aplausos, é a contribuição. É a minha obra que se vai completando, aquilo que eu vou deixar para as futuras gerações e para as atuais", admite.
Em entrevista à DW África, Paulo Flores informa que irá em tour com Yuri da Cunha por algumas províncias de Angola. "Espero que as condições pandémicas permitam, mas de facto é algo que queremos muito fazer", conclui.
Dez cantoras dos PALOP que fazem sucesso na Europa
Cada vez mais cantoras da África lusófona singram na Europa. Cultura, histórias das suas pátrias e o papel da mulher na sociedade são temas recorrentes nas músicas. Cabo Verde é um dos países mais bem representados.
Foto: Wikipedia/Lindaines1995
Aline Frazão
Cantora e compositora de Luanda, detentora de uma voz doce e poética que contrasta com o caráter interventivo e político da sua música. Foi uma das vozes pela libertação dos 15 ativistas detidos em Angola em 2015. Perto de completar 30 anos, conta já com três discos no portfólio e inúmeras passagens por palcos internacionais.
Foto: P. Szymanski
Elida Almeida
Com 25 anos, Elida Almeida pertence à nova geração de músicos de Cabo Verde. Interpreta os ritmos da sua ilha natal, Santiago, como o batuco, funaná e tabanka. Na sua música, é frequente encontrar tópicos que visam a situação das mulheres em Cabo Verde, como a educação e a gravidez na adolescência.
Foto: DW/A. Gensbittel
Cesária Évora
Ícone maior da música cabo-verdiana, levou a história do seu país a todo o mundo. Fonte de inspiração e figura incontornável para as novas gerações conterrâneas. Faleceu em 2011, aos 70 anos. Em março, vai ser homenageada pela ONU no festival "Over the Border" que se realizará em Bona.
Foto: Over the Border Festival
Lura
Nascida em Portugal, só conheceu Cabo Verde na adolescência. A música é a forma de se aproximar das suas origens e dar a conhecer a história do país e do seu povo. Vê na mulher cabo-verdiana uma fonte de inspiração. Entre os reconhecimentos internacionais, destaca-se o álbum "Herança", que, em 2015, foi distinguido entre os dez melhores em todo o mundo, pela revista britânica "Songlines".
Foto: DW/A. Gensbittel
Mayra Andrade
É uma verdadeira cidadã do mundo, mas não esquece as origens cabo-verdianas. Canta em várias línguas, incluindo crioulo. Ao longo da carreira já colaborou com diversos artistas, como a conterrânea Cesária Évora. Chega a ser vista por alguns como a sua sucessora. Em 2008, foi considerada a artista revelação para a BBC3.
Foto: Sony Music
Sara Tavares
Portuguesa mas com as raízes cabo-verdianas bem presentes, a "terra mãe", como canta num dos seus temas. Conta com uma longa e sólida carreira que inclui colaborações com diversos artistas e projetos musicais e até uma participação no Festival Eurovisão da Canção. Depois de um hiato, voltou ao ativo e continua a reinventar-se como artista.
Foto: Günther Klebinger
Karyna Gomes
Em 2016, Karyna Gomes foi a primeira artista guineense a subir ao palco do Africa Festival, o maior e mais antigo festival de música africana na Europa, que se realiza anualmente na Alemanha. Misturando sons tradicionais e modernos, da sua voz saem as histórias da sua terra, com particular destaque para a força feminina.
Foto: DW/A. Gensbittel
Eneida Marta
Sonhadora e otimista que canta a Liberdade. Aliás, esta guineense nasceu quando o seu país caminhava para a independência. Além da música, abraça também as questões sociais: é embaixadora da boa vontade da UNICEF na Guiné-Bissau, focando-se no problema do casamentos infantis. Em 2017, passou pelo palco do Africa Festival, na Alemanha.
Foto: DW/J. Carlos
Mariza
Mariza nasceu em Moçambique, filha de mãe moçambicana pai português. Apesar de se destacar no fado, estilo tipicamente português, é uma artista versátil e não é difícil encontrar ritmos africanos no seu trabalho. Mundialmente reconhecida, esgota as salas de concertos por onde passa. Já foi por duas vezes nomeada para os reconhecidos prémios Grammy.
Foto: q-rious music
Deolinda Kinzimba
Pode ainda não andar pela ribalta internacional, mas, aos 20 anos, a angolana Deolinda Kinzimba fez história ao sagrar-se vencedora da terceira edição do programa "The Voice Portugal", em 2015. A poderosa interpretação de "I will always love you" de Whitney Houston conta com mais de 1 milhão de visualizações no YouTube. Em 2017, lançou o primeiro álbum.