"Novo Código Penal moçambicano vai violar direitos da mulher", denuncia ONG
17 de março de 2014 A primeira versão do Código Penal surgiu em 1998 e o conteúdo que este importante documento tem foi adotado a partir de 2012. Desde aquela altura organizações não governamentais têm-se reunido com o Parlamento Moçambicano para denunciar que vários artigos deste código "violam os direitos humanos."
Além de considerado obsoleto por especialistas em Direito Penal, o Código Penal é composto por leis do Século 19, algo que estimulou uma revisão que deu lugar ao projeto de uma nova norma penal. O documento foi aprovado na generalidade pelos parlamentares moçambicanos em dezembro último.
A porta-voz da Rede de Defesa dos Direitos Sexuais e Reprodutivos, Mulher e Lei na África Austral (WLSA-Moçambique), Maria José Artur, concedeu entrevista à DW África. Para ela a lei criminal, que é a principal do país, tem várias previsões que criam situações diretas ou indiretas de discriminação.
"Indiretas porque muitas destas previsões aparecem com uma linguagem neutra, mas a sua aplicação na prática, tendo em conta a situação da própria sociedade moçambicana, vai criar discriminação em relação a mulheres, crianças e outros grupos", disse a ativista.
Violado e inconstitucional
A antropóloga critica, por outro lado, vários artigos inseridos que são contrários às convenções que Moçambique ratificou e à própria constituição do país.
Para ela, mesmo deixando de lado os instrumentos internacionais e regionais relativos aos direitos humanos, observando somente à Constituição de Moçambique, "muitas destas previsões são inconstitucionais".
Ela salienta que as medidas "não respeitam os princípios de igualdade e da não discriminação que estão na constituição", disse.
Especificamente o artigo 223 do anteprojeto, segundo a porta-voz, despenaliza o autor do crime de violação sexual que casar com a vítima e não se divorciar nos cinco anos seguintes. Para ela, o artigo tenta proteger a "honra da família", mas tem um efeito perverso principalmente para as adolescentes.
"Casa-se a menina e se encobre a humilhação perante a sociedade. A maneira que isto está feito "despenaliza" a violação, protege o agressor e "revitimiza" a pessoa que já sofreu uma violação", explica.
Em antecipação ao debate na especialidade do Código Penal no Parlamento moçambicano, 13 ONGs de defesa dos direitos humanos já articulam em outras formas de luta.
Outras formas de luta
Maria José Artur fala que o importante é o exercício da democracia e dizer aos deputados que eles não podem legislar contra a constituição e contra outros compromissos que o governo assumiu.
"E mostrar aos deputados que direitos adquiridos não podem ser colocados em causa. Portanto, se estes meios que temos usado até agora não serviram, nós teremos que passar para ações mais diretas, como ações de rua", adverte.
A Amnistia Internacional e a Equality Now, além de outras organizações internacionais, engajam-se na luta dos ativistas moçambicanos para evitar a aprovação lei. "Nós lutamos internamente para chamar a atenção para a injustiça e discriminação que este código irá criar. A pressão internacional é outro meio que nós levamos a cabo", salienta.
Os ativistas exortaram os países doadores a convencerem o Estado moçambicano a não aprovar o documento com os artigos contestados. Amnistia Internacional já manifestou repúdio e se solidarizou publicamente com a causa através de uma carta-denúncia na imprensa moçambicana.