Previsão de agravamento de punições no combate à corrupção
Leonel Matias (Maputo)
7 de março de 2018
O Gabinete Central de Combate à Corrupção apresentou esta quarta-feira (07.03.) o seu plano estratégico para o período 2018 - 2022. O plano prevê um agravamento das medidas punitivas com vista a desencorajar a corrupção.
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O Plano Estratégico do Gabinete Central de Combate a Corrupção (GCCC) para o período 2018-2022 prevê, entre outras ações, a tomada de medidas para melhorar o quadro legal existente, tendo em vista a punição da corrupção e crimes conexos.
Durante a apresentação do plano, a diretora do GCCC, Ana Gemo, afirmou que a revisão legislativa deverá "privilegiar punições com multas pesadas e reposição integral dos valores nos crimes de peculato e concussão [ato de exigir para si ou para outrem, direta ou indiretamente, vantagem indevida] como medida complementar à pena de prisão efetiva" A lei ainda prevê a figura do arresto ou apreensão preventiva de bens nos casos dos crimes citados e afasta a possibilidade de suspender as penas de prisão.
Estão previstas outras medidas como a eventual criminalização dos atos de subfaturação de bens e serviços por parte de servidores públicos e a falta de observância intencional das regras de concurso público com o objetivo de favorecer um agente económico.
Presidente Nyusi lança desafio
Por seu turno, o Presidente Filipe Nyusi considerou que eliminar a corrupção constitui uma urgência, devido ao seu efeito negativo no desenvolvimento do país. Nyusi também lançou um desafio ao Gabinete Central de Combate a Corrupção: "O nosso Gabinete Central deve garantir a responsabilização dos prevaricadores, em particular os funcionários e agentes do Estado e credibilizar as instituições nacionais".
Já o encarregado de negócios da União Europeia, Sergius Varvaroussis, sublinhou que "só com decisões fortes e mudanças radicais que a luta contra a corrupção é efetiva". "A luta contra a corrupção exige um sistema judiciário integro, eficiente, previsível e responsável mas também precisa de uma legislação adequada ao contexto nacional e internacional", acrescentou Sergius Varvaroussis.
O diplomata apontou que apesar do Ministério Público registar melhorias ano após ano, os resultados alcançados ainda não são suficientes.
Apoio da União Europeia
Sergius Varvaroussis anunciou que a União Europeia vai desembolsar mais de 750 milhões de meticais, o equivalente a cerca de 10 milhões de euros, para o combate à corrupção no país durante os próximos cinco anos.
O montante deverá ser empregue integralmente no setor da justiça, sociedade civil e media, indicou o encarregado de negócios da União Europeia.
"O programa prevê intervir nas escolas reforçando o mecanismo de prevenção, os chamados grupos anti-corrupção que o Gabinete Central de Combate a Corrupção está a implementar com o Ministério da Educação. Vai também facilitar a integração da educação cívica em matéria de anti-corrupção nos currículos escolares", explica.
A implementação do presente plano estratégico vai custar 545 milhões de meticais, o equivalente a cerca de sete milhões de euros.
Inovação no Plano Estratégico
Uma das inovações do presente Plano Estratégico do GCCC é a eventual criação de unidades especializadas para julgar casos relacionados com a corrupção, com vista a imprimir maior celeridade no tratamento destes casos.
A DW África ouviu a propósito a opinião do Bastonário da Ordem dos Advogados, Flávio Menete."Ter pessoas dedicadas a lidar com matérias da corrupção será muito melhor porque nós poderemos ter resultados palpáveis regularmente e as pessoas irão compreender que envolver-se em corrupção não compensa”.
Novo plano estratégico de combate à corrupção
Apelo de organizações da sociedade civil
Num outro desenvolvimento, quatro organizações da sociedade civil emitiram um comunicado em que alertam para o nível de sofrimento que a maioria da população está a atravessar devido as dívidas ocultas e apela aos doadores internacionais a retomarem a ajuda ao país, embora fora do orçamento de Estado.
A Fundação Mecanismo de apoio a sociedade civil, o Instituto de estudos sociais e económicos, o Centro de Integridade Pública e Observatório de Meio Rural propõem que o dinheiro seja canalizado para áreas essenciais nomeadamente a saúde, educação, saneamento e água, enquanto se mantém a pressão para o esclarecimento das dividas ocultas.
A utilização dos fundos estaria sujeito a um manual de procedimentos administrativos e financeiros com o estado e a execução dos programas de apoio a cargo de organizações da sociedade civil.
Uma fonte ligada ao grupo de parceiros internacionais disse que está a ser explorada esta via, mas ainda não há decisões.
Maxixe: Obras sem qualidade são adjudicadas por milhões
Em Maxixe, Moçambique, somam-se os casos de obras públicas sobrefaturadas. A DW África juntou exemplos de obras cujo processo de adjudicação não foi transparente e nas quais os orçamentos foram inflacionados.
Foto: DW/L. da Conceição
Favorecimento na seleção das empresas
Em Maxixe, parte das obras de construção civil têm sido adjudicadas à empresa SGI Construções Lda. que não se encontra registada no Boletim da República e que apenas tem escritórios em Maputo. A empresa, com laços fortes com o Presidente do município, Simão Rafael, faturou, nos últimos dois anos, mais de 30 milhões de meticais (cerca de 427 mil euros) em obras que até hoje ainda não terminaram.
Foto: DW/L. da Conceição
Falta de transparência
Como se vê na imagem, para além de não se saber a data do início desta obra, não se conhece o fiscal nem a distância exata para a colocação de pavés. Sabe-se apenas que tem um prazo de execução de 90 dias.
Foto: DW/L. da Conceição
Figuras ligadas à FRELIMO criam empresa
Esta obra, orçada em mais de sete milhões de meticais, foi adjudicada à MACROLHO Lda, uma empresa com sede em Inhambane e que tem, segundo a imprensa local, participações de sócios ligados ao partido FRELIMO, como o ex-governador de Inhambane, Agostinho Trinta. Faturou, nos últimos dois anos, mais de 40 milhões de meticais em obras que, até agora, ainda não foram entregues. O prazo já expirou.
Foto: DW/L. da Conceição
Obras faturadas e abandonadas
Esta via é a entrada do bairro Eduardo Mondlane. Desde 2016, o munícipio já gastou na reparação desta estrada - com cerca de 200 metros -, mais de quatro milhões de meticais. Até à data, apenas foram executados 150 metros. Ao que a DW África apurou, o empreiteiro apenas trabalha nos dias de fiscalização dos membros da assembleia municipal. O dinheiro faturado dava para pavimentar mais de 1 km.
Foto: DW/L. da Conceição
Obras sobrefaturadas
Este é o estado atual de várias obras na cidade de Maxixe. Na imagem, a via do prolongamento da padaria Chambone, foi faturada em mais de cinco milhões de meticais (cerca de 71 mil euros) no ano de 2016. No entanto, esta mesma obra voltou a ser faturada este ano, não tendo o valor sido tornado público.
Foto: DW/L. da Conceição
Obras sem qualidade
Desde o ano de 2015, o conselho municipal da cidade de Maxixe já gastou mais de 10 milhões de meticais (cerca de 142 mil euros) com as obras de reparação de buracos nas avenidas e ruas do centro da cidade. No entanto, o trabalho não tem qualidade e os buracos continuam a danificar carros ligeiros. O empreiteiro desta obra é também a SGI Construções Lda.
Foto: DW/L. da Conceição
MDM denuncia corrupção
A bancada do MDM na assembleia municipal de Maxixe denunciou que as viaturas adquiridas pela edilidade não estão a ser compradas em agências, mas no mercado negro em África do Sul. Diz a oposição que as últimas duas viaturas adquiridas custaram mais de sete milhões de meticais. Um preço quatro vezes superior, quando comparado ao valor das duas viaturas no mercado em Moçambique.
Foto: DW/L. da Conceição
“Não interessa qualidade, queremos faturar”
Jacinto Chaúque, ex-vereador do município de Maxixe, está a ser investigado pelo Gabinete de Combate à Corrupção de Moçambique. Da investigação consta, entre outros, uma gravação telefónica entre Chaúque e o empreiteiro desta obra, na avenida Ngungunhane, e em que o ex-vereador afirma que “não interessa a qualidade. Queremos faturar nestas obras”. Chaúque está a aguardar julgamento.
Foto: DW/L. da Conceição
Preços altos nas construções de edifícios
Em 2015, o conselho municipal de Maxixe construiu um posto policial no bairro de Mabil. Esta infraestrutura - com apenas dois quartos, uma sala comum e uma cela com capacidade para cinco pessoas – custou mais de 1,3 milhões de meticais, não contando com a aquisição de material como mesas ou cadeiras. Ao que a DW África apurou junto do mercado, esta obra não custaria mais de 300 mil meticais.
Foto: DW/L. da Conceição
Um milhão de meticais por cada sede do bairro
As sedes dos bairros são outro exemplo. Todas as sedes dos bairros construídas pelo conselho municipal contam com a mesma planta. Cada uma custou cerca de um milhão de meticais (cerca de 14 mil euros). O preço real de mercado para uma casa tipo dois, sem mobília de escritório, é de cerca de 300 meticais.
Foto: DW/L. da Conceição
Empreiteiro exige dinheiro de volta
O empreiteiro Ricardo António José reclamou, em 2015, a devolução do dinheiro que foi exigido pelo ex-chefe da Unidade Gestora Executora e Aquisições, Rodolfo Tambanjane. O montante pago por Ricardo José era referente ao valor da comissão de Tambanjane por ter selecionado esta empresa e não outra. Rodolfo Tambanjane foi preso, tendo saído depois de pagar caução. O caso continua em tribunal.