O Presidente brasileiro, Michel Temer, aprovou a nova Lei da Migração. A legislação regula a entrada e a permanência de estrangeiros no Brasil. A DW África falou com angolanos no país.
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Enquanto as autoridades norte-americanas discutem a continuidade da construção de um muro fronteiriço que divide parte dos Estados Unidos da América e membros do Conselho Europeu apreciam propostas para conter o fluxo migratório na região, o Brasil vai em contramão e aposta na nova Lei de Migração.
A lei foi aprovada esta semana pelo Presidente brasileiro, Michel Temer. Esperam-se algumas melhorias, como o direito à manifestação dos imigrantes, mas alguns artigos do projeto de lei foram vetados pelo chefe de Estado. Os imigrantes não podem, por exemplo, exercer cargos públicos, tal como se previa no projeto.
Benefícios
A Nova Lei de Migração substituiu o Estatuto do Estrangeiro (EE), criado em 1980 durante a ditadura militar. Para o fundador do Comitê Estadual de Atenção a Imigrantes, Apátridas e Vítimas do Tráfico de Pessoas (Comirat-RS), Fábio Balestro, a lei anterior não se preocupa com o migrante que vive em território brasileiro.
"O migrante não pode, por exemplo, ter nenhuma participação política. Isso, embora flagrantemente inconstitucional, ainda é esporadicamente usado pela Polícia Federal", afirma Balestro. "Da mesma maneira, o EE proíbe a filiação e participação sindical dos migrantes, reduzindo o nível do salário e a qualidade do trabalho nacional ao fazer com que pessoas não tenham acesso a condições de lutar pelos seus direitos."
Com a nova lei, os migrantes poderão filiar-se em sindicatos, participar em protestos e ter acesso a programas e benefícios sociais.
Críticas
Alguns políticos, contrários à nova lei, alegam que o projeto abre as fronteiras do Brasil, facilitando ainda mais o tráfico de drogas. Mas Gustavo Pereira, especialista em Direito Internacional, discorda.
Novos direitos e deveres para imigrantes no Brasil
"Não há nenhum estudo internacional que relacione o aumento dos fluxos migratórios, em geral, com o tráfico de drogas. Esse é um puro preconceito. As manifestações no Brasil contrárias à lei são de pessoas sem informação sobre o assunto", diz o professor da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS).
Dificuldades dos imigrantes
A nova lei afetará a vida de imigrantes como Vânia dos Prazeres, que vive há pelo menos três anos no Brasil. A angolana, de 22 anos, escolheu o país para ter melhores condições de vida e pela facilidade do idioma, embora não seja fácil viver no exterior: "É a primeira vez que saio do país. Foi muito complicado aqui. A situação da casa… praticamente tenho de me sustentar sozinha. Há muito burocracia. Graças a Deus encontrei amigos que já passaram por isso e me ajudaram", conta em entrevista à DW África.
O refugiado angolano Jorge Fernando concorda: "Cada estado tem comportamentos diferentes. Aqui no Rio Grande do Sul, um estado muito fechado, passei por vários constrangimentos, sobretudo na fase de adaptação."
Vários representantes da sociedade civil acreditam que a Nova Lei de Migração é um passo no caminho certo, não obstante os vetos do Presidente, e pedem agora que a legislação seja aplicada.
Os novos migrantes africanos do sul do Brasil
O estado brasileiro do Rio Grande do Sul é conhecido pela imigração alemã. Mas, nos últimos anos, foi destino de migrantes africanos que lá procuram uma vida melhor. Vivem à margem da sociedade e queixam-se de racismo.
Foto: DW/L. Nagel
O sonho de todos os migrantes é o mesmo
Vendedores ambulantes do Senegal no bairro Sarandi em Porto Alegre, Rio Grande do Sul. Óculos de sol são vendidos a preços baixos. No Brasil podem ganhar três ou até quatro vezes mais do que no seu país de origem. O sonho deles é o mesmo dos imigrantes alemães, italianos e poloneses, que chegaram há quase dois séculos em terras gaúchas: trabalhar e viver em paz no Brasil.
Foto: DW/L. Nagel
Senegaleses são maioria entre os africanos
A Associação dos Senegaleses de Porto Alegre tem cerca de 200 membros. A sede da associação fica na zona norte da cidade, em um apartamento, onde há reuniões e orações em conjunto. Em 2014, mais de mil senegaleses pediram refúgio no Brasil. O refúgio só é concedido quando há provas de perseguição política, étnica ou religiosa.
Foto: DW/L. Nagel
Convívio entre os migrantes senegaleses
Duas vezes por mês, na cidade de Porto Alegre, dezenas de imigrantes senegaleses se reúnem nesta "mesquita" improvisada em um apartamento para realizar suas orações. Em dezembro, a comunidade senegalesa comemora a festividade religiosa "Grand Magal Touba", entoando cantigas e poemas escritos pelo líder muçulmano senegalês Cheikh Ahmadou Bamba.
Foto: DW/L. Nagel
Comunicação com a família
O imigrante Omar Doingue fala todos os dias pela Internet com familiares em África, a partir de Porto Alegre, onde vive há poucos meses. A maioria dos senegaleses no Brasil é de classe média urbana, muitos têm ensino médio ou superior. Mesmo assim, em muitos casos, acabam por se dedicar ao comércio informal.
Foto: DW/L. Nagel
Rapper angolano faz sucesso no Brasil
Geraldino Canhanga do Carmo da Silva, conhecido como o rapper "Kanhanga", nasceu na cidade do Lobito, em Angola. Escolheu a cidade de Porto Alegre, no Rio Grande do Sul, para estudar e seguir a carreira de músico. Vive no Brasil desde 2005 e denuncia, através da música, o racismo e a descriminação de que os negros são alvo.
Foto: Kanhanga
Cantar contra a discriminação
Na foto, o rapper angolano canta para população no centro de Porto Alegre. Kanhanga diz ter sido vítima de discriminação quando, em 2014, foi preso por engano. Numa canção, o músico angolano afirma: "Tira as algemas de mim, tira as algemas de mim, polícias racistas bem longe de mim".
Foto: Kanhanga
Guineense chamado de "macaco"
Francisco Ialá, natural de Bissau, vive em Porto Alegre desde junho de 2005. Já foi vítima de racismo e chamado de "macaco" quando morava em uma República de Estudantes. "Depois de formado, vou cursar mestrado em Direito Internacional e lutar por justiça aqui (no Brasil) e no meu país", disse.
Foto: DW/L. Nagel
Não saiu sem ser atentido pelo governador
Em protesto contra o racismo, o guineense Francisco Ialá permaneceu durante horas em frente ao Palácio Piratini, sede do governo do Rio Grande do Sul. O objetivo era ser atendido pelo governador José Ivo Sartori (à direita na foto). Depois de passar um dia inteiro em frente ao Palácio, finalmente Francisco logrou seu objetivo.
Foto: DW/L. Nagel
Aulas para crianças carentes
Além de estudar Direito, Francisco Ialá treina judô, pelo menos quatro vezes por semana, na cidade de Porto Alegre. O imigrante guineense dá aulas a crianças e jovens carentes. O exercício se tornou um aliado na luta pela inclusão social de pessoas em situação de vulnerabilidade.
Foto: DW/L. Nagel
Trabalho voluntário
"Chico", como Francisco Ialá é chamado pelos alunos, trabalha voluntariamente em uma escola pública localizada na zona norte de Porto Alegre. O guineense ensina, pelo menos duas vezes por semana, a disciplina de Direitos Humanos em Educação para as crianças.
Foto: DW/L. Nagel
Auxiliar em vez de enfermeiro
O enfermeiro Moussa Sene, de 34 anos, é natural de Rufisque, Senegal. Veio para o Brasil em março de 2014 com a esperança de exercer sua profissão. Atualmente, Moussa tem trabalho oficial com carteira assinada, conforme as leis brasileiras do trabalho. No entanto, trabalha como auxiliar de serviços gerais em uma distribuidora de refrigerantes em Sapucaia do Sul, Rio Grande do Sul.
Foto: DW/L. Nagel
Remessas para ajudar a família em África
O senegalês Moussa Sene vive num quarto alugado numa pensão na cidade de Novo Hamburgo, 40 km ao sul de Porto Alegre. Paga mensalmente 300 reais (68 euros) pela hospedagem e envia para o Senegal cerca de 600 reais (136 euros) para o sustento de sua família. Moussa é casado, tem dois filhos e sonha em trazer a família para viver no Brasil.
Foto: DW/L. Nagel
Manter os costumes religiosos
Mesmo distante de casa, Moussa Sene mantém as tradições. Como muçulmano fiel, o senegalês reza cinco vezes por dia. Guarda um exemplar do livro sagrado dos muçulmanos, o Alcorão, no seu quarto.
Foto: DW/L. Nagel
Promessas não cumpridas
Em outubro de 2015, o enfermeiro senegalês ficou conhecido nacionalmente por salvar a vida de uma passageira dentro de um trem em São Leopoldo, Rio Grande do Sul. A idosa teve um mal súbito e desmaiou. Moussa socorreu a vítima. Após o episódio, várias promessas de trabalho em hospitais e clínicas surgiram, no entanto nada foi concretizado. Moussa segue sua batalha por um trabalho de enfermeiro.