O Presidente da República de Moçambique considera que a consolidação da democracia multiparditária tem vários entraves, mas frisa que o Governo "tudo vai fazer" para defender de forma persistente os interesses do Estado.
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"Temos de reconhecer que apesar dos esforços empreendidos, as ameaças sucessivas à paz movidas pela desconfiança em relação às instituições da governação eleitoral, a limitação do exercício dos direitos do cidadão e os desafios sociais e económicos contrastam com os progressos alcançados desde a adoção do modelo democrático", disse esta segunda-feira (30.11) o Presidente de Moçambique, Filipe Nyusi.
As declarações foram proferidas num encontro que marcou o fim de um ciclo de palestras de celebração dos 30 anos da democracia multipartidária em Moçambique organizado pelo Instituto para a Democracia Multipartidária (IDM). Apesar da democratização em Moçambique estar manchada pelo facto de as eleições serem consideradas fraudulentas pela oposição, Filipe Nyusi faz outra avaliação da situação.
"Estamos conscientes de que nestes 30 anos as eleições não constituem o único processo de avaliação da democracia. Mas o sucesso com que temos vindo a realizar os pleitos eleitorais deve orgulhar-nosm porque esta é uma prática já enraizada na nossa cultura democrática multipartidária", comentou.
Já o embaixador da União Europeia (UE) em Moçambique, Antonio Sanchéz-Benedito Gaspar, referiu que as democracias já enraizadas não avaliam apenas as eleições como forma de consolidação, mas "uma cultura democrática depende também de conceitos básicos como respeito e aplicação da lei, incluindo uma verdadeira separação de poderes e instituições independentes e eficientes onde a transparência e a responsabilização são essenciais".
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Nyusi apela à união contra o terrorismo
O chefe de Estado de Moçambique aproveitou o ciclo de palestras para pedir a união de forças a todos os moçambicanos no combate ao terrorismo no Norte do país.
"Queremos reafirmar o empenho do Governo no sentido de tudo continuar a fazer, como tem feito, para afirmar a importância e defender de forma persistente os interesses do Estado moçambicano", frisou.
Filipe Nyusi apelou ao maior partido da oposição, a RENAMO, para que sejam resolvidos todos os diferendos internos, para em conjunto com o Governo conseguirem acabar com a insurgência armada no país.
Antonio Sanchéz-Benedito Gaspar enfatizou o apoio do bloco económico europeu no combate ao terrorismo naquela região. "Estamos a apoiar e estamos prontos a reforçar ainda mais o nosso apoio ao Governo na resposta aos múltiplos desafios e ameaças que se vivem atualmente em Cabo Delgado", garantiu.
"Valores democráticos, incluindo o respeito pelos direitos humanos, são e permanecem no âmago da nossa parceria", concluiu.
Três anos de violência
A violência armada em Cabo Delgado dura há três anos e está a provocar uma crise humanitária com cerca de 2 mil mortes e cerca de 500 mil pessoas deslocadas, sem habitação, nem alimentos e concentrando-se sobretudo na área da capital provincial, Pemba.
Por outro lado, as províncias de Sofala e Manica, centro do país, são palco de ataques da autoproclamada Junta Militar, uma dissidência armada da RENAMO.
O grupo rejeita a liderança do presidente da RENAMO, Ossufo Momade, acusando-o de trair as posições do seu antecessor Afonso Dhlakama nas negociações que levaram à assinatura do Acordo de Paz e Reconciliação Nacional, a 6 de agosto.
O desterro forçado dos deslocados em Cabo Delgado
São mais de 450 mil no norte de Moçambique. O terrorismo cortou-lhes as raízes e tomou-lhes o chão. Os deslocados internos procuram vingar noutras paragens. E Pemba tem sido lugar de eleição. Sobreviverão na nova terra?
Foto: Privat
A dor da perda e da impotência
Um olhar que diz mais do que mil palavras, a imagem poderia ser "sem legenda". Foi depois de um ataque à aldeia "Criação", Muidumbe, a primeira investida terrorista ao distrito, em novembro de 2019. Os insurgentes começaram os seus ataques em Cabo Delgado em outubro de 2017.
Foto: Privat
Histórias de vida reduzidas a cinzas
Desde então, a matança e destruição passaram a ser visitas assíduas da região. Como ninguém quer ser anfitrião, os aldeões fugiram. Em finais de outubro, Muidumbe e outros distritos sangraram de novo e a população fugiu. Muidumbe está praticamente nas mãos dos terroristas, tal como Mocímboa da Praia, desde agosto.
Foto: Privat
Quase todos os caminhos vão dar a Pemba
O único desejo destes residentes de Mueda é conseguir um canto no camião para chegar à capital provincial de Cabo Delgado. Mas a disputa entre pessoas e os seus próprios pertences ameaça deixar alguém para trás. Desde meados de outubro, Pemba recebeu cerca de 12 mil deslocados. Inicialmente, recebia à volta de mil deslocados por dia.
Foto: Privat
Quando o mato passa a ser melhor que o lar
Para muitos em Cabo Delgado, ter um teto deixou de ser sinónimo de segurança. Conseguir manter a vida, mesmo sem casa, passou agora a ser a meta. Os bichos passaram a ser mais cordiais que os irmãos terroristas, as estrelas melhores que o teto e os arbustos melhores que as paredes. Famílias procuram refúgio nas matas, onde caminham por dias dominados pelo medo, sem comida e sem norte.
Foto: Privat
Um abraço amigo em Pemba
Estes deslocados chegam de Quissanga. Mas também chegam à praia de Paquitequete, Pemba, deslocados vindos de vários lugares. Todos tentam escapar ao terror. Muitos fixam-se aqui, onde recebem apoio de ONGs, associações, indivíduos e do Governo. Há até quem abra as portas da sua casa para os receber, mesmo não os conhecendo.
Foto: Privat
Crise humanitária faz brotar solidariedade infinita
A falta de quase tudo faz despertar solidariedade que chega de todo o lado. Para quem está longe, uma angariação de fundos e bens materiais é a opção. Já cuidar dos deslocados na praia de Paquitequete, atendendo-os nas suas necessidades, é o que faz quem está no terreno. Na praia, há jovens que chegam de madrugada para dar amor a quem precisa.
Foto: Privat
Uma fuga rodeada de perigos
O medo é tanto que nem a sobrelotação parece intimidar os deslocados internos. No começo de novembro, mais de 40 pessoas morreram a tentar chegar a Pemba num naufrágio entre as ilhas do Ibo e Matemo.
Foto: Privat
Pemba a rebentar pelas costuras
O "boom" de deslocados é tão grande que o sistema de serviços básicos para a população, como água e saneamento, está no limite. Antes desta nova vaga de deslocados, a capital de Cabo Delgado tinha 204 mil habitantes. Agora, tem mais de 300 mil.
Foto: DW/E. Silvestre
Começar nova vida noutro chão
O Governo criou um comité de gestão para esta crise humanitária. Afirma que está a criar novas aldeias, centros de reassentamento, infrastruturas e a parcelar terras para acomodar os deslocados. Embora esteja garantida a segurança, as suas raízes estão noutro chão.
Foto: Privat
Que futuro?
Por enquanto não há resposta. Mas há deslocados que se vão "desenrascando" para sobreviver. Muitos dizem que não querem viver de mão estendida. Por exemplo, quem tem barco vai à pesca ou trasporta mercadorias. Outros entretêm-se a jogar futebol. Vão cuidando das suas vidas. Mas para os que não têm alternativas, que são a maioria, correrão riscos de entrar para o mundo do crime?