O Presidente moçambicano, Filipe Nyusi, pede o apoio da população para encontrar os autores dos ataques, que já fizeram mais de 350 mortos. Governo reuniu-se esta terça-feira na província de Cabo Delgado.
Publicidade
O Governo moçambicano admite que tem sido difícil identificar os autores dos ataques armados no norte do país, mas pede apoio à população. Durante um comício popular em Pemba, esta terça-feira (11.02), o Presidente Filipe Nyusi solicitou aos cidadãos que denunciem quem está por trás dos ataques.
"Fomos instruídos para ficarmos atentos, para apanharmos essas pessoas. Esses jovens que estão a ser recrutados, se quiserem viver bem neste país, é questão de nos dizerem [quem] é aquele ali que mandou e disse que vai dar isto e isto", afirmou o chefe de Estado.
Nyusi voltou a atribuir a violência a entidades estrangeiras, embora não exclua a participação de moçambicanos: "É uma guerra movida por pessoas de fora, pessoas que têm dinheiro", afirmou o chefe de Estado. "Não sabemos de onde é que levam esse dinheiro para matar os moçambicanos. Se calhar até é dinheiro dos próprios moçambicanos que mata os moçambicanos."
Que soluções?
A situação de insegurança em alguns distritos da província de Cabo Delgado foi um dos temas que marcou a reunião do Conselho de Ministros em Pemba, esta terça-feira.
No final dos trabalhos, a porta-voz do encontro, Helena Mateus Kida, prometeu que o Governo vai "continuar a trabalhar na identificação dos insurgentes".
Contudo, em declarações aos jornalistas no final do Conselho de Ministros, a também ministra da Justiça e Assuntos Constitucionais e Religiosos não entrou em detalhes sobre possíveis soluções.
"Sobre a situação de segurança na província de Cabo Delgado, principalmente na zona norte, o que foi feito na sessão foi auscultar a população, as pessoas influentes, o governo distrital e o próprio governo provincial para que o Governo possa responder com ações para trazer soluções para esta situação de instabilidade na província de Cabo Delgado", disse Kida.
"Depois da auscultação, o Governo estará em condições de deliberar as melhores estratégias e encontrar soluções efetivas para essa situação de intranquilidade", assegurou.
Os ataques em Cabo Delgado ocorrem desde 2017. Segundo dados do Governo, cerca de 32 mil famílias foram obrigadas a fugir das suas casas por causa da violência e precisam de ajuda.
Nyusi pede ajuda para encontrar autores dos ataques no norte
Problemas na educação e reconstrução
Outro dos temas em debate no Conselho de Ministros foram os efeitos da época chuvosa no país, em particular na província de Cabo Delgado.
Várias infraestruturas ficaram destruídas, incluindo pontes e estradas. Mas, segundo o ministro das Obras Públicas, Habitação e Recursos Hídricos, João Machatine, algumas obras de reconstrução estão comprometidas por causa dos ataques.
"Na ponte sobre o rio Messalo, [as obras] tiveram interrupções devido à situação dos insurgentes e daí já um trabalho que está sendo feito para convencer aos nossos parceiros a retomarem com a construção dessas três pontes", disse Machatine. "Enquanto isso não acontece, nós iremos já [fazer] o lançamento de uma ponte metálica provisória para se poder aceder à zona norte da província."
Os ataques no norte de Moçambique também têm impedido muitas crianças de ir à escola. Ao todo, mais de 30 mil alunos e 700 professores precisam de abrigo, segundo a ministra da Educação e Desenvolvimento Humano, Carmelita Namashulua.
"Por causa da ação dos malfeitores, as nossas crianças têm sido ciclicamente instrumentalizadas", sublinhou Namashulua.
Cabo Delgado: Datas marcantes dos ataques armados
Começaram em outubro de 2017 em Mocímboa da Praia e já se alastraram a outros três distritos moçambicanos. Os ataques armados na província de Cabo Delgado, que somam já mais de 130 mortos, ainda não têm solução à vista.
Foto: DW/G. Sousa
Outubro de 2017
Os primeiros ataques de grupos armados desconhecidos na província de Cabo Delgado aconteceram no dia 5 de outubro de 2017 e tiveram como alvo três postos da polícia na vila de Mocímboa da Praia. Cinco pessoas morreram. Cerca de um mês depois, a 17 de novembro, as autoridades dão ordem de encerramento a algumas mesquitas por se suspeitar terem sido frequentadas por membros do grupo armado.
Foto: Privat
Dezembro de 2017
Surgem novos relatos de ataques nas aldeias de Mitumbate e Makulo, em Mocímboa da Praia. Na primeira semana de dezembro de 2017, terão sido assassinadas duas pessoas. Vários suspeitos foram identificados, tendo os moradores dado conta que os atacantes deram sinais de afiliação muçulmana. Por sua vez, a polícia desmentiu o envolvimento do grupo terrorista Al-Shabaab nestes ataques.
Foto: DW/G. Sousa
Janeiro a maio de 2018
Apesar de ter começado calmo, 2018 revelar-se-ia um ano de terror na província de Cabo Delgado com os ataques a alastrarem-se a mais distritos. Dada a gravidade da situação, a Assembleia da República aprovou, a 2 de maio, a Lei de Combate ao Terrorismo. Mas, no final do mês, dia 27, novos ataques foram realizados junto a Olumbi, distrito de Palma. Dez pessoas morreram, algumas decapitadas.
Foto: Privat
2 de junho de 2018
Dias mais tarde, a televisão STV dava conta que as forças de segurança moçambicanas haviam abatido, nas matas de Cabo Delgado, oito suspeitos de participação nos ataques. Foram ainda apreendidas catanas e uma metralhadora AK-47, além de comida e um passaporte tanzaniano. Por esta altura, já milhares de pessoas haviam abandonado as suas casas, temendo a repetição dos episódios de terror.
Foto: Borges Nhamire
4 de junho de 2018
Ainda se "festejava" os avanços na investigação das autoridades, e consequente abate dos suspeitos quando, a 4 e 7 de junho, se registaram novos incêndios nas aldeias de Naunde e Namaluco. Sete pessoas morreram e quatro ficaram feridas. Foram ainda destruídas 164 casas e quatro viaturas. O mesmo cenário voltou a repetir-se a 22 de junho: um novo ataque na aldeia de Maganja matou cinco pessoas.
Foto: Privat
29 de junho de 2018
Fortemente criticado por não se ter ainda pronunciado acerca dos ataques, o Presidente moçambicano Filipe Nyusi resolve fazê-lo, em Palma, perante um mar de gente. Oito meses e 33 mortos [25 vítimas dos ataques e oito supostos atacantes] depois... Em Cabo Delgado, Nyusi prometeu proteção aos cidadãos e convidou os atacantes a dialogar consigo, de forma a resolver as suas "insatisfações".
Foto: privat
Agosto de 2018
Depois de, em julho, um novo ataque à aldeia de Macanca - Nhica do Rovuma, em Palma, ter feito mais quatro mortos, Filipe Nyusi desafiou, a 16 de agosto, os oficiais promovidos no exército, por indicação da RENAMO, a usarem a sua experiência no combate contra estes grupos armados que, mais tarde, a 24 do mesmo mês, tirariam a vida a mais duas pessoas, na aldeia de Cobre, distrito de Macomia.
Foto: Jinty Jackson/AFP/Getty Images
Setembro de 2018
Setembro de 2018 voltava a ser um mês negro no norte de Moçambique. Ataques nas aldeias de Mocímboa da Praia, Ntoni e Ilala, em Macomia, deixaram pelo menos 15 mortos e dezenas de casas destruídas. No final do mês, o ministro da Defesa, Atanásio Mtumuke, afirmou que os homens armados responsáveis pelos ataques seriam "jovens expulsos de casa pelos pais".
Foto: Privat
Outubro de 2018
Um ano após o início dos ataques em Cabo Delgado, a polícia informou que os mais de 40 ataques ocorridos, haviam feito 90 mortos, 67 feridos e destruído milhares de casas. Foi também por esta altura que Filipe Nyusi anunciou a detenção de um cidadão estrangeiro suspeito de recrutar jovens para atacar as aldeias. No final do mês, começaram a ser julgados 180 suspeitos de envolvimento nos ataques.
Foto: privat
Novembro de 2018
Novos relatos de mortes macabras surgem na imprensa. Seis pessoas foram encontradas mortas com sinais de agressão com catana na aldeia de Pundanhar, em Palma. Dias depois, o cenário repetiu-se nas aldeias de Chicuaia Velha, Lukwamba e Litingina, distrito de Nangade. Balanço: 11 mortos. Em Pemba, o embaixador da União Europeia oferecia ajuda ao país.
Foto: Privat
6 de dezembro de 2018
A população do distrito de Nangade terá feito justiça pelas próprias mãos e morto três homens envolvidos nos ataques. Na altura, à DW, David Machimbuko, administrador do distrito de Palma, deu conta que "depois de um ataque, a população insurgiu-se e acabou por atingir alguns deles". Entretanto, o Ministério Público juntou mais nomes à lista dos arguidos neste caso. Entre eles está Andre Hanekom.
Foto: DW/N. Issufo
16 de dezembro de 2018
A 16 de dezembro, e após mais um ataque armado no distrito de Palma, que matou seis pessoas, entre as quais uma criança, Moçambique e Tanzânia anunciaram uma união de esforços no combate aos crimes transfronteiriços. 2018 chegava assim ao fim sem uma solução à vista para os ataques que já haviam feito, pelo menos, 115 mortos. O julgamento dos já acusados de envolvimento nos ataques continua.
Foto: privat
Janeiro de 2019
O novo ano não começou da melhor forma. Sete pessoas morreram quando um grupo armado intercetou uma carrinha de caixa aberta que transportava passageiros entre Palma e Mpundanhar. Na semana seguinte, outras sete pessoas foram assassinadas a tiro no Posto Administrativo de Ulumbi. Um comerciante foi ainda decapitado em Maganja, distrito de Palma, no passado dia 20.