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O líder do grupo Wagner poderá desafiar Vladimir Putin?

Maria Katamadze
20 de fevereiro de 2023

Yevgeny Prigozhin tem dado que falar na guerra na Ucrânia pelas suas duras críticas ao Exército russo. Será o "chef de Putin", como é conhecido, uma ameaça para o Presidente russo ou faz apenas o que o Kremlin quer?

Yevgeny PrigozhinFoto: Mikhail Metzel/TASS/IMAGO

Yevgeny Prigozhin, líder do Grupo Wagner, uma empresa militar privada, tornou-se uma das figuras mais proeminentes da invasão russa à Ucrânia. As suas duras críticas, sem precedentes, ao comando militar russo fizeram com que seja considerado uma potencial ameaça ao Presidente Vladimir Putin. Mas será Prigozhin tão influente como parece?

O Grupo Wagner é conhecido pela sua crueldade e pelas táticas violentas no campo de batalha. Recentemente, demonstrou também ser implacável para quem o abandona. Vídeos colocados a circular na Internet mostram alegadas execuções dos seus combatentes que desertaram para o lado ucraniano.

Um vídeo publicado, na semana passada, no canal de Telegram Grey Zone, ligado ao grupo, mostra um dos seus ex-combatentes, que se identificou como Dmitry Yakushchenko, a ser aparentemente espancado até à morte com uma marreta. A mesma arma usada para executar um outro desertor num vídeo que foi publicado no ano passado.

Prigozhin (à esquerda) serve o Presidente Vladmir Putin (no centro) durante um jantar no restaurante de Prigozhin em Moscovo, em 2011Foto: Misha Japaridze/AP/picture alliance

"A ostentação da crueldade faz parte do que Prigozhin oferece. É tudo parte de uma campanha publicitária que promove um culto à violência", escreveu Andrei Kolesnikov, membro do Carnegie Endowment for International Peace, no jornal independente russo "Novaya Gazeta".

De vendedor de cachorros quentes a "chef" de Putin

Nascido em 1961, na então Leningrado, hoje São Petersburgo, Yevgeny Prigozhin passou parte da sua juventude numa prisão soviética, onde cumpriu nove anos por roubo e fraude. Após a sua libertação, que coincidiu com a queda da União Soviética, seguiu o caminho do empreendedorismo. Prigozhin começou com um carrinho de venda de cachorros quentes na sua cidade natal, tendo evoluído mais tarde para projetos maiores, como a abertura de um restaurante luxuoso em São Petersburgo, que se tornou referência para as elites russas, incluindo o então vice-presidente da Câmara, Vladimir Putin.

Os contactos no seio da elite política russa valeram a Prigozhin a expansão do seu negócio, que cresceu ainda mais depois de Putin ser eleito Presidente. Fundada nos anos 90, a empresa de catering de Prigozhin - a Concord - recebeu do Governo contratos exclusivos e bastante lucrativos para jantares estatais, dos quais se destacam a cerimónia de tomada de posse de Putin e a visita do Presidente norte-americano George W. Bush a São Petersburgo. Serviços que valeram a Prigozhin a alcunha de "chef de Putin".

Mas Prigozhin não limitou as suas ambições ao setor da restauração.

Interferência eleitoral e "serviços obscuros"

Prigozhin admitiu, recentemente, ser o fundador da "Internet Research Agency" (IRA), conhecida como "fábrica de trolls" informáticos que, segundo o FBI, lançou uma ampla campanha de desinformação para influenciar os resultados das eleições presidenciais americanas de 2016. Alegações que foram sempre veemente negadas por Prigozhi e os seus advogados, que inclusive processaram jornalistas que escreveram sobre a sua ligação às "fábricas de trolls" russas.

Mercenários do Grupo Wagner estão presentes na Ucrânia, assim como em vários países africanos e na SíriaFoto: Igor Russak/REUTERS

Em 2014, Prigozhin criou o Grupo Wagner. Durante muito tempo, e à semelhança do que aconteceu com as "fábricas de trolls", negou qualquer envolvimento com o grupo - até setembro do ano passado, quando admitiu ter sido ele a formá-lo.

Em entrevista à DW, a analista independente russa Alexandra Prokopenko diz que a empresa mercenária de Prigozhin presta "serviços obscuros" a Putin.

"Ele facilita a vida do chefe e do seu círculo íntimo nas regiões onde eles não se querem envolver pública e oficialmente", afirma a analista, dizendo que as atuações do Grupo Wagner nas regiões de Donetsk e Luhansk, na Ucrânia, assim como em África e na Síria, são exemplo disso. Nestes locais, acrescenta a analista, "os mercenários, não só participaram em ações de combate, como também garantem a segurança de algumas instalações petrolíferas".

Grupo Wagner vs. Exército Russo

Os mercenários do grupo Wagner envolveram-se pela primeira vez na Ucrânia em 2014, quando ajudaram separatistas apoiados pela Rússia a anexar ilegalmente a península da Crimeia. Após a invasão da Ucrânia pela Rússia, em fevereiro de 2022, a capacidade do Grupo Wagner em avançar no campo de batalha no leste da Ucrânia tornou-se um importante trunfo militar para o Kremlin. No mês passado, os mercenários anunciaram mesmo o controlo da cidade ucraniana de Soledar, uma das poucas vitórias de Moscovo desde o início da guerra.

Ministro da Defesa da Rússia, Sergei ShoiguFoto: Dmitry Astakhov/ITAR-TASS/IMAGO

A eficiência do Grupo Wagner e a sua crescente importância no campo de batalha ucraniano permitiram a Prigozhin lançar uma campanha embaraçosa contra altos funcionários militares russos.

Face a protestos públicos na Rússia sobre a falta de munições no terreno, Prigozhin chamou "incompetentes" às chefias do Exército, atacando pessoalmente o Ministro da Defesa, Sergei Shoigu, e o general Valery Gerasimov, responsável pela modernização do Exército. Numa das suas últimas críticas, culpou a burocracia militar russa pelas sucessivas tentativas infrutíferas de capturar Bakhmut, que durante vários meses esteve no centro do conflito com fortes baixas russas e ucranianas.

"Bakhmut teria sido capturada antes do Ano Novo se não fosse a nossa monstruosa burocracia militar e os seus entraves", disse Prigozhin numa entrevista aos meios de comunicação estatais russos.

General Valery Gerasimov, comandante das forças russas na UcrâniaFoto: Mikhail Kuravlev/AP/picture alliance

Segundo Kolesnikov, do Carnegie Endowment for International Peace, no sistema autocrático da Rússia, apenas Vladimir Putin pode criticar os oficiais militares. Mas "Putin precisa de Prigozhin para manter os generais militares em alerta".

"É assim que equilibra os 'pesos' das várias figuras, empurrando-as umas contra as outras e mantendo-as debaixo de olho para que nenhuma delas saia excessivamente fortalecida", explica.

Apesar das críticas de Prigozhin, o Presidente russo promoveu Gerasimov a comandante das forças russas na Ucrânia, no início de janeiro, o que no entender dos analistas mostra que o discurso de Prigozhin não limita as decisões de Putin.

"Dor de cabeça para todos no Kremlin"

Prigozhin, que anteriormente fugia dos holofotes da imprensa, tornou-se uma figura importante na guerra da Rússia contra a Ucrânia. A sua crescente procura por "fama" deu origem a especulações sobre as suas possíveis ambições políticas.

Segundo o site independente russo "Meduza", Prigozhin poderá estar a planear fundar um movimento patriótico e conservador que deverá evoluir para um partido político - algo que ele já negou publicamente.

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No artigo que escreveu para o "Carnegie Endowment for International Peace", Tatyana Stanovaya afirma que as ambições de Prigozhin na política poderiam prejudicar as suas relações com o Kremlin.

"Os supervisores da política interna não gostam da sua demagogia política, dos seus ataques às instituições oficiais ou das suas tentativas de enganar a equipa de Putin, ameaçando formar um partido político, o que seria uma dor de cabeça para todos no Kremlin."

Recentemente, o Kremlin impediu o recrutamento de combatentes condenados, que, segundo o Conselho de Segurança Nacional dos EUA, representam 80% das tropas da Wagner. A medida pode ser vista como uma forma do Kremlin limitar Prigozhin.

Kolesnikov diz que, dadas as responsabilidades que lhe foram atribuídas, o único caminho possível para Prigozhin é tornar-se político. Mas Putin não quer.

"Enquanto Vladimir Putin for capaz de controlar subtilmente as forças políticas, pode retirar Prigozhin da equação na altura certa e colocá-lo de volta no seu lugar habitual - na política obscura", conclui.

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