Analistas defendem que a Igreja Católica tem um papel fundamental na resolução da crise congolesa. Politólogo acredita inclusive que a Igreja pode, se quiser, provocar a queda do Presidente Joseph Kabila.
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Passou um ano desde a assinatura do Acordo de São Silvestre entre o Governo congolês e a oposição. O documento previa a realização de eleições gerais até ao final de 2017. Mas, depois de vários atrasos, Joseph Kabila continua na Presidência, apesar do seu mandato ter terminado há um ano.
Em dezembro de 2016, a Igreja Católica teve um papel crucial, mediando o acordo com a oposição, mas esse papel não se esgotou um ano depois.
Se quisesse, a Igreja teria até o poder de derrubar o Presidente Joseph Kabila, comenta o politólogo Fidel Bafilemba, em entrevista à DW: "Será suficiente que estejam do lado da nação congolesa e a situação poderá mudar num piscar de olhos", afirma.
Insatisfação popular
No domingo (31.12), grupos da oposição e de católicos foram para as ruas protestar contra Joseph Kabila. As forças de segurança da República Democrática do Congo reprimiram violentamente os protestos, entrando em igrejas e interrompendo missas.
De acordo com manifestantes, doze pessoas morreram durante os protestos - número negado pela polícia. Mais de cem pessoas foram detidas, incluindo sacerdotes e acólitos.
A Igreja Católica é uma peça poderosa no xadrez político congolês. Está, por esse motivo, cada vez mais sob pressão, de acordo com o analista Ben Shepherd. A repressão policial de domingo é exemplo disso.
"Colocar homens armados nas igrejas é uma atitude bastante forte, em termos simbólicos", diz o especialista do instituto britânico Chatham House.
O poder da Igreja Católica na RD Congo
Uma linha "muito ténue"
40% da população congolesa é católica. A Igreja goza de prestígio em todo o país, devido ao seu papel na ajuda aos mais necessitados, prestando serviços de saúde ou educação. Mas com o prestígio, aumenta a responsabilidade.
"A Igreja percorre uma linha muito ténue", afirma Shepherd. "A Igreja foi fundamental para a assinatura do acordo no final de 2016. É, praticamente, a única instituição na República Democrática do Congo com autoridade moral para agir como árbitro e pressionar a elite política. Mostrou, com estas manifestações, que consegue mobilizar pessoas para as ruas, mais do que a oposição", enfraquecida por conflitos internos.
Por outro lado, lembra o analista, "a hierarquia da Igreja é vista, por muitos, como parte do sistema político."
A Igreja está dividida. A liderança católica não apoiou as manifestações de domingo. Pode, porém, provocar mudanças na República Democrática do Congo - é essa, pelo menos, a convicção de Fidel Bafilemba.
"Penso que, na deceção total, no abandono em que os congoleses se encontram hoje, esta população não tem escolha. Qualquer um que se apresente como Moisés, e é uma pessoa séria, vencerá", diz o politólogo.
As eleições na República Democrática do Congo foram adiadas para 23 de dezembro deste ano.
A "maldição dos recursos" na República Democrática do Congo
O cobalto e o coltan são minérios abundantes na República Democrática do Congo. Mas, a par com a instabilidade regional, estes recursos atraem milícias, exploração e violência.
Foto: picture-alliance/dpa/J. Bätz
Recursos atraem violência e oportunistas
Nas províncias da região oriental da República Democrática do Congo (RDC), tesouros como ouro e estanho atraem milícias oportunistas. Estes grupos violentos exploram pessoas, incluindo crianças, na extração dos chamados "minerais de conflito" – como são o ouro, o cobalto e o coltan. Com as receitas angariadas, os grupos compram armas para conquistar mais territórios e assim, perpetuam o conflito.
Foto: picture alliance / Jürgen Bätz/dpa
Proteger os cidadãos e a exploração legal
A Missão das Nações Unidas na República Democrática do Congo (MONUSCO), a maior e mais cara missão de paz da ONU, tem vindo a trabalhar na estabilização da situação nas províncias do norte e do sul de Kivu, que estão no centro da violência do país. As forças de segurança patrulham aldeias mineiras como Nzibira, localizada na margem da Zola Zola, uma mina legal de exploração de cassiterita.
Foto: picture-alliance/dpa/J. Bätz
Pagar “o preço humano” por telemóveis
A cassiterita é apenas um dos minerais usados na fabricação de telemovéis. Metade da produção mundial destes minerais vem da África Central. A exportação de estanho, ouro e outros minérios da RDC tem estado sob vigilância desde 2010, altura em que entrou em vigor, nos Estados Unidos da América, a lei que exige que as empresas americanas assegurem que não trabalham com "minerais de conflito".
Foto: picture-alliance/dpa/D. Karmann
Comprovar a legalidade dos minerais
Um cartaz em Nzibira explica como os sacos de minerais precisam de ser devidamente selados e rotulados por um inspetor de minas para que a sua origem legal possa ser provada às empresas dos EUA. No entanto, o sistema apresenta muitas falhas. As minas ilícitas podem simplesmente vender os seus "produtos" no mercado negro ou contrabande-á-los numa mina legal, embalando-os lá.
Foto: picture-alliance/dpa/J. Bätz
Exploração de crianças
Apesar dos esforços levados a cabo por organizações, as violações de direitos humanos continuam a existir na exploração de minérios na RDC. Crianças como Esperance Furahaare, que foi raptada e violada por uma milícia quando tinha 14 anos, são vítimas comuns da exploração e violência.
Foto: picture-alliance/dpa/J. Bätz
Impacto ambiental
As minas, que são difíceis de controlar, também podem prejudicar o meio ambiente e as comunidades vizinhas. Nas minas ilegais, acontece frequentemente, os esgotos misturarem-se com as águas locais, poluindo o abastecimento.
Foto: picture-alliance/dpa/J. Bätz
Futuro pouco claro para a legislação
Os responsáveis pelas leis nos EUA estão a tentar avançar com um projeto de lei que poderá eliminar a reforma de 2010 - que exige que as empresas assegurem que não trabalham com "minerais de conflito". Os legisladores argumentam que a Lei Dodd-Frank tem reprimido o desenvolvimento económico do país e não teve efeito prático na exploração na África Central.