O Mali saiu do grupo regional G5-Sahel e anunciou a retirada das suas tropas. Trata-se de um golpe para a organização, mas talvez também para o Mali, que se está a isolar cada vez mais.
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Bamako decidiu, este domingo (15.05), retirar-se do G5-Sahel, uma organização regional de coordenação e cooperação do qual fazem parte a Mauritânia, o Chade, o Burkina Faso e o Níger.
O Mali contesta o facto de, até agora, lhe ter sido vedada a presidência da organização, criada em 2014 e que desde 2017 formou uma força conjunta antiterrorista.
O que irá acontecer após a retirada do Mali do grupo? Muitos peritos veem ia decisão como um golpe para um Sahel-G5 já em dificuldades, outros consideram que é mais um passo para o isolamento do Mali.
A versão oficial
Em comunicado, o Mali refere que alguns Estados do G5-Sahel não querem que o país assuma a presidência da organização, que foi criada há oito anos, na Mauritânia, e da qual o país é um pilar importante.
Como vai ficar o combate ao terrorismo no Sahel?
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"A oposição de certos Estados à presidência do Mali está ligada às manobras de um Estado extra-regional que procura desesperadamente isolar o Mali", alega o Governo maliano.
O mandato do Presidente chadiano terminou em fevereiro passado e a presidência rotativa deveria caber agora ao Mali.
Uma conferência de chefes de Estado do G5 do Sahel estava prevista para fevereiro, em Bamako, que deveria "consagrar o início da presidência maliana do G5", mas "quase um trimestre após a data indicada" esta reunião "ainda não teve lugar", lê-se na mesma nota.
Uma organização "instrumentalizada"
Fahiraman Rodrigue Koné, investigador sénior do Instituto de Segurança de Bamako, considera que a retirada do Mali certamente é "algo importante", mas não irá alterar "a paralisia de que a instituição tem sofrido há já vários meses".
O investigador sublinha que "o mecanismo da força conjunta já estava minado por uma crise de governação que abalou três dos cinco países que compõem a organização" - Burkina Faso, Chade e Mali, todos eles governados por uma junta militar.
Golpes militares no Mali e no Burkina Faso, dois dos cinco membros da força anti-jihadista multilateral do G5-Sahel, estão a minar a sua capacidade operacional, disse recentemente o secretário-geral da ONU, António Guterres.
Golpes de Estado em África: Um mal endémico
Em menos de um ano, o continente africano viveu oito golpes e tentativas de golpe de Estado. A maior parte aconteceu na África Ocidental, região do continente mais fértil para as intentonas. Não há fator surpresa.
Foto: Radio Television Guineenne/AP Photo/picture alliance
Níger: Tentativa de golpe fracassada
A tentativa de golpe de Estado aconteceu a 31 de março de 2021, dois dias antes da tomada de posse do Presidente Mohamed Bazoum. Na capital, Niamey, foram detidos alguns membros do Exército por detrás da tentativa. O suposto líder do golpe é um oficial da Força Aérea encarregado da segurança na base aérea de Niamey. O Níger já sofreu 4 golpes de Estado: o último, em 2010, derrubou Mamadou Tandja.
Foto: Bernd von Jutrczenka/dpa/picture alliance
Chade: Uma sucessão com sabor a golpe de Estado
Pouco depois do marechal Idriss Déby ter vencido as presidenciais, morreu em combate contra rebeldes. A 21 de abril de 2021, o seu filho, o general Mahamat Déby, assumiu a liderança do país, sem eleições, nomeando 15 generais para o Conselho Militar de Transição, entre eles familiares seus. Idriss governou o Chade por mais de 30 anos com mão de ferro e o filho dá sinais de lhe seguir os passos.
Foto: Christophe Petit Tesson/REUTERS
Mali: Um golpe entre promessas de eleições
O coronel Assimi Goita foi quem derrubou Bah Ndaw da Presidência do Mali a 24 de maio de 2021. Justifica que assim procedeu porque tentava "sabotar" a transição no país. Mas Goita prometeu eleições para 2022 e falou em "compromisso infalível" das Forças Armadas na defesa da segurança do país. Pouco depois, o Tribunal Constitucional declarou o coronel Presidente da transição.
Foto: Xinhua/imago images
Tunísia: Um golpe de Estado sem recurso a armas
No dia 25 de julho de 2021, Kais Saied demitiu o primeiro ministro, seu rival, Hichem Mechichi, e suspendeu o Parlamento por 30 dias, o que foi considerado golpe de Estado pela oposição, que convocou manifestações em nome da democracia. Saied também levantou a imunidade dos parlamentares e garantiu que as decisões foram tomadas dentro da lei. Nas ruas de Tunes, teve o apoio da população.
Foto: Fethi Belaid/AFP/Getty Images
Guiné-Conacri: Um golpista da confiança do Presidente
O dia 5 de setembro de 2021 começou com tiros em Conacri, uma capital que foi dominada por militares. O Presidente Alpha Condé foi deposto e preso pelo coronel Mamady Doumbouya - que dissolveu a Constituição e as instituições. O golpista traiu Condé, que o tinha em grande estima e confiança. Doumboya tinha demasiado poder e não se entendia com a liderança da ala castrense.
Foto: Radio Television Guineenne via AP/picture alliance
Sudão: Golpe compromete transição governativa
A 25 de outubro de 2021, os golpistas começaram por prender o primeiro ministro, Abdalla Hamdok, e outros altos quadros do Governo para depois fazerem a clássica tomada da principal emissora. No comando estava o general Abdel Fattah al-Burhan, que dissolveu o Conselho Soberano. Desde então, o Sudão vive manifestações violentas, com a polícia a ser acusada de uso excessivo de força.
Foto: Mahmoud Hjaj/AA/picture alliance
Burkina Faso: Golpe de Estado festejado
A turbulência marcou o começo do ano, mas a intentona foi celebrada em grande nas ruas da capital, Ouagadougou. A 23 de janeiro de 2022, o tenente-coronel Paul Damiba liderou o golpe de Estado ao lado do Exército. Ao Presidente Roch Kaboré não restou outra alternativa se não demitir-se. Tal como os golpistas de outros países, comprometem-se a voltar à ordem constitucional após consultas.
Foto: Facebook/Präsidentschaft von Burkina Faso
Guiné-Bissau: Intentona ou "inventona"?
Tiros, alvoroço, mortos e feridos no Palácio do Governo marcaram o dia 1 de fevereiro de 2022 em Bissau. O Presidente Umaro Sissoco Embaló diz que os golpistas queriam matá-lo e ao primeiro ministro, Nuno Nabiam. Houve algumas detenções, mas até hoje não se conhece o líder golpista. No país, acredita-se que tudo não passou de um "teatro" orquestrado pelo próprio Presidente, amplamente contestado.