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O que significam os números do coronavírus?

Anna Carthaus
26 de março de 2020

Há três meses que a doença COVID-19 mantém o mundo em suspense. Torna-se difícil acompanhar todos os números publicados e os termos técnicos usados pelos especialistas. Para que servem e porque é que são importantes?

Foto: picture-alliance/chromorange

O número básico de reprodução é um dos termos técnicos que mais se ouve nas últimas semanas. Ele indica o potencial de propagação de um vírus. Se o número de reprodução for superior a 1, cada pessoa infetada transmite a doença a pelo menos uma outra pessoa e o vírus começa a espalhar-se. Se o número for inferior a 1, cada vez menos  contagiam-se, e o número de pessoas infetadas diminui.

Do que resulta que para conter a propagação de um vírus, o seu número de reprodução deve ser inferior a 1.

Na Alemanha cabe ao Instituto Robert Koch monitorizar doenças infecciosas. Os seus peritos assumem que que o número básico de reprodução da SARS-Cov-2 se situa entre 2,4 e 3,3. O que significa que cada pessoa infetada contagia entre duas a três outras pessoas.

Por outras palavras, para controlar a epidemia, devem ser evitadas cerca de dois terços de todas as transmissões.

Como ainda não há vacina disponível e não existe uma proteção eficaz contra o vírus, calcula-se que entre 60 a 70 por cento da população se acabe por infetar. Nessa altura, o vírus atingirá mais pessoas infetadas do que pessoas saudáveis, o que o impedirá de espalhar ainda mais.

Duração do tempo em que uma pessoa infetada pode infetar outras

Trata-se de uma questão que ainda não foi esclarecida de forma conclusiva. Atualmente, presume-se que uma pessoa infetada pode transmitir o vírus 24 a 48 horas antes do aparecimento dos sintomas. Pesquisas na cidade chinesa de Shenzen sugerem que um quarto de todas as infeções é transmitido por pessoas que ainda não mostraram sintomas. Em média. o tempo de infeção é de cinco a seis dias, mas pode chegar a ser 14 dias.

Assim que uma uma pessoa infetada passe a apresentar sintomas, provavelmente permanece contagiosa durante sete a doze dias, se não adoecer gravemente, e durante mais de duas semanas, se o caso for grave. O vírus é transmitido por gotículas. Quanto mais fundo estas vêm dos pulmões, mais tempo o vírus permanece ativo. Pode-se dizer que o muco é mais perigoso do que a saliva. Neste momento a transmissão através de fezes é considerada improvável.

Taxa de casos de morte

A taxa de casos de morte indica o risco de morte de uma pessoa com SARS-Cov-2. Os cálculos para a pandemia em curso não são fáceis.

Para o que há vários motivos. A taxa de baixas depende sempre do contexto, hora e local de ocorrência. Quer se trate da China, Itália ou EUA: a SARS-Cov-2 afeta sistemas de saúde preparados e equipados de forma diferente, diferentes grupos etários, pessoas com diferentes condições pré-existentes e diferentes formas de coabitação.

Estes e outros  fatores determinam o quão vulnerável é uma população. Por isso não é possível comparar ou transferir números.

Também os dados e números utilizados como base para o cálculo do potencial de vítimas têm uma grande influência. Se, por exemplo, no primeiro dia da epidemia, o número de todos os que morreram for dividido pelo número de todos os que adoeceram, o número dos que adoeceram será muito elevado, enquanto o número dos que morreram será relativamente pequeno. A proporção de mortes por doenças seria muito pequena. Este erro de cálculo aconteceu no início da pandemia na China.

Os números podem divergir, mas lavar as mãos com cuidado é uma arma certa contra o contágioFoto: picture-alliance/AP Photo/S. Cherkaoui

Número desconhecido de casos não registados

Por outro lado, pode assumir-se que muitos casos passam despercebidos ou não são registados. Neste caso, a percentagem daqueles que morreram em relação a todos os que adoeceram é desproporcionalmente elevada. Foi o que aconteceu no Irão, para dar um exemplo.

O matemático e epidemiologista Adam Kucharski, do London School of Hygiene and Tropical Medicine, na Gr・Bretanha, assume que os dois efeitos acabar縊 por anular-se mutuamente no decorrer da pandemia. Kucharski a taxa real de baixas em 0,5 a 2%, ou seja, por cada 100 casos de infeção morrem uma ou duas pessoas.

Número real de casos

O número não é conhecido. A Organização Mundial de Saúde (OMS), a Universidade Johns Hopkins ou o Instituto Robert Koch (RKI) monitorizem e publiquem os números de casos de coronavírus atualmente confirmados, mas, lá está, são só os casos confirmados. E estes só podem dar uma indicação do número de casos reais e da rapidez com que o vírus se espalha, indicação essa que depende do número de pessoas testadas ou e da quantidade de testes disponíveis num país.

Baseado nas taxas de mortalidade atuais, pode ser calculado o possível número real de pessoas infetadas. Extrapolando do números de mortes, o matemático Tomas Götz, da Universidade de Koblenz-Landau, estima que no final de fevereiro terá havido 40.000 casos na Itália. Este seria um fator de 50 acima do número reportado de 800 casos.

No entanto, o cálculo não pode ser transferido para a Alemanha, "uma vez que o número atual comparativamente muito baixo de mortes, não se enquadra na comparação internacional", segundo explica a universidade. Além disso faltam dados sobre o número de casos tratados em hospitais na Alemanha.

Para o ser humano é difícil entender um crescimento que não é linear. O crescimento é sempre associado à noção de continuidade: hoje um, amanhã dois, dentro de uma semana sete. Mas um vírus não se reproduz linearmente, o seu crescimento é exponencial. Ou seja, uma pessoa infetada infecta uma pessoa. Estes dois, por sua vez, infetam cada um mais duas pessoas. As quatro pessoas agora infetadas contagiam cada uma mais quatro pessoas, e assim por diante.

Imagine que deve encher um tabuleiro de xadrez com grãos de arroz, começando em A1 e adicionando arroz todos os dias. Se tivéssemos um crescimento linear, o tabuleiro de xadrez estaria  preenchido com 64 grãos após 64 dias. O crescimento exponencial significa que, após 64 dias, teria 9.223.372.036.854.775.808 grãos de arroz no tabuleiro.

É tentador comparar os números absolutos dos casos nos diversos países. Mas é insuficiente, porque os números sobem em flecha e já amanhã serão muito diferentes de hoje. Para rastrear a propagação de um vírus, é preciso olhar para sua velocidade de duplicação. Neste momento, o vírus precisa de cada vez menos tempo para duplicar. Quando esta velocidade diminuir, ainda haverá infeções, infetados, mas o vírus estará em retirada.

O crescimento exponencial transforma um vírus numa pandemiaFoto: imago images/Westend61

Achatar a curva

Todas as medidas de contenção atualmente tomadas têm por objetivo "achatar a curva", para que o número de casos de doentes não exceda as capacidades dos sistemas de saúde e para que os médicos não tenham de decidir quais os pacientes que serão tratados, ou não.

Mas porque é que a percentagem de mortes difere tanto entre países? Porque a Itália, por exemplo, bate tristes recordes, enquanto os números dos casos na Alemanha são parecidos, mas a taxa de mortalidade é muito mais baixa?

A questão foi investigada pelos economistas de Bonn Moritz Kuhn e Christian Bayer. As estatísticas mostram que a mortalidade aumenta com a idade do paciente. Os economistas assumem que o contágio acontece sobretudo no local de trabalho, o que significa que a população ativa foi a mais afetada.

Modelos de coabitação

As sociedades são estruturadas por modelos de coabitação diversos. Nuns países as gerações tendem a viver em proximidade, noutros vivem separadas. Os economistas descobriram que a proporção de baixas aumenta quanto mais pessoas ativas vivem com os pais. Ou seja, quanto maior é o intercâmbio entre as gerações, mais pessoas morrem. Se a teoria estiver correta, os países de maior risco a nível mundial são a Índia, Taiwan e Tailândia, e na Europa a Sérvia e a Polónia.

A tendência não pôde ser comprovada nos países asiáticos. Christian Bayer suspeita que isso pode ser devido a diferenças nos padrões de higiene e na forma como as pessoas vivem juntas fisicamente.

 

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