ONG angolana critica tratamento de imigrantes ilegais
Lusa
8 de novembro de 2018
Organização não-governamental Mosaiko apela a "respeito dos direitos humanos" de imigrantes ilegais congoleses na "Operação Transparência". ONG diz que muitas pessoas estão sem alimentos e sem agasalhos.
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Uma organização não-governamental angolana de defesa dos direitos humanos denunciou esta quarta-feira (07.11) o "tratamento deplorável" das autoridades angolanas a "imigrantes ilegais" da República Democrática do Congo, incluindo crianças e grávidas, no quadro da "Operação Transparência" que decorre em Angola.
Numa nota de imprensa enviada à agência de notícias Lusa, em Luanda, o Mosaiko - Instituto para Cidadania manifesta-se "bastante preocupado" com a operação de "combate à imigração e exploração ilegal de diamantes", iniciada a 25 de setembro.
De acordo com o Mosaiko, que apela ao "respeito dos direitos humanos" e às convenções internacionais rubricadas por Angola, a "inquietação" baseia-se em "factos evidenciados" entre os dias 14 e 18 de outubro no município do Cuango, província angolana da Luanda Norte.
Mulheres e crianças sem alimentos
No local, a equipa do Instituto, que procedia a uma monitorização do Relatório de Avaliação Participativa sobre o Acesso a Justiça, constatou que várias pessoas "ficavam entre dois e três dias à espera de transporte, sem o mínimo de condições para passar as noites".
"Sem alimentos, e muitas delas dormindo no chão, sem agasalhos, as pessoas, inclusive crianças e mulheres gestantes, eram levadas até à fronteira em carroçaria de camiões em condições deploráveis", refere o Mosaiko.
Para a instituição angolana de defesa dos direitos humanos, os atos "transgridem o direito à liberdade e à proteção" previstos na Constituição da República de Angola (CRA), bem como "à livre circulação e à escolha de domicílio", conforme a Lei sobre o Regime Jurídico dos Estrangeiros na República de Angola.
Governo nega violação dos direitos
Segundo as autoridades angolanas, a "Operação Transparência" levou já ao "repatriamento voluntário" de mais de 380.000 cidadãos estrangeiros, à apreensão de mais de 17.000 quilates de diamantes, dezenas de motorizadas e viaturas e o encerramento de mais de 200 casas de compra e venda de diamantes.
Em outubro, o Governo angolano insistiu que eram "completamente falsas" as afirmações sobre "massacres, sevícias e violações dos direitos" praticadas pelas autoridades ou populares a imigrantes ilegais, sobretudo os da República Democrática do Congo (RDCongo).
Expulsão de congoleses de Angola vitima crianças
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"Não foram praticados quaisquer atos de violência por parte das autoridades militares ou policiais suscetíveis de serem classificados como violações dos direitos humanos contra cidadãos da RDCongo", garantiu na ocasião, Pedro Sebastião, ministro de Estado e Chefe da Casa de Segurança do Presidente angolano.
Contudo, o Mosaiko refere que as crianças, adolescentes e jovens em idade escolar "são obrigados a abandonar os estudos" para acompanhar os progenitores, o que "viola o seu direito à educação", previsto na Constituição angolana e no artigo 27.º da Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH).
"O Estado Angolano não só ratificou tratados internacionais, como também acautelou na sua Constituição que todos os preceitos constitucionais e legais relativos aos direitos fundamentais devem ser interpretados e integrados em harmonia com a DUDH, a Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos e os tratados internacionais", observou o Mosaiko.
"Cada pessoa, estrangeira ou não, deve ser tratada com dignidade e respeito. A eventual ilegalidade das pessoas não justifica os maus-tratos aos quais têm sido submetidas. Por isso, apelamos ao Governo de Angola, aos órgãos competentes, para que no pleno comprometimento que o Estado Angolano e os órgãos de soberania têm com as pessoas, independentemente de qual seja a situação, cuidem para que os seus direitos sejam respeitados", concluiu a nota assinada pelo diretor-geral da organização, Júlio Candeeiro.
Congoleses em fuga de Angola: RDC promete retaliação
Mais de 270 mil congoleses foram obrigados a abandonar Angola. Em retaliação, o ministro dos Negócios Estrangeiros congolês deu dois meses aos angolanos ilegais para abandonarem a RDC. ACNUR teme nova crise humanitária.
Foto: Reuters/G. Paravicini
Ao ritmo de 1.000 imigrantes por hora
Imigrantes congoleses chegam à localidade fronteiriça de Kamako, já do lado da República Democrática do Congo (RDC), ao ritmo de 1.000 pessoas por hora. Mais de 270 mil imigrantes ilegais congoleses foram obrigados a abandonar Angola, após um decreto do Presidente João Lourenço que visa acabar com a imigração ilegal no país, sobretudo nas regiões diamantíferas das Lundas.
Foto: Reuters/G. Paravicini
RDC promete retaliação
O Governo em Kinshasa utiliza o termo "expulsos" quando se refere aos imigrantes que Angola diz estarem a "sair de forma voluntária" do país. Como represália, o ministro dos Negócios Estrangeiros congolês definiu um prazo de dois meses para que todos os angolanos em situação irregular saiam da RDC. A tensão levou os Governos e representações diplomáticas dos dois países a iniciarem conversações.
Foto: Reuters/G. Paravicini
Detidos com documentos angolanos falsos
Em colaboração com o ACNUR e com organizações não-governamentais, as autoridades congolesas estão a vigiar a pente fino as entradas no país. Entre os cidadãos obrigados a abandonar Angola, há portadores de documentação da nação vizinha. Porém, o porta-voz da "Operação Transparência" anunciou a detenção de imigrantes com "documentos angolanos falsos" que serão julgados em Luanda.
Foto: Reuters/G. Paravicini
Congoleses dedicavam-se ao garimpo ilegal
O comandante da Polícia Nacional de Angola, António Bernardo, garante que os imigrantes que estão a abandonar o país "não se coíbem de dizer" que se deslocaram para Angola "para ganhar dinheiro na exploração ilegal de diamantes". Com o encerramento das cooperativas e casas ilegais de venda e compra de pedras preciosas, "os imigrantes decidiram voluntariamente sair do país", diz o responsável.
Foto: Reuters/G. Paravicini
ACNUR não confirma mortes
Apesar das denúncias de mortes e maus-tratos perpetrados por agentes da Polícia Nacional de Angola, no âmbito da "Operação Transparência", o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR) não confirma essas informações "por falta de dados". Philippa Candler, representante do ACNUR em Angola, diz que os imigrantes estão a sair de Angola pelo próprio pé, mas sob pressão do Governo.
Foto: Omotola Akindipe
Cerca de 35 mil refugiados legais em Angola
Dados do ACNUR indicam que há 35 mil refugiados legais em Angola. Estão, sobretudo, na Lunda Norte, inseridos num assentamento em Lóvua ou distribuídos pelas povoações. No entanto, a ONU denunciou a expulsão de 50 migrantes com estatuto de refugiados. O ACNUR está a verificar a informação. A escalada do conflito tribal no Kasai levou milhares de congoleses a procurar refúgio fora de portas.
Foto: Reuters/G. Paravicini
A pé ou à boleia de motorizadas e bicicletas
Os migrantes congoleses que estão em viagem de regresso ao país de origem escolheram vários meios para fazê-lo. Alguns aceitaram a ajuda do Governo angolano que disponibilizou camiões para transportar os congoleses até à fonteira. Outros preferem fazê-lo pelo próprio pé ou socorrendo-se de bicicletas e motorizadas. Consigo carregam os seus pertences.
Foto: Reuters/G. Paravicini
De regresso às antigas rotinas
Ainda em viagem, mulheres e crianças lavam roupas nas margens do rio junto à localidade de Kamako, na província de Kasai. O objetivo é regressarem às suas povoações outrora ameaçadas ou reiniciarem uma nova vida longe da sua última morada na RDC. No entanto, a situação nesta província congolesa é instável. A falta de infraestruturas está também a preocupar as Nações Unidas.
Foto: Reuters/G. Paravicini
Nova crise humanitária iminente
A ONU expressou preocupação sobre a saída forçada de Angola nas últimas semanas de centenas de milhares de cidadãos. Para as Nações Unidas, as "expulsões em massa" são "contrárias às obrigações" da Carta Africana e, por isso, exortou os Governos em Luanda e em Kinshasa a trabalharem juntos para garantirem um "movimento populacional" seguro e evitarem uma nova crise humanitária.