ONU alerta para aumento de extremismo em Moçambique
Lusa | ms
5 de fevereiro de 2021
A pandemia de Covid-19 fez aumentar a ameaça de grupos extremistas, como o Estado Islâmico e a Al-Qaeda, em zonas de conflito, incluindo Moçambique, Afeganistão, Síria e Iraque, conclui painel de peritos da ONU.
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A ameaça extremista continuou a aumentar nas zonas de conflito na última metade de 2020, porque "a pandemia inibiu as forças da lei e da ordem mais do que os terroristas", que conseguem mover-se livremente, apesar das restrições impostas para combater a Covid-19, explicam os peritos num relatório elaborado para o Conselho de Segurança da ONU e divulgado esta madrugada.
Os grupos extremistas fizeram progressos em África, com a região de Cabo Delgado, em Moçambique, "entre as áreas mais preocupantes", segundo o painel.
Em Cabo Delgado, membros do Estado Islâmico tomaram cidades e aldeias e continuam a manter o Porto de Mocímboa da Praia, apesar de uma ofensiva governamental sustentada, lembram os especialistas no relatório.
Afeganistão é o mais afetado pelo terrorismo no mundo
O Iraque e a Síria continuam a ser "a área central" para o grupo jihadista Estado Islâmico (EI), enquanto a região noroeste da Síria, onde a Al-Qaeda tem grupos afiliados, é "uma fonte de preocupação", dizem os especialistas.
Segundo o painel, o Afeganistão continua a ser "o país "mais afetado pelo terrorismo no mundo". Apesar do acordo entre os Estados Unidos e os Talibã, em 29 de fevereiro do ano passado, e do início de conversações entre estes e o governo afegão, em setembro, a situação no país "continua a ser um desafio", segundo o relatório.
Cabo Delgado: O relato de um sobrevivente do terrorismo
02:18
Mais de 600 civis afegãos e 2.500 membros das forças de segurança no país foram mortos em ataques desde 29 de fevereiro de 2020, segundo o painel, que frisa que "as atividades terroristas e a ideologia radical continuam a ser uma fonte potencial de ameaças para a região e a nível global".
No Iraque e na Síria, de acordo com os peritos, não há indicação de que o EI possa reconstituir o seu autodeclarado "califado", derrotado em 2017, e que chegou a abranger um terço tanto do Iraque como da Síria, mas o grupo extremista "irá certamente explorar a sua capacidade de permanecer numa região caracterizada por perspetivas limitadas de estabilização e reconstrução". O painel estima que 10.000 combatentes do EI permaneçam ativos no Iraque e na Síria.
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Ameaça a longo prazo "em todo o lado"
Segundo o painel, alguns Estados-membros da ONU, não nomeados, consideraram que, à medida que as restrições impostas para combater a pandemia vão sendo levantadas em vários locais, "pode ocorrer uma erupção de ataques pré-planeados".
"O custo económico e político da pandemia, o seu agravamento dos fatores subjacentes ao extremismo violento e o impacto esperado nos esforços antiterrorismo são suscetíveis de aumentar a ameaça a longo prazo em todo o lado", alertaram os peritos.
Na Europa, ataques na Áustria, França, Alemanha e Suíça, entre setembro e novembro do ano passado, "sublinharam a ameaça permanente" de terrorismo, apontou ainda o painel no relatório.
O desterro forçado dos deslocados em Cabo Delgado
São mais de 450 mil no norte de Moçambique. O terrorismo cortou-lhes as raízes e tomou-lhes o chão. Os deslocados internos procuram vingar noutras paragens. E Pemba tem sido lugar de eleição. Sobreviverão na nova terra?
Foto: Privat
A dor da perda e da impotência
Um olhar que diz mais do que mil palavras, a imagem poderia ser "sem legenda". Foi depois de um ataque à aldeia "Criação", Muidumbe, a primeira investida terrorista ao distrito, em novembro de 2019. Os insurgentes começaram os seus ataques em Cabo Delgado em outubro de 2017.
Foto: Privat
Histórias de vida reduzidas a cinzas
Desde então, a matança e destruição passaram a ser visitas assíduas da região. Como ninguém quer ser anfitrião, os aldeões fugiram. Em finais de outubro, Muidumbe e outros distritos sangraram de novo e a população fugiu. Muidumbe está praticamente nas mãos dos terroristas, tal como Mocímboa da Praia, desde agosto.
Foto: Privat
Quase todos os caminhos vão dar a Pemba
O único desejo destes residentes de Mueda é conseguir um canto no camião para chegar à capital provincial de Cabo Delgado. Mas a disputa entre pessoas e os seus próprios pertences ameaça deixar alguém para trás. Desde meados de outubro, Pemba recebeu cerca de 12 mil deslocados. Inicialmente, recebia à volta de mil deslocados por dia.
Foto: Privat
Quando o mato passa a ser melhor que o lar
Para muitos em Cabo Delgado, ter um teto deixou de ser sinónimo de segurança. Conseguir manter a vida, mesmo sem casa, passou agora a ser a meta. Os bichos passaram a ser mais cordiais que os irmãos terroristas, as estrelas melhores que o teto e os arbustos melhores que as paredes. Famílias procuram refúgio nas matas, onde caminham por dias dominados pelo medo, sem comida e sem norte.
Foto: Privat
Um abraço amigo em Pemba
Estes deslocados chegam de Quissanga. Mas também chegam à praia de Paquitequete, Pemba, deslocados vindos de vários lugares. Todos tentam escapar ao terror. Muitos fixam-se aqui, onde recebem apoio de ONGs, associações, indivíduos e do Governo. Há até quem abra as portas da sua casa para os receber, mesmo não os conhecendo.
Foto: Privat
Crise humanitária faz brotar solidariedade infinita
A falta de quase tudo faz despertar solidariedade que chega de todo o lado. Para quem está longe, uma angariação de fundos e bens materiais é a opção. Já cuidar dos deslocados na praia de Paquitequete, atendendo-os nas suas necessidades, é o que faz quem está no terreno. Na praia, há jovens que chegam de madrugada para dar amor a quem precisa.
Foto: Privat
Uma fuga rodeada de perigos
O medo é tanto que nem a sobrelotação parece intimidar os deslocados internos. No começo de novembro, mais de 40 pessoas morreram a tentar chegar a Pemba num naufrágio entre as ilhas do Ibo e Matemo.
Foto: Privat
Pemba a rebentar pelas costuras
O "boom" de deslocados é tão grande que o sistema de serviços básicos para a população, como água e saneamento, está no limite. Antes desta nova vaga de deslocados, a capital de Cabo Delgado tinha 204 mil habitantes. Agora, tem mais de 300 mil.
Foto: DW/E. Silvestre
Começar nova vida noutro chão
O Governo criou um comité de gestão para esta crise humanitária. Afirma que está a criar novas aldeias, centros de reassentamento, infrastruturas e a parcelar terras para acomodar os deslocados. Embora esteja garantida a segurança, as suas raízes estão noutro chão.
Foto: Privat
Que futuro?
Por enquanto não há resposta. Mas há deslocados que se vão "desenrascando" para sobreviver. Muitos dizem que não querem viver de mão estendida. Por exemplo, quem tem barco vai à pesca ou trasporta mercadorias. Outros entretêm-se a jogar futebol. Vão cuidando das suas vidas. Mas para os que não têm alternativas, que são a maioria, correrão riscos de entrar para o mundo do crime?