ONU alerta para repressão e crise humanitária na RDC
mjp | Dirke Köpp | Reuters
20 de março de 2018
É uma denúncia das Nações Unidas: o "uso ilegal, injustificado e desproporcionado" da força por parte da polícia em manifestações da oposição na República Democrática do Congo fez quase 50 mortos no espaço de um ano.
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Os protestos contra o Presidente Joseph Kabila estão a aumentar. O seu mandato terminou em 2016, mas as eleições têm sido repetidamente adiadas. Agora, estão agendadas para dezembro de 2018. Mas os congoleses não estão satisfeitos. Em fevereiro, os protestos anti-Governo terminaram com mortos e feridos epois da intervenção da polícia.
O relatório conjunto do ACNUR e da missão da ONU na RDC, a MONUSCO, divulgado esta segunda-feira (19.03), revela ainda que as autoridades congolesas têm tentado "encobrir" as "muito graves violações dos direitos humanos", ao tentarem desfazer-se dos corpos e obstruir o trabalho dos observadores nacionais e internacionais.
O conflito continua a agravar a crise humanitária na RDC, afirma o secretário-geral adjunto para os Assuntos Humanitários da ONU. Segundo Mark Lowcoc, "as necessidades humanitárias duplicaram no ano passado: 13 milhões de pessoas precisam de ajuda humanitária e mais de 4,6 milhões de crianças estão gravemente subnutridas."
ONU alerta para repressão e crise humanitária na RDC
Além disso, as epidemias multiplicam-se, incluindo o pior surto de cólera dos últimos 15 anos. "E há também uma epidemia de violência sexual, pouco documentada, visando muitas vezes crianças", destacou ainda Mark Lowcock, que falava segunda-feira (19.03) perante o Conselho de Segurança da ONU.
O secretário-geral adjunto para os Assuntos Humanitários pediu mais apoio financeiro, numa altura em que são precisos 1,7 mil milhões de dólares para responder à crise humanitária no país. No ano passado, registaram-se 2 milhões e 200 mil deslocados internos na RDC, quase duplicando o total para 4 milhões e meio de pessoas.
"Governo não é inocente"
Gesine Ames, coordenadora da Rede Ecuménica da África Central, uma associação de organizações religiosas alemãs que trabalha em conjunto com igrejas e grupos da sociedade civil, aponta o dedo ao Governo de Kinshasa, especialmente pelos problemas no leste do país, palco de confrontos violentos entre diferentes grupos étnicos, rebeldes e tropas governamentais.
"O Governo não é certamente inocente na desestabilização da região", afirma Gesine Ames em entrevista à DW África. "O vazio de segurança existe há muitos anos e o Governo sabe disso. Mas há falta de vontade por parte do Exército e das autoridades de segurança para abordar a questão. O Governo é o responsável e não assume", critica.
Refugiados da RDC procuram abrigo em Angola
01:28
A Igreja Católica destaca-se na oposição ao Governo: tem sido a principal organizadora de protestos pacíficos contra Kabila. Mas bispos e outros membros da Igreja que vieram a público mostrar o seu descontentamento têm sido alvo de intimidações. Ainda assim, as manifestações não deverão parar.
"A Igreja e outras organizações vão continuar no seu caminho. Apesar da repressão sangrenta dos protestos em janeiro, houve novas manifestações em fevereiro. E não serão as últimas", acredita a coordenadora da Rede Ecuménica da África Central. "Mas é cada vez mais difícil, porque os organizadores têm sido ameaçados e obrigados a esconder-se. As igrejas [católica, protestante] e as comunidades muçulmanas podem unir-se contra o Governo. E isso assusta-o", explica.
Com as presidenciais marcadas para o fim do ano, o Presidente Joseph Kabila ainda não anunciou se vai ou não candidatar-se a um terceiro mandato - proibido pela Constituição. países da sub-região da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC), como Angola e o Botsuana, aumentam a pressão sobre Kinshasa para a realização de eleições livres, democráticas e transparentes, na data prevista, sem a participação do chefe de Estado.
RDC: Os deslocados de Kalemie
Mais de 200 mil deslocados internos vivem em 17 campos de refugiados improvisados nas imediações de Kalemie, no leste da República Democrática do Congo. As condições são difíceis, mas melhores do que em casa.
Foto: Lena Mucha
À noite num campo de deslocados internos
Duas crianças correm ao anoitecer no campo de deslocados internos de Kalenge. Milhares de pessoas foram forçadas a fugir de suas casas depois que o conflito começou na província de Tanganyika, no leste da RDC. Agora, muitas vivem em campos na cidade de Kalemie e seus arredores. Entre os deslocados estão muitas crianças, que foram separadas dos seus pais.
Foto: Lena Mucha
Casas inflamáveis
As pessoas no campo de refugiados de Kalenge vivem em cabanas de palha. Focos de incêndio espalham-se frequentemente de casa para casa. A situação é semelhante noutros campos de deslocados da região. Só em junho, houve incêndios nos campos de Moni, Lukwangulo, Kabubili, Kateke e Katanyika. Em agosto, metade do campo de Kakinga pegou fogo, resultando na morte de uma criança.
Foto: Lena Mucha
A escola torna-se um abrigo de emergência
Estas crianças estão na Escola Primária Circle Filtsaf em Kalemie, mas não estão aqui para aprender. Elas vivem na escola desde que foram expulsas de Tabacongo, no início de maio. Algumas delas sofrem de doenças e desnutrição.
Foto: Lena Mucha
Bactéria no sangue
Funcionários da ONG Médicos Sem Fronteiras fazem testes de diagnóstico de malária nesta clínica improvisada. Estima-se que até 80% das pessoas no campo de refugiados de Kalunga sejam portadoras da bactéria da malária. Os médicos também cuidam de crianças malnutridas e que sofrem de sarampo.
Foto: Lena Mucha
Fuga em família
"Os nossos filhos e idosos estão a morrer", disse Kisompo Selemani (na foto, o segundo da esquerda). O chefe do povo Twa vive desde novembro com a sua esposa e quatro filhos em Kilunga. A família teve que deixar a sua aldeia quando foi atacada por outra fação Twa. "O Governo tem que fazer algo para que possamos retornar às nossas aldeias", disse o homem de 64 anos.
Foto: Lena Mucha
Sem educação
Nos campos de deslocados internos não há escola ou qualquer outra atividade para as crianças.
Foto: Lena Mucha
Ganhar a vida
Uma mulher vende cigarros, lanternas e mandioca com os seus filhos no campo de refugiados de Kilunga. Muitos deslocados fazem apenas uma refeição por dia, geralmente farinha de mandioca e folhas.
Foto: Lena Mucha
À procura de água limpa
Enquanto as crianças em Mukuku jogam futebol, as mulheres carregam vasilhas de água. A falta de água limpa aumenta o risco de doenças contagiosas como a cólera, que é transmitida através da água contaminada.
Foto: Lena Mucha
À procura de trabalho
A segurança na região ainda é volátil. Muitos deslocados estão à procura de um lugar seguro em Kalimie e arredores. Para ganhar algum dinheiro, eles trabalham no campo das aldeias vizinhas ou recolhem lenha para vender.
Foto: Lena Mucha
Abrigo temporário ou um novo começo?
A vida no campo de refugiados não é fácil. No entanto, para muitos deslocados, é bem melhor do que antes. A maioria dos deslocados testemunhou graves violências antes de fugir. Segundo os Médicos Sem Fronteiras, há uma grande necessidade de cuidados psicológicos.
Foto: Lena Mucha
Mosquitos, uma ameaça mortal
No campo de Kalonda, Kabeja Kanusiki, de 69 anos, cuida dos seus netos doentes. A rede mosquiteira ao fundo serve para protegê-los da malária, que pode ser particularmente grave para as crianças. No total, pelo menos 210 mil deslocados vivem em 17 campos de refugiados improvisados nas imediações da cidade de Kalemie, no leste congolês.