ONU discute medidas contra militares na Guiné-Bissau
7 de maio de 2012 A sugestão foi feita numa reunião do Conselho de Segurança das Nações Unidas que analisou o relatório do secretário-geral Ban Ki-moon, a cerca da situação na Guiné-Bissau.
"Apelo ao Conselho de Segurança para que adote sanções contra os militares e civis envolvidos no golpe e reitero o [apelo ao] estabelecimento de um mandato das Nações Unidas, com uma força de estabilização para a Guiné-Bissau, com tropas da CEDEAO, CPLP [Comunidade dos Países de Língua Portuguesa] e União Africana", discursou Mutaboba.
A CEDEAO, Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental, representada também na reunião do Conselho de Segurança, acredita que estão a ser feitos progressos e que uma solução será em breve encontrada. "A ordem constitucional anterior ao golpe de Estado não pode ser restaurada imediatamente como o PAIGC [maior partido da Guiné-Bissau] exige para que seja evitada uma guerra civil no país", afirmou Salamatu Hussaini Suleiman, da CEDEAO.
"Nem a CEDEAO nem outra autoridade internacional aceitaram as propostas dos golpistas de concessão de um período de transição de dois anos, porque isso seria o equivalente a perpetrar o poder [dos militares]", continuou.
A CEDEAO manifestou ainda que para cumprir os seus propósitos "precisaria de apoio financeiro, técnico e logístico".
Djaló Pires acusa CEDEAO de apoiar golpes
No entanto, contestando a posição dos países ocidentais africanos, o ministro dos Negócios Estrangeiros guineense, Djaló Pires, também presente no encontro, acusou aquela organização sub-regional de ir contra a vontade da comunidade internacional e de apoiar golpes de Estado ao invés de os contestar.
Por seu turno, o angolano Georges Chikoti, defendeu em nome da CPLP uma "força de estabilização" multinacional para a Guiné-Bissau, com mandato do Conselho de Segurança da ONU e com a participação de efetivos da organização lusófona.
Na sua intervenção no Conselho de Segurança da ONU, Chikoti, ministro das Relações Exteriores de Angola, que detém a presidência rotativa da Comunidade dos Países de Língua portuguesa (CPLP), afirmou que a organização lusófona e os seus estados-membros estão "prontos para dar uma contribuição efetiva" para o envio da força multinacional.
Guineenses pagam a conta
Enquanto tarda o retorno à normalidade, na opinião de Joseph Mutaboba, da ONU, os cidadãos guineenses estão a pagar a fatura: "O contínuo atraso no retorno à normalidade na Guiné-Bissau está a ter um impacto negativo nos cidadãos inocentes do país que querem uma resolução rápida desta crise. Nesse sentido, este Conselho deve considerar a aplicação de medidas mais apertadas contra aqueles que continuam a impedir o retorno à ordem no país", reforçou o representante da ONU.
Também Djaló Pires, chefe da diplomacia guineense, disse que os militares autores do golpe de Estado estão a cometer atrocidades no país, tanto na capital como no interior. Segundo o diplomata, muitos veículos de instituições públicas têm sido roubados e personalidades ligadas ao governo central e local do país estão refugiados em embaixadas e outras missões diplomáticas com medo de represálias.
Segundo a DW África pôde apurar no terreno na Guiné-Bissau, o sofrimento da população aumenta a cada dia. Nos últimos dias, as pessoas de boa vontade levaram combustível a central eléctrica de Bissau para garantir no mínimo o fornecimento de água e luz na capital pela noite, o que melhorou bastante.
Reações do Comando Militar a sanções da UE
Já na Guiné-Bissau, o Comando Militar que detém atualmente o poder no país considerou "normais" as sanções da União Europeia contra a cúpula militar guineense. O país continua num impasse, apesar das reações internacionais negativas ao golpe de Estado.
Na Guiné-Bissau, não há entendimento na busca de um consenso para a situação pós-golpe de Estado, que aconteceu a 12.04. O consenso não existe nem no plano nacional, nem internacional. Apesar de algum esforço e uma série de reuniões já realizadas tanto em Bissau, como no estrangeiro, quase pouco ou nada foi feito na prática para desbloquear a situação complexa.
Em Bissau, o PAIGC – liderado por Carlos Gomes Júnior, primeiro-ministro deposto –, e o Comando Militar – que controla o Estado da Guiné-Bissau desde o golpe –, não falam a mesma língua para a saída da crise.
No exterior, as comunidades da África Ocidental e dos Países da Língua Portuguesa, também parecem não se entender. Fernando Mendonça, secretário para informação do PAIGC, disse à DW África em Bissau que o partido no poder até o golpe depositava todas as suas esperanças na reunião da ONU: "Toda a gente sabe que as Nações Unidas condenaram o golpe, exigiram o retorno à normalidade constitucional e exigiram a conclusão do processo eleitoral. Mas, também, na altura, foi levantada a questão da necessidade do envio de uma força de estabilização para a Guiné-Bissau. Esperamos que haja uma reafirmação neste sentido".
Sanções de fora
A CEDEAO defendeu na quinta-feira (03.05) como solução para a crise na Guiné-Bissau que seja encontrado um presidente interino através do Parlamento e que haja um período de transição de um ano. O responsável da comunicação do PAIGC, Fernando Mendonça, recordou à CEDEAO que a Constituição da Guiné-Bissau não prevê a nomeação do primeiro-ministro por via consensual.
De dúvidas a certeza, a União Européia decidiu avançar com sanções contra militares que protagonizaram o golpe, entre outras medidas, proíbem os seis oficiais de entrar ou transitar por território da Europa comunitária e congelamento dos seus bens. A resposta do Comanndo Militar, pela voz de Daba Na Walna, foi: "Compreendo que a UE tenha razão de decidir da forma como decidir. Eu, no lugar da União Européia, teria feito a mesma coisa. Mas também não tenho dúvida de que os que são da UE, se fossem cidadãos guineenses e militares como eu, vivendo a realidade que nós vivemos, se calhar não resistiriam também à tentação de fazer o que eu fiz".
Daba Na Walna, disse que está a ser mal visto pela sociedade guineense por fazer parte do golpe. Ele disse que até para o dono da casa onde morava, teve que devolver as chaves e sair. Na Faculdade de Direito [de Bissau] disseram-lhe que não podia lecionar mais. Mesmo assim, não está arrependido que fez: "Arrependido eu não diria. Mas também digo que não sinto-me herói nem tenho orgulho daquilo que aconteceu".
Autores: Glória Sousa (Bonn)/Braima Darame (Bissau)
Edição: Renate Krieger