ONU alerta para “maior crise humanitária desde 1945”
Lusa | EFE | AP | mjp
11 de março de 2017
Alerta foi lançado pelo coordenador dos serviços humanitários das Nações Unidas, Stephen O'Brien, numa altura em que mais de 20 milhões de pessoas correm risco de fome em quatro países.
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O mundo vive atualmente a maior crise humanitária desde 1945. O alerta foi lançado esta sexta-feira (10.03) pelo coordenador dos serviços humanitários das Nações Unidas. "Estamos num momento crítico da história. Já no início do ano, enfrentamos a maior crise humanitária desde a criação das Nações Unidas", disse ao Conselho de Segurança Stephen O'Brien.
A situação agrava-se com a possível crise de fome em quatro países - Sudão do Sul, Somália, Iémen e Nigéria. Já em fevereiro, a ONU avisou que 20 milhões de pessoas já estão numa situação crítica ou correm risco de fome nos próximos seis meses.
"Sem esforços globais coletivos e coordenados, as pessoas simplesmente vão morrer de fome" e "muitos mais vão sofrer e morrer de doenças", afirmou O'Brien, que transmitiu informações ao Conselho de Segurança sobre as suas recentes visitas ao Iémen, ao Sudão do Sul e à Somália para avaliar a situação humanitária.
O responsável humanitário das Nações Unidas pediu uma injeção imediata de fundos para enfrentar a situação nos três países e no nordeste da Nigéria. "Para ser exato, precisamos de 4,4 mil milhões de dólares até julho”, afirmou O'Brien, frisando que o valor não é negociável. Para além de fundos, o coordenador dos serviços humanitários da ONU pede que as organizações tenham "acesso seguro e sem obstáculos” aos locais que precisam de ajuda humanitária.
Milhões de pessoas em risco
Segundo Stephen O'Brien, a maior crise humanitária está no Iémen, onde dois terços da população (18,8 milhões de pessoas) precisa de ajuda e mais de sete milhões não sabem de onde virá a próxima refeição. O conflito no país já fez mais de 7 mil e 400 vítimas mortais e deixou cerca de 40 mil feridos desde março de 2015.
Ainda de acordo com o responsável da ONU, na Somália, mais de metade da população – 6,2 milhões de pessoas – precisa de ajuda, incluindo 2,9 milhões que correm risco de fome e necessitam de apoio imediato "para sobreviver”. Cerca de um milhão de crianças com menos de 5 anos vão sofrer de malnutrição crónica até ao final do ano no país, frisou O'Brien.
Já no Sudão do Sul, a braços com uma guerra civil há três anos, a situação "é pior do que nunca”, afirmou o responsável da ONU, que responsabiliza as partes envolvidas no conflito pela fome que assola o país. Mais de 7,5 milhões de pessoas precisam de ajuda humanitária.
No nordeste da Nigéria, o número chega quase aos 11 milhões, incluindo mais de 7 milhões de pessoas que atravessam uma situação de "insegurança alimentar severa”. A insurgência do Boko Haram, aliada aos problemas governamentais e às alterações climáticas deram origem a uma grave crise na região. O conflito já matou mais de 20 mil pessoas e forçou 2,6 milhões a abandonarem as suas casas.
Sudão do Sul: caos no país mais jovem do mundo
Por mais de um mês, o ex-vice-presidente Riek Machar luta com seu exército rebelde contra o Governo do Presidente Salva Kiir. Uma guerra que tem tomado contornos étnicos e já custou cerca de 10 mil vidas, segundo a ONU.
Foto: DW/J.-P.Scholz/A.Kriesch
Cidade destruída
Por mais de um mês, o ex-vice-presidente Riek Machar luta com seu exército rebelde contra o Governo do Presidente Salva Kiir. Uma guerra que tem tomado contornos étnicos e já custou cerca de 10 mil vidas, segundo a ONU. Muitos lugares foram completamente queimados. Tudo o que os habitantes da cidade de Bentiu ainda têm cabe num saco plástico.
Foto: DW/J.-P.Scholz/A.Kriesch
Soldados versus antigos companheiros
O Exército Popular de Libertação do Sudão (sigla em inglês, SPLA) pôde reconquistar cidades importantes dos rebeldes. Os soldados muitas vezes lutaram contra seus antigos camaradas. Em meados de dezembro, uma parte do exército voltou-se contra o Governo do Presidente Salva Kiir para seguir o líder dos rebeldes, o ex-vice-presidente Machar.
Foto: DW/J.-P.Scholz/A.Kriesch
De inimigos a aliados
Para vencer a luta contra os rebeldes, o Governo também se aliou a líderes de controversas milícias – como David Yau Yau, cujo exército lutou durante anos contra o Estado. Até há alguns meses, o Governo queria processar Yau Yau por crimes de guerra. Também crianças lutam no exército dele. Isso se deveria "à natureza dos conflitos no Sudão do Sul," disse Yau Yau.
Foto: DW/J.-P.Scholz/A.Kriesch
O reduto rebelde
Junto com seus aliados, as tropas do Governo querem reconquistar Malakal - a maior cidade nas mãos dos rebeldes. "As tropas de Riek Machar levam os jovens ao equívoco e recrutam meninos de 16 anos de idade", diz Simon Kun Puoch, o governador do estado do Alto Nilo. Ele teme que o conflito faça retroceder em vários anos o desenvolvimento do país.
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A violência como o único meio?
Peter Adwok Nyaba perdeu uma perna na Guerra da Independência. Desde que o Presidente Kiir dissolveu o gabinete, em julho de 2013, o ex-ministro se solidariza com os insurgentes. "No Sudão do Sul, o exército é considerado o único meio para implementar as metas," disse o político Nyaba. "Também o Presidente acredita poder resolver o conflito entre ele e seus colegas apenas por meios militares."
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Solução política para o conflito
"Sabemos que a solução para o conflito não é militar", disse o porta-voz do exército Philip Aguer. O Sudão do Sul está numa crise política que também deveria ser resolvida politicamente. "É triste que alguns políticos tentam dividir o exército e o povo sul-sudanês para alcançar seus objetivos."
Foto: DW/J.-P.Scholz/A.Kriesch
Uma nação dividida
Ambos os lados negociam sem sucesso há várias semanas. Enquanto isso, o conflito tornou-se cada vez mais étnico - também no exército. Akot Arech, um enviado do Presidente, visita um quartel em que 200 soldados de diferentes grupos étnicos assassinaram uns aos outros. "Isso é inconcebível", diz o político visivelmente chocado. "Como vamos reconstruir o nosso país?"
Foto: DW/J.-P.Scholz/A.Kriesch
Em fuga
Mesmo nos campos de refugiados das Nações Unidas, os vários grupos étnicos são alojados separadamente. Especialmente entre os Dinka, o grupo étnico do Presidente, e os Nuer, ao qual pertence também o líder rebelde Machar, houve repetidos confrontos. Após ataques direcionados na capital Juba, 20.000 Nuer fugiram para o acampamento Tonping da ONU, há semanas irremediavelmente superlotado.
Foto: DW/J.-P.Scholz/A.Kriesch
O medo de novos ataques
Há meses, o professor Isaac Maet vive com sua esposa no acampamento de refugiados. Ele tem medo de novos ataques e pouca esperança de que possa, em breve, voltar a trabalhar como professor. "Se fosse apenas um conflito político, com certeza haveria uma solução", diz Maet. "Mas agora é um conflito étnico que, certamente, não será resolvido tão rapidamente."