Reações ao ataque do centro para migrantes na Líbia
AP | rvp
4 de julho de 2019
Neste ataque ao Centro de Detenção de Refugiados de Tajoura, na Líbia, morreram 53 pessoas e outras 130 ficaram feridas. Ainda não se sabe quem são os responsáveis. ONU pede "investigação independente" sobre ataque.
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Na passada noite de terça-feira (02.06.) o Centro de Detenção de Refugiados de Tajoura na cidade de Trípoli na Líbia foi atingido por dois ataques aéreos. 53 pessoas morreram e outras 130 ficaram feridas.
As principais entidades das Nações Unidas já reagiram contra este "raid" e na Líbia especula-se quem possa estar por trás deste ataque. O ataque deixou revoltado o Secretário-Geral das Nações Unidas, António Guterres, que reagiu a esta tragédia através do seu porta-voz, Stéphane Dujarric. Este, deixou a garantia de uma investigação independente por forma responsabilizar os autores do mesmo.
"O Secretário-Geral está indignado com os relatos de que pelo menos 44 migrantes e refugiados, incluindo mulheres e crianças, foram mortos e mais de 130 feridos após ataques aéreos no centro de detenção de migrantes Tajoura, a leste de Trípoli. Condena veementemente este horrendo incidente e apresenta as suas mais profundas condolências às famílias das vítimas e deseja uma rápida recuperação dos feridos. O Secretário-Geral apela a uma investigação independente das circunstâncias deste incidente, a fim de garantir que os seus autores sejam levados a tribunal. É importante notar que as Nações Unidas forneceram às partes coordenadas exactas do centro de detenção".
O Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR) também já reagiu através do seu chefe de missão para a Líbia, Jean Pierre Cavalieri. Além de condenar os ataques o ACNUR quer que os refugiados em perigo saiam da Líbia em segurança.
"Em primeiro lugar, o ACNUR condena este ataque aéreo contra um alvo civil, onde os refugiados são mantidos. O ACNUR também acredita que os refugiados não devem ser detidos em primeiro lugar e nós defendemos contra o retorno de refugiados e migrantes que fizeram essa viagem no mar de volta à Líbia porque não é realmente um porto seguro para desembarque de refugiados e migrantes. Finalmente, o ACNUR, dadas as circunstâncias, está mais uma vez a pedir à comunidade internacional a abertura de corredores humanitários para garantir que todos os refugiados que estejam em perigo possam ser colocados em segurança e retirados da Líbia".
Ataque a refugiados na Líbia
Milícias acusadas
O autoproclamado Exército Nacional Líbio através do seu porta-voz, o General Khaled Elmahjob, negou qualquer tipo de responsabilidade neste ataque e acusa as milícias locais.
"Eles não se importam com a violação dos direitos humanos. São grupos não controlados. Não seguem as regras humanitárias. Dói-nos e é muito doloroso para nós que eles (migrantes) tenham sido usados para este fim, porque no final são seres humanos que devem ter os seus direitos respeitados, de acordo com as regras legais e humanitárias conhecidas no mundo".
O atual conflito em Trípoli já forçou 100 mil líbios a fugir das suas casas. O ACNUR diz que há 3300 migrantes e refugiados detidos à volta de Trípoli em condições consideradas miseráveis.
Devolver migrantes
A ONU e as respetivas agências, bem como várias organizações humanitárias, manifestam frequentemente a sua oposição à prática de devolver migrantes resgatados em mar à Líbia, país imerso num caos político e securitário desde a queda do regime de Muammar Kadhafi em 2011 que tem sido um terreno fértil para as redes de tráfico ilegal de migrantes e situações de sequestro, tortura e violações.
A situação tornou-se ainda mais crítica desde o início da ofensiva militar das forças do marechal Khalifa Haftar, o homem forte do leste da Líbia que avançou em abril contra Tripoli, a sede do governo de acordo nacional líbio estabelecido em 2015 e reconhecido pela ONU.
O genocídio no Ruanda
O genocídio no Ruanda, 25 anos atrás, em 1994, chocou o mundo. Na época, a comunidade internacional assistiu de braços cruzados – sobretudo a França e a ONU – ao assassinato de cerca de 800 mil pessoas.
Foto: picture-alliance/dpa
O pontapé do genocídio
No dia 6 de abril de 1994, o avião em que viajava o então Presidente de Ruanda, Juvénal Habyarimana, foi derrubado por um foguete quando se aproximava da capital Kigali. O atentado matou Habyarimana, o Presidente do Burundi e outros oito ocupantes da aeronave. No dia seguinte, começam os massacres, que duraram três meses e custaram a vida de pelo menos 800 mil ruandeses.
Foto: AP
Vítimas escolhidas a dedo
Depois do assassinato do Presidente, extremistas hutus começaram a atacar membros da minoria tutsi e hutus moderados. Os assassinos estavam bem preparados e escolhiam suas vítimas entre ativistas de direitos humanos, jornalistas e políticos. Entre as primeiras vítimas, no dia 7 de abril de 1994, estava a primeira-ministra Agathe Uwilingiyimana.
Foto: picture-alliance/dpa
Resgate de estrangeiros
Enquanto nos dias posteriores milhares de ruandeses eram mortos diariamente em Kigali e no interior, forças especiais belgas e francesas retiraram do país cerca de 3.500 estrangeiros. Paraquedistas belgas resgataram em 13 de abril os sete funcionários alemães da Deutsche Welle em Kigali, juntamente com suas famílias. Apenas 80 dos 120 empregados locais da emissora sobreviveram ao genocídio.
Foto: P.Guyot/AFP/GettyImages
Grito de socorro
Já no início de 1994, o comandante das tropas de paz da ONU, o canadense Roméo Dallaire, tinha indícios de um planejado extermínio da população tutsi. Sua mensagem à ONU, conhecida como o "fax do genocídio", enviada em 11 de janeiro, foi rejeitada. Os apelos posteriores do general durante o genocídio também foram ignorados pelo então chefe das operações de manutenção da paz, Kofi Annan.
Foto: A.Joe/AFP/GettyImages
Mídias do ódio
O filme "Hate Radio", do diretor suíço Milo Rau (foto), lembra a estação Radio Mille Collines (RTLM) que, junto ao jornal semanal "Kangura", incitava o ódio contra os tutsis. Kangura, por exemplo, publicou já em 1990 os "Dez mandamentos hutus", com alto teor racista. A Mille Collines, popular pela música pop e pela cobertura desportiva, fazia chamadas diárias pela perseguição e morte de tutsis.
Foto: IIPM/Daniel Seiffert
Refúgio no hotel
Em Kigali, Paul Rusesabagina escondeu mais de mil pessoas no Hotel des Mille Collines. Depois que o gerente belga deixou o país, Rusesabagina o sucedeu no cargo. Com muito álcool e dinheiro, ele conseguiu impedir as milícias hutus de matar os refugiados. Em muitos outros refúgios, as vítimas não conseguiram escapar de seus assassinos.
Foto: Gianluigi Guercia/AFP/GettyImages
Massacres em igrejas
Mesmo igrejas, onde muitos buscaram refúgio, não foram respeitadas. Cerca de 4 mil homens, mulheres e crianças foram mortos na igreja de Ntarama, perto de Kigali, por assassinos portando machados e facões. Hoje, a igreja é um dos muitos memoriais do massacre. Crânios e ossos humanos, além de buracos de bala nas paredes, lembram até hoje o genocídio.
Foto: epd
O papel da França
Paris manteve laços estreitos com o regime hutu. Quando os rebeldes da Frente Patriótica Ruandesa (FPR) já tinham ganhado terreno sobre os autores de genocídio, em junho, o Exército francês entrou em ação. E permitiu que soldados e milicianos responsáveis pelo genocídio fossem com armas para o Zaire, atual República Democrática do Congo, onde representam até hoje uma ameaça para o Ruanda.
Foto: P.Guyot/AFP/GettyImages
Fluxo de refugiados
Durante os massacres, milhões de ruandeses, tutsis e hutus, fugiram para os países vizinhos Tanzânia, Zaire e Uganda. Só no Zaire (hoje RDC), foram dois milhões de refugiados. Ex-membros do Exército e os autores de massacres fundaram as Forças Democráticas pela Libertação de Ruanda, que são até hoje um fator de insegurança no leste congolês.
Foto: picture-alliance/dpa
Tomada de Kigali
Diante da Igreja da Sagrada Família, em Kigali, patrulham em 4 de julho de 1994 rebeldes da RPF. Nessa época, eles já haviam libertado a maioria das regiões do país e forçado os assassinos a baterem em retirada. Ativistas de direitos humanos se queixam, no entanto, que os rebeldes também cometeram crimes pelos quais ninguém foi responsabilizado até hoje.
Foto: Alexander Joe/AFP/GettyImages
Fim do genocídio
O general Paul Kagame, líder da RPF, declarou em 18 de julho de 1994 o fim da guerra contra as forças do Governo. Os rebeldes assumiram o controlo da capital e outras grandes cidades. A princípio, empossaram um Governo provisório. Desde o ano 2000, Kagame é o Presidente do Ruanda.
Foto: Alexander Joe/AFP/GettyImages
Cicatrizes permanentes
O genocídio durou quase três meses. A maioria das vítimas foi brutalmente assassinada com facões. Vizinhos mataram vizinhos. Cadáveres e partes de corpos de bebés, crianças, adultos e idosos se amontoavam ao longo das ruas. Poucas famílias foram poupadas. Não só as cicatrizes nos corpos dos sobreviventes mantêm viva a memória do genocídio.