Mais de 7 mil tropas das Nações Unidas deverão abandonar o país nos próximos meses. A medida insere-se na nova estratégia da ONU para reduzir o número de capacetes azuis na República Democrática do Congo (RDC).
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No leste do país, a "região de Kivu Norte é uma área onde temos um grupo extremamente importante de soldados da ONU. Vamos proceder ao encerramento de algumas bases: duas em Walikale, duas em Masisi e uma em Lubero. Isto, porque temos a obrigação de implementar as instruções do Conselho de Segurança”, explicou Bernard Commins, comandante adjunto das forças da Organização das Nações Unidas (ONU) na República Democrática do Congo (RDC), MONUSCO.
A maior parte dos 16 mil soldados da ONU está no leste do país, palco de conflitos há mais de duas décadas. Na província de Kivu Norte, as tropas das Nações Unidas escoltam os populares nas idas ao mercado e oferecem abrigo àqueles que fogem dos confrontos entre grupos armados e o exército congolês.
21.07 Actualidade: MONUSCO encerra bases na RDC - MP3-Mono
"O encerramento das bases militares é uma decisão importante que não podemos evitar”, acrescentou o comandante adjunto da MONUSCO.
No entanto, há "uma nova estratégia operacional para garantir que a ausência permanente dos soldados da ONU nestas bases não significa um vazio de segurança”, salvaguardou Bernard Commins.
Também Fabienne Pompey, porta-voz da MONUSCO, garantiu que os capacetes azuis vão continuar na região. "Ainda temos bases em Kivu Norte, ainda estamos presentes. Isto é uma mudança no modo de operações. Nesta área onde vão ser encerradas as bases permanentes estará uma missão temporária, com patrulhas mais longas e monitorização com helicópteros. Vamos ser mais rápidos, mais flexíveis, mais móveis”, assegurou Fabienne Pompey.
População teme aumento da violência
Ainda assim, a notícia do encerramento das bases não foi recebida com agrado pela população. Muitas pessoas temem que os grupos armados voltem a controlar as suas aldeias.
"Em princípio, cabe às nossas Forças Armadas e à polícia garantir a segurança do país, mas, uma vez que ainda não fizemos a reforma completa das forças de segurança, ainda precisamos do apoio da comunidade internacional”, entende Munubo Mubi Juvenal, deputado e membro da Comissão Parlamentar de Defesa.
"É verdade que os Estados Unidos pediram às Nações Unidas para reduzir o financiamento da missão de paz em 7%. Mas tendo em conta que a MONUSCO continua a ser a maior missão da ONU no mundo, acho que não deveriam ser encerradas as bases militares nestas áreas”, defendeu Munubo Mubi Juvenal.
Todavia, o comandante da MONUSCO afirma que as Nações Unidas vão abrir novas bases nas províncias e Kasai e Kasai Central, onde o mais recente conflito já forçou milhares de pessoas a abandonar as suas casas. Mais de 30 mil congoleses refugiaram-se em Angola.
Violência mata nacionais e estrangeiros
Em março, dois funcionários da ONU foram mortos na região. Os corpos do norte-americano Michael Sharp e da sueca Zaida Catalan foram encontrados duas semanas depois de os dois especialistas terem sido dados como desaparecidos.
Um relatório da ONU divulgado esta semana deixa em aberto a possibilidade de as forças armadas da RDC ou milícias armadas estarem por trás da morte dos dois funcionários das Nações Unidas.
No documento, a ONU revela ainda que foram encontradas várias valas comuns na província de Kasai.
Angola: Congoleses denunciam horrores vividos
A província da Lunda Norte, em Angola, está a acolher diariamente centenas de congoleses que continuam a fugir à violência na região do Kasai, na República Democrática do Congo.
Foto: DW/N. Sul d'Angloa
Mais de um milhão de deslocados
Estima-se que, pelo menos, 3.300 pessoas tenham já morrido na sequência do conflito que, desde agosto de 2016, se tem desenrolado nas região do Kasai e Kasai Central, na República Democrática do Congo, (RDC). 1,3 milhões de congoleses foram obrigados a fugir da região devido à violência da milícia Kamuina Nsapu.
Foto: DW/N. Sul d'Angola
Millhares no Campo de Kakanda
Germaine Alomba tem 29 anos e é uma das congolesas que conseguiu atravessar a fronteira rumo a Angola, estando abrigada, atualmente, no centro provisório de Kakanda. Como ela, cerca de 30 mil congoleses estão refugiados em Angola. A este campo chegam, todos os dias, cerca de 500 pessoas, muitas delas transportadas em camiões e autocarros cedidos pela Organização das Nações Unidas (ONU).
Foto: DW/N. Sul d'Angloa
Acusações a Kabila
Segundo as autoridades católicas no Congo, já foram encontradas mais de 40 valas comuns na região do Kasai. Congoleses em Angola ouvidos pela DW África, revelam que a violência contínua tem sido alimentada pelo Governo de Kabila. "[Ele] está a organizar uma guerra, está a entregar armas aos civis para matar a população. O sofrimento neste momento é muito", denuncia Jimba Kuna, um dos refugiados.
Foto: DW/N. Sul d'Angola
Familiares desaparecidos
Odia Rose é outra das vítimas deste conflito. A sua filha adolescente, de 15 anos, desapareceu quando ambas tentavam fugir à violência no seu país. Hoje, conta à DW, "reza todos os dias para a reencontrar com vida".
Foto: DW/N. Sul d'Angloa
Repetem-se as atrocidades
Mbumba-Ntumba é o espelho das atrocidades que sucedem na região do Kasai. "Estava em minha casa e um grupo de pessoas entrou e começou a bater-me. Cortaram o meu braço com uma catana e bateram-me na cabeça", contou em entrevista à DW África o congolês de 65 anos. Ntumba foi resgatado inconsciente por voluntários da Cruz Vermelha que o levaram até à fronteira com Angola.
Foto: DW/N. Sul d'Angloa
Violência sem fim
As atrocidades não ficam por aqui. Recentemente, o Conselho de Direitos Humanos da ONU voltou a enviar peritos para a região para investigar as denúncias de abusos, incluindo decapitações. Há relatos de refugiados que contam que foram forçados a enterrar vítimas em valas comuns e que afirmam que as milícias terão atacado e mutilado bebés e crianças.
Foto: DW/N. Sul d'Angloa
Crianças sozinhas
Dados da Agência das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR) indicam que mais da metade dos deslocados são menores e que, em muitas ocasiões, foram separados dos seus pais e familiares - como é o caso das quatro crianças na fotografia, atualmente refugiadas no Campo em Kakanda, Angola.
Foto: DW/N. Sul d'Angloa
Aulas de Língua Portuguesa
Tanto no Campo de Mussunga, onde se encontram alguns refugiados, como em Kakanda, onde está a maioria, foram criadas escolas improvisadas onde é ensinada às crianças a língua portuguesa.
Foto: DW/N. Sul d'Angloa
Necessária mais ajuda
Em Angola, os centros de acolhimento improvisados estão já sobrelotados. Em entrevista à DW África, o bispo da diocese da Lunda Norte, Estanislau Chindecasse, explicou que é necessária “mais ajuda para que as pessoas possam ter, pelo menos, duas ou três refeições. O que estamos a fazer é o mínimo, porque não há outras possibilidades”, deu conta.