Empresário diz que, para a indústria do caju crescer na Guiné-Bissau, é preciso que haja incentivos do Governo.
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O caju é um produto estratégico para a economia da Guiné-Bissau devido à elevada procura no mercado externo. Em 2016, o país exportará cerca de 200 mil toneladas de castanha, o que representará 7,3 por cento da procura mundial pelo produto. Entretanto, os transformadores e os exportadores guineenses, como é o caso da empresa Gomes & Gomes, lamentam que os sucessivos Governos da Guiné-Bissau não prestem a devida atenção a este setor, sobrecarregando-o com taxas elevadas.
Em entrevista à DW, em Lisboa, à margem do I Agrofórum CPLP, em outubro, o administrador Agnelo Gomes defende mais incentivos e o fim da instabilidade política como condições para atrair investimento externo.
Matéria-prima vs. indústria
A empresa Gomes & Gomes, dirigida por Agnelo Gomes, é um dos principais exportadores da castanha de caju e está presente neste mercado há cerca de 20 anos. Arrancou com um investimento de aproximadamente 200 mil dólares (183 mil euros). Para o empresário, o futuro do produto está na transformação, pois exportar a matéria-prima não traz ganhos para o país.
Segundo ele, no entanto, investir na indústria requer esforço. "É preciso seguir o exemplo de países como a Costa do Marfim e incentivar quem faz indústria, pois ela cria empregos, promove o crescimento duradouro e ajuda a economia crescer", diz. "São justamente os países industriais que hoje têm força, como a Alemanha, a França, os EUA e o Japão", lembra.
Agnelo Gomes critica os sucessivos Governos da Guiné-Bissau por não darem a atenção merecida à indústria. Cita o exemplo de países produtores e exportadores que decidiram aumentar as taxas em relação à matéria bruta e aplicam o seu proveito para investir na industrialização do caju. "É preciso criar uma taxa de incentivo como criou Abidjan [Costa do Marfim]", diz Gomes.
14.11.16 Caju Guiné-Bissau - MP3-Mono
O papel dos bancos
Atualmente, os bancos cobram juros entre os 12% e os 13% para financiar investimentos nesta área. Agnelo Gomes acredita, no entanto, que uma taxa de até 9% seria razoável e comportável. Apesar dos constrangimentos que essa situação causa, a empresa familiar investiu cerca de 2,4 milhões de euros numa nova fábrica que deverá entrar em funcionamento em 2017.
O objetivo do empresário é criar condições para o futuro. A fábrica terá capacidade para três mil toneladas. A meta da empresa é atingir 12 a 13 mil toneladas por ano ao longo da próxima década.
Nos últimos dois anos, as exportações da Gomes & Gomes subiram de 5 para 7 mil toneladas em matéria bruta. Mas Agnelo Gomes considera baixa as 200 mil toneladas produzidas a nível nacional, se comparadas com as cerca de três milhões de toneladas consumidas pelo mercado internacional.
Face à procura, ele diz que há mercado suficiente para a castanha bruta e a amêndoa transformada originária da Guiné-Bissau, pois o país oferece ambiente para se investir, apesar das crises políticas cíclicas, argumenta.
"O país está a ganhar maturidade democrática, assim como os seus políticos. A crise tornará Guiné-Bissau um país mais forte e experiente e acredito que [a crise] possa ser um bom exercício. Ainda que tenha consequências nos negócios, nos investimentos e no crescimento [da economia]". O empresário mantém-se otimista: "Esperamos que esta situação se resolva nos próximos anos", diz.
Sumos, bolachas e até "bifes" para diversificar rendimento do caju
O caju é a principal fonte de rendimento dos produtores guineenses. A fim de estimular a economia, os produtores de Ingoré uniram-se na cooperativa Buwondena, onde produzem sumo, bolachas e até "bife" de caju.
Foto: Gilberto Fontes
O fruto da economia
Sendo um dos símbolos da Guiné-Bissau, o caju é a principal fonte de receita dos camponeses. A castanha de caju representa cerca de 90% das exportações do país. Este ano, foram exportadas 200 toneladas de castanha de caju, um encaixe de mais de 250 mil euros. A Índia é o principal comprador. O caju poderá trazer ainda mais riqueza ao país, se houver maior aposta no processamento local do produto.
Foto: Gilberto Fontes
Aposta no processamento
Em Ingoré, no norte da Guiné-Bissau, produtores de caju uniram-se na cooperativa Buwondena - juntamos, em dialeto local balanta - para apostar no processamento do caju. Antes, aproveitava-se apenas a castanha, desperdiçando o chamado pedúnculo, que representa cerca de 80% do fruto. Na cooperativa produzem-se agora vários produtos derivados do caju.
Foto: Gilberto Fontes
“Bife” de caju
Depois de devidamente preparado, o pedúnculo, que é a parte mais fibrosa do caju, pode ser cozinhado com cebola, alho e vários temperos. O resultado final é o chamado “bife” de caju.
A partir das fibras, produz-se também chá, mel, geleia, bolacha, entre outros. Ao desenvolverem novos produtos, os produtores diversificam a dieta e aumentam os seus rendimentos.
Foto: Gilberto Fontes
Néctar de caju
Depois de prensadas as fibras do caju, obtém-se um suco que é filtrado várias vezes, a fim de se produzir néctar e sumo. Com 50% desse suco e 50% de água com açúcar diluído, obtem-se o néctar de caju. Este ano, a cooperativa Buwondena produziu quase 400 litros desta bebida.
Foto: Gilberto Fontes
Sumo de caju
O sumo resulta da pasteurização do suco que foi filtrado do fruto, sem qualquer adicionante. Cada garrafa destas de 33cl de sumo de caju custa quase 0.40€. Ou seja, um litro de sumo pode render até 1.20€. O que é bem mais rentável que vinho de caju, produzido vulgarmente na Guiné-Bissau, que custa apenas 0.15€ o litro. Em 2016, foram produzidos na cooperativa quase 600 litros de sumo de caju.
Foto: Gilberto Fontes
Mel de caju
Clode N'dafa é um dos principais especialistas de transformação de fruta da cooperativa. Sabe de cor todas as receitas da cooperativa e só ele faz alguns produtos, como o mel. Mas devido à falta de recipientes, este produziu-se pouco mel de caju. Desde que se começou a dedicar ao processamento de fruta, Clode N'dafa conseguiu aumentar os seus rendimentos e melhorar a vida da sua família.
Foto: Gilberto Fontes
Castanha de caju
Este continua a ser o produto mais vendido pela cooperativa. O processamento passa por várias etapas: seleção das melhores castanhas, que depois vão a cozer, passam à secagem, ao corte e vão à estufa. As castanhas partidas são aproveitadas para a produção de bolacha de caju. Este ano, a cooperativa conseguiu fixar preço da castanha de caju em 1€ o quilo, protegendo os rendimentos dos produtores.
Foto: Gilberto Fontes
Potencial para aumentar produção
A maior parte dos produtos são vendidos localmente, mas alguns são comercializados também em Bissau e exportados para o Senegal. A produção decorre sobretudo entre os meses de março e junho, período da campanha do caju. No pico de produção, chegam a trabalhar cerca de 60 pessoas. Se a cooperativa conseguisse uma arca frigorífica para armazenar o caju, continuaria a produção depois da campanha.
Foto: Gilberto Fontes
Aposta no empreendedorismo
A cooperativa Buwondena aposta na formação a nível de empreendedorismo, para que os produtores possam aumentar o potencial do seu negócio. A cooperativa pretende criar uma caixa de poupança e crédito. O objetivo é que, através de juros, os produtores possam rentabilizar as suas poupanças e apostar noutros negócios.
Foto: Gilberto Fontes
É urgente reordenar as plantações
A plantação de cajueiros é outra das preocupações da cooperativa: uma plantação organizada, com ventilação é fundamental para aumentar a rentabilidade.
Devido ao peso do sector do caju na economia da Guiné-Bissau, todos os anos são destruídos entre 30 e 80 mil hectares de floresta para a plantação de cajueiros. Especialistas defendem uma reordenação urgente das plantações.