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TerrorismoTerritório Ocupado da Palestina

Os túneis do Hamas na Faixa de Gaza

Cathrin Schaer
23 de outubro de 2023

Estima-se que o Hamas tenha construído 1.300 túneis. A rede subterrânea do grupo islamista terá cerca de 500 quilómetros. Analistas apontam para "escala do desafio", caso Israel avance com ofensiva por terra, em Gaza.

Túneis do Hamas em Gaza
"Os túneis permitem aos combatentes moverem-se entre diferentes posições de forma livre e segura"Foto: Jack Guez/AP/picture alliance

A rede de túneis construída pelos Hamas é provavelmente um dos maiores desafios que o Exército israelita terá de enfrentar caso decida avançar com umaofensiva por terra em Gaza.

"A escala do desafio em Gaza, onde há centenas de quilómetros de túneis por baixo do solo, é singular", escreveu John Spencer, especialista em estudos de guerra urbana no Instituto de Guerra Moderna, nos Estados Unidos. Num artigo publicado esta semana, Spencer afirma que "este complexo subsolo é um problema perverso, para o qual não existe uma solução perfeita".

Estima-se que o Hamas tenha construído 1.300 túneis debaixo de Gaza. A rede subterrânea do grupo islamista terá, ao todo, cerca de 500 quilómetros, com túneis a chegar aos 70 metros de profundidade. Alguns relatórios sugerem que a maioria destes túneis não vai além dos 2 metros de altura e largura.

Especialistas acreditam que o Hamas tenha retido aqui os mais de 220 reféns que capturou após o ataque de 7 de outubro a Israel. Presume-se que os túneis sirvam também para armazenar armas, comida, água, combustível e geradores elétricos, entre outros equipamentos. Além disso, acredita-se que os líderes do Hamas também estejam no subsolo.

Estima-se que a rede seja composta por cerca de 1.300 túneis e tenha mais de 500 quilómetros de comprimentoFoto: Ashraf Amra/AA/picture alliance

Especialistas afirmam que os túneis vão complicar ainda mais um já complexo e difícil cenário de guerra.

John Spencer explica que "os túneis permitem aos combatentes moverem-se entre diferentes posições de forma livre e segura".

"Resumindo, os túneis são uma ótima forma de nivelar as partes em conflito, neutralizando a vantagem israelita no que diz respeito a armamento, táticas, tecnologia e organização", acrescenta.

Conflito urbano

Mike Martin, especialista em psicologia de guerra na Universidade Kings College, em Londres, acrescenta que "além de não se conseguir distinguir militares de civis, algo que é obrigatório segundo a lei internacional, o Exército israelita tem os problemas do terreno urbano, que pode ser descrito como lutar em três dimensões".

"Há pessoas a disparar de cima, de torres, e também de posições subterrâneas. E claro, se um edifício é destruído, vai ficar em ruínas, o que se torna ideal para alguém se defender e disparar dali. Por isso, o terreno urbano é o cenário mais complicado que um Exército pode enfrentar", explica o especialista à DW.

A descoberta dos túneis

Originalmente, os túneis nesta área eram usados para atividades de contrabando entre Gaza e o Egito e Gaza e Israel. Com o passar do tempo, devido ao aumento da vigilância aérea israelita em Gaza, o Hamas começou a investir mão de obra e dinheiro na expansão da rede de túneis. 

Mas só em 2014, durante uma operação militar israelita em Gaza, o Exército de Israel descobriu a verdadeira dimensão dos túneis do Hamas.

Militares israelitas mobilizaram unidades especiais para lutar em túneisFoto: Ohad Zwigenberg/AP/dpa/picture alliance

Não é fácil localizar os túneis, sendo que estes podem estar por baixo de qualquer tipo de edifícios. Ainda assim, há diversas formas de o fazer, incluindo através da utilização de radares ou outras formas de localização como padrões térmicos, assinaturas magnéticas e acústicas.

Contudo, o mais comum é estas passagens subterrâneas serem encontradas através de trabalho humano de investigação, tal como refere um relatório de 2017 elaborado pelo centro de pesquisa RAND. Ou seja, através de informações recolhidas por soldados em patrulha ou quando, por exemplo, o sinal telefónico de um telefone do Hamas desaparece quando ele entra no subsolo.

Combate subterrâneo

No passado, gás lacrimogéneo ou agentes químicos foram utilizados para forçar a evacuação dos túneis, explica uma das maiores especialistas mundiais nesta matéria, Daphne Richemond-Barak, no seu livro "Underground Warfare". Hoje em dia, tais métodos seriam "provavelmente considerados ilegais", lê-se.

Também é possível bombardear túneis, e Israel tem no seu arsenal as chamadas bombas "destruidoras de bunkers", que podem penetrar profundamente no subsolo.

No entanto, com apenas 40 quilómetros de comprimento, entre 6 e 14 quilómetros de largura e uma população de 2,2 milhões de pessoas, que tem vivido bloqueada por Israel desde 2007, Gaza é uma das áreas mais densamente povoadas do mundo. Assim, mesmo que os militares israelitas soubessem onde estão os túneis, a situação no terreno tornaria esse tipo de bombardeamento extremamente difícil, se não mesmo impossível.

Israel também usou as chamadas bombas de precisão para fechar túneis, relataram os pesquisadores da RAND, mas só bombardear os túneis não gera o sucesso pretendido pelo Exército israelita.

Além disso, não é fácil combater nestes locais. O subsolo é mais escuro e muito mais frio; sons, como os de tiros de armas, são amplificados e o uso de armas levanta poeira. Os túneis também podem ser facilmente armadilhados. Na verdade, antigamente, os soldados israelitas não eram autorizados a entrar nos túneis até serem protegidos por equipas especializadas.

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Desde 2014, os militares israelitas mobilizaram unidades especiais para lutar em túneis. Essas unidades geralmente treinam em ambientes, físicos ou virtuais, que simulam a realidade nos túneis. As unidades especiais têm soldados treinados no uso de sensores específicos para descobrir o que acontece nos túneis, enquanto outros militares são especializados no combate no subsolo. Essas unidades também são auxiliadas por robôs e cães treinados para aceder aos túneis.

Há chance de sucesso?

John Spencer, um dos fundadores do Grupo de Trabalho Internacional sobre Guerra Subterrânea, afirma que nunca viu nenhuma outra força militar a fazer tanto trabalho preparatório para guerra em túneis como o Exército israelita. 

No entanto, Richemond-Barak, outra fundadora do Grupo de Trabalho Internacional sobre Guerra Subterrânea, manifesta preocupações: "Israel iria necessitar de manter uma prolongada operação aérea e no terreno para conseguir desintegrar esta estrutura subterrânea", escreve num artigo para o jornal diário britânico, o Financial Times, este mês.

O Exército israelita poderia desmoronar, inundar ou destruir e bloquear os túneis, mas isso seria muito difícil, especialmente se estivesse debaixo de fogo num cenário urbano, e poderia levar meses. "Mesmo nesse cenário, que teria um custo humano incalculável, é improvável que toda a rede de túneis de Gaza fosse destruída", acrescenta a especialista.

Mike Martin, o analista da Universidade de Kings College, também acredita que os túneis serão um grande desafio.

"Há várias formas de detetar os túneis, através de radares e inteligência sísmica. Mas há claramente uma falha no aparelho de recolha de informação israelita. Escapou-lhes totalmente um ataque desta dimensão", afirmou Martin, referindo o ataque do Hamas a 7 de outubro, no qual mais de 1.200 pessoas foram mortas.

"Isto mostra-nos que eles [o Exército israelita] têm pontos fracos, e parece-me que, se Israel tem essa falha, não saberá realmente o que o Hamas pretende fazer, como pretende defender Gaza ou quais são os seus planos futuros. Parece-me que há grandes pontos de interrogação sobre o que Israel sabe", concluiu o especialista.

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