Em entrevista exclusiva à DW África, líder interino da RENAMO diz ter "a máxima certeza" que o partido vai vencer as autárquicas. Sobre a fuga de quadros do MDM para a RENAMO, fala em "filhos" que voltam a casa.
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O líder interino da Resistência Nacional Moçambicana (RENAMO), Ossufo Momade, não tem dúvidas: o maior partido da oposição vai vencer as eleições autárquicas de 10 de outubro.
Numa conversa exclusiva com a DW África, Momade fala da polémica em torno da "fuga de quadros proeminentes" do Movimento Democrático de Moçambique (MDM) para a RENAMO, afirmando que é natural receber de braços abertos os filhos que voltam para casa e querem ajudar o partido a vencer as eleições.
Depois das eleições, diz o líder interino, será altura para eleger o sucessor oficial de Afonso Dhlakama.
DW África: Especulou-se sobre uma possível coligação entre a RENAMO e o MDM. Porque é que ela não vingou?
Ossufo Momade (OM): Eu não sei quem é que havia falado, mas do nosso lado nunca houve essa intenção. Nunca tivemos a intenção de nos coligarmos com o MDM, o partido nunca falou sobre isso.
DW África: A RENAMO não pondera coligar-se com outras forças para ficar mais forte e conseguir mais facilmente alcançar os seus objetivos?
OM: Não, isso vai depender dos próprios órgãos do partido. Neste momento, está a falar com um membro da RENAMO que é coordenador da Comissão Política - não posso adiantar nada em relação a isso. Só depois de um encontro do coletivo pode sair uma posição adequada em relação a esse propósito.
DW África: A RENAMO está a desfalcar o MDM, tirando os seus mais proeminentes quadros, e não só. Porque é que optou por esta estratégia?
Ossufo Momade: "Estamos preparados para vitória retumbante"
OM: As pessoas é que aparecem, voltam para casa. Quando um filho volta para casa, é um bom filho, recorda-se do pai. Nós recebemos com as duas mãos. A estratégia do partido é colocar as pessoas nos lugares próprios, que possam ajudar o partido a ir para a frente. Todo o partido quer progredir e a progressão é a vitória em qualquer eleição.
DW África: O facto de a RENAMO ter ficado fora das corridas autárquicas nos últimos anos foi determinante para apostar em figuras bem aceites, experientes neste tipo de corrida eleitoral?
OM: Esses que entraram no MDM – porque alguns apostaram no MDM, uma vez que a RENAMO não tinha concorrido – agora, com a possibilidade de a RENAMO concorrer a estas eleições em outubro, pensam que o único partido que pode garantir a vitória é a RENAMO. Por isso, eles próprios voltaram para casa. Temos confiança na vitória nas autarquias. Sabe-se muito bem que a maioria que está no MDM é da RENAMO. Agora, quando um filho volta para casa, nunca é chutado. Por isso, apostamos nos quadros que ontem estavam na RENAMO e hoje voltaram. O partido não teve outra opção a não ser confiar neles na liderança das listas do partido.
DW África: O que espera das autárquicas de outubro?
OM: A vitória. Espero a vitória, na medida em que estamos preparados para uma vitória retumbante em várias autarquias. Essa vitória vai-nos conduzir a uma vitória em 2019.
DW África: E se tal não acontecer?
OM: Vai acontecer. Temos a máxima certeza. A FRELIMO tentou boicotar a sessão extraordinária [no Parlamento, para debater a legislação eleitoral] porque estava a ver-se numa situação complicada.
DW África: Substitui um líder carismático e bem aceite, tanto na ala política como na ala militar. Foi também bem aceite nas duas correntes quando foi indicado para o cargo que ocupa atualmente?
OM: É difícil responder, na medida em que eu fui eleito através da Comissão Política e, neste momento, estou sediado onde estava o líder, na serra da Gorongosa. A eleição foi na parte política e hoje estou a conviver com aqueles que sempre conviveram com o presidente - a ala militar. Resta-me saber... (risos) é uma pergunta complexa.
DW África: Quando será eleito ou indicado definitivamente o líder da RENAMO?
OM: Neste momento, temos uma preocupação: as eleições autárquicas. As atividades políticas estão a decorrer normalmente. Depois dessas eleições, pensamos realizar o congresso e é daí que vai sair o presidente do maior partido da oposição.
DW África: Quando é que planeia sair da Gorongosa?
OM: A minha saída será depois da conclusão de todo o processo de integração das forças residuais da RENAMO [nas Forças de Defesa e Segurança] e desmobilização daqueles que não vão poder estar na polícia.
Afonso Dhlakama, homem de causas
O percurso de Afonso Dhlakama enquanto político e militar quase se confunde com a história de Moçambique independente. Em nome da democracia não hesitou em entrar numa guerra. Herói para uns, vilão para outros.
Foto: picture-alliance/dpa
Dhlakama, um começo na FRELIMO que não vingou
Afonso Macacho Marceta Dhlakama nasceu a 1 de janeiro de 1953 em Mangunde, povíncia central de Sofala, Moçambique. Entra para a FRELIMO perto da época da independência em 1975, mas não fica muito tempo. Em 1976 sai do partido que governa o país para co-fundar a RNM (Resistência Nacional de Moçambique), um movimento armado, com o apoio da Rodésia do Zimbabué. O objetivo: por fim a ditadura.
Foto: Imago/photothek
Dhlakama: Desde cedo líder da RENAMO
A guerra civil entre a RNM, depois denominada RENAMO, Resistência Nacional de Moçambique, e o Governo começou em 1976. Dhlakama assume a liderança da RNM depois da morte de André Matsangaíssa em combate em 1979. Já era líder quando o primeiro acordo que visava por fim a guerra foi assinado entre o Governo e o regime do apartheid na África do Sul em 1984. Mas o Acordo de Inkomati fracassou.
Foto: Jinty Jackson/AFP/Getty Images
AGP: Democracia entra no vocabulário com Dhlakama
Depois de 16 anos de guerra Dhlakama assina com o Governo o Acordo Geral de Paz de Roma em 1992 no contexto do fim da guerra fria e do apartheid na África do Sul. Começa uma nova era para o país, depois de uma guerra que fez perto de um milhão de mortos e milhões de refugiados. A democracia passa então a fazer parte do vocabulário dos moçambicanos, com Dhlakama a auto-intitular-se o seu pai.
Foto: picture-alliance/dpa
O começo das derrotas de Dhlakama nas eleições
Moçambique entra para a era do multipartidarismo e realiza as suas primeiras eleições em 1994. Dhlakama e o seu partido perdem as eleições. As segundas eleições acontecem em 1999 e Dhlakama volta a perder, mas rejeita a derrota. E desde então não parou de perder, facto que provocou descontentamento ao partido de Dhlakama. Reclamava de fraudes e injustiças. E nasceram assim as crises com o Governo.
Foto: Reuters/Grant Lee Neuenburg
Dhlakama: O regresso às matas como estratégia de pressão
O regresso do líder da RENAMO à Serra da Gorongosa em 2013, um dos seus bastiões militares, foi uma mensagem inequívoca ao Governo da FRELIMO. Dhlakama queria mudanças reais, que passavam pelo respeito integral do AGP, principalmente a integração dos militares da RENAMO no exército nacional, e mudança da legislação eleitoral. Assim o país voltou a guerra depois de mais de vinte anos.
Foto: Jinty Jackson/AFP/Getty Images
Armando Guebuza e Dhlakama em braço de ferro permanente
A 5 de agosto de 2014 o então Presidente Armando Guebuza e Afonso Dhlakama assinaram um cessar-fogo. Estavam criadas as condições para o líder da RENAMO participar nas eleições gerais de outubro de 2014. Dhlakama e o seu partido participam nas eleições e voltam a perder. As crise volta ao rubro e Dhlakama regressa às matas da Gorongosa.
Foto: Jinty Jackson/AFP/Getty Images
Emboscada contra Afonso Dhlakama
A 12 de setembro de 2015 a caravana em que seguia Afonso Dhlakama foi atacada na província de Manica. Ate hoje não se sabe quem foram os atacantes. A RENAMO considerou a emboscada como uma tentativa de assassinato do seu líder. A comunidade internacional condenou o uso da violência.
Foto: DW/A. Sebastião
Aperto ao cerco contra Afonso Dhlakama
No dia 9 de outubro de 2015, a polícia cercou e invadiu a casa de Afonso Dhlakama na cidade da Beira. As forças governamentais pretendiam desarmar a força a guarda do líder da RENAMO. Os homens da RENAMO que se encontravam no local foram detidos. A população da Beira, bastião da RENAMO, juntou-se diante da casa de Dhlakama manifestando o seu apoio ao líder.
Foto: picture-alliance/dpa/A. Catueira
Dhlakama e Nyusi: Menos mãos melhores resultados
O líder da RENAMO e o Presidente da República decidiram prescindir de mediadores e passaram a negociar o acordo pessoalmente. Desde então consensos têm sido alcançados, um deles relativo à revisão pontual da Constituição, no âmbito do processo de descentralização em fevereiro de 2018. A aprovação da proposta pelo Parlamento é urgente, pois as próximas eleições de 2018 e 2019 dependem dele.
Foto: Presidencia da Republica de Mocambique
Dhlakama: Não foi a bala que ditou o seu fim
Na manhã de 3 de maio o maior líder da oposição em Moçambique perdeu a vida vítima de doença. Deixa aos seus correlegionários a tarefa de negociar outro ponto controverso na crise com o Governo: a desmilitarização ou integração dos homens armados da RENAMO no exército nacional. Há quase 40 anos à frente da liderança da RENAMO teve de negociar com todos os Presidentes de Moçambique independente.