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Cultura

Pós-guerra em Moçambique tematizado na Berlinale

Cristiane Vieira Teixeira (Berlim)
12 de fevereiro de 2019

Realizador moçambicano traz a Berlim o projeto do documentário "As Noites Ainda Cheiram a Pólvora". Busca aperfeiçoar a produção e abrir mercados para abordagem pessoal do pós-guerra em Moçambique.

Mosambik - Recherfoto des mosbamikanschen Regisseurs Inadelso Cossa
Cena da pesquisa do projeto do documentário "As Noites ainda Cheiram a Pólvora"Foto: 16mm Filmes

Em Berlim a participar da Berlinale, Inadelso Cossa, realizador moçambicano de 35 anos, conta que no documentário "As Noites Ainda Cheiram a Pólvora", ainda em fase de pesquisa e desenvolvimento, pretende compor um retrato contemporâneo do pós-Guerra Civil em Moçambique.

"Estou a fazer um filme atual sobre as consequências da Guerra Civil nas pessoas hoje. Estou a contar o que é que está a acontecer na vida dessas pessoas depois de terem enfrentado a guerra", revela.

O realizador quer dar um tom auto-biográfico à sua estória e busca respostas sobre a sua própria trajetória.

"É um realizador, eu neste caso, que volta à aldeia da sua avó para questioná-la, porque ela tornou a guerra numa ficcção. Quando a aldeia era atacada e tínhamos que fugir, sempre que havia bombardeamentos e sons de balas, ela dizia sempre que eram fogos de artifício", recorda.

Pós-guerra em Moçambique tematizado na Berlinale

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Diálogo como prevenção

Inadelso diz que sua motivação pessoal é iniciar um diálogo sobre o que se passou.

"É claro que ela queria proteger-me, mas isso também reflete a falta de diálogo que existe no país em relação a fatos do passado, como a Guerra Civil – não se fala muito. Mas de certeza que qualquer guerra deixa feridas, cicatrizes, traumas. A aldeia onde a minha avó vive já não é mais a mesma, já não se fala muito. As pessoas são mais silenciosas do que costumavam ser no passado", considera.

Para o realizador moçambicano, falar do passado pode evitar que erros se repitam.

"O não falar ou o silêncio também pode ser perigoso porque tu corres o risco de fazer com que a próxima geração não saiba o que aconteceu e facilmente pode cair em perigo de uma nova guerra", considera.

O tema da memória sempre foi assunto dos filmes de Inadelso Cossa. O realizador moçambicano revela que o título do documentário está diretamente ligado às lembranças de quem viveu a guerra.

Soldados moçambicanos em 1987Foto: picture-alliance / Paul O'Driscoll / Impact Photos

"Durante o dia, as pessoas têm uma vida comum, normal. Não falam. O silêncio, o trauma. Mas, quando a noite vem é quando o cheiro a pólvora vem. As noites eram os momentos onde normalmente havia os ataques, os bombardeamentos e isso tudo. As pessoas tinham que fugir e muitas casas eram queimadas. Essas pessoas, os meus personagens, durante o dia não falam sobre isso. Mas, quando a noite vem é quando o cheiro a pólvora os remete a falarem sobre o que acontecia", afirma.

Para abrir o debate que pretende, o realizador quer "ligar a câmera e mostrar como é a luz e como é o som da aldeia hoje, como é que as pessoas estão a viver com essa memória e qual é o afeito nas suas vidas, como é que o trauma de guerra se manifesta nas suas vidas, como é que mudou aquilo que foram as minha referências de infância e como é que mudou a forma como essa aldeia hoje existe".

Janela para o mundo

Na Berlinale, Inadelso Cossa representa Moçambique na sessão "Talents", que promove um encontro entre profissionais do mundo do cinema e da arte e 250 talentos da produção cinematográfica global.

Berlinale Talents promove encontro entre profissionais do mundo do cinema e da arteFoto: picture-alliance / dpa / Montage DW

Discute com um mentor os planos para dar continuidade à sua produção.

"Desde o conteúdo, a forma como eu pretendo desenvolver o projeto em Moçambique, a forma como eu quero tornar o projeto em filme. É o sítio ideal para ter um feedback [parecer] de um profissional que tem a experiência de trazer um filme com as condições cinematográficas para ir para um festival e ser aceite", avalia.

"As Noites Ainda Cheiram a Pólvora" já conta com co-produção francesa e alemã. Ao apresentar o projeto no Festival Internacional de Cinema de Berlim, o realizador moçambicano espera abrir novas portas.

"O [festival] Berlinale é esse mercado onde todos os profissionais da área de cinema, mas todo mesmo, no que concerne desde a produção até a distribuição de cinema, encontram-se. É um dos festivais que qualquer realizador do mundo escolhe para trazer o seu filme. Se o seu projeto for apresentado oficialmente, nunca sabes. Qualquer pessoa ligada a qualquer área - financiamento, distribuição ou um co-produtor que queira participar num certo projeto - de certa forma [pode] intervir e pode mudar o teu projeto completamente", conclui Inadelso Cossa.

O Festival Internacional de Cinema de Berlim decorre até o próximo dia 17 de fevereiro na capital alemã.

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