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PALOP em estado de emergência: O que mudou?

Marta Cardoso
4 de abril de 2020

Na luta contra a pandemia da Covid-19, todos os PALOP estão em estado de emergência. A DW África reuniu as informações mais relevantes sobre as medidas de restrição adotadas por cada um dos países.

Mercado informal em Maputo, a capital de Moçambique
Mercado informal em Maputo, a capital de MoçambiqueFoto: DW/R. da Silva

Com a entrada de Moçambique no estado de emergência, na segunda-feira passada (30.03), todos os Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa (PALOP) adotaram um regime especial para combater a pandemia da Covid-19.

O estado de emergência pode ser declarado em casos de calamidade pública, como uma pandemia, e pode determinar a suspensão ou a limitação de alguns direitos, liberdades e garantias constitucionalmente consagrados. Algo que tem levantado controvérsia, com alguns analistas a acusar governantes de obterem aproveitamento político, como, por exemplo, no caso da Guiné-Bissau. 

Este regime está geralmente previsto na Constituição dos países, sendo que cada um tem autonomia para definir as medidas concretas a aplicar em cada situação. E é aqui que se tem gerado algumas dúvidas relativas ao que já foi implementado em cada país. Há ainda uma incerteza sobre se o estado de emergência trará mais benefícios ou prejuízos para economias emergentes. 

Mais liberdade no pós-Covid-19?

O jurista português Rui Verde defende que tem de haver um equilíbrio entre as liberdades e a segurança. "Neste momento, o pêndulo está para a segurança, prejudicando as liberdades. Terá que ser assim", sublinha. 

O analista acredita que, depois do estado de emergência, as pessoas vão exigir mais liberdades. "As pessoas pedirão mais liberdades e não menos, porque se verá que os Governos, até certo ponto, são impotentes para impor a sua vontade", diz.

Para Rui Verde, a eficácia das medidas impostas contra o novo coronavírus nos países africanos "será mínima" quando comparada com os países europeus, porque a população não cumpre as regras impostas, como se verifica em Luanda, a capital angolana. "É impossível às autoridades imporem [as medidas de restrição] mesmo quando colocam blindados a percorrer as ruas. É difícil", afirma. 

Quais são afinal as medidas impostas por cada PALOP durante o estado de emergência? E quais as obrigações e os direitos dos cidadãos? A DW África reuniu as informações mais relevantes:

Moçambique: Circulação nas ruas é permitida

Moçambique é o país com mais habitantes dos PALOP, mas foi o último a declarar o estado de emergência. É ainda o país que apresenta medidas menos rígidas. Anunciado a 30 de março, o estado de emergência vai vigorar durante todo o mês de abril. 

As medidas iniciais previstas eram muito gerais e geraram confusão, levando ao encerramento precipitado de alguns estabelecimentos comerciais. Na quinta-feira (02.04), foram anunciadas as limitações a serem cumpridas durante este período de contenção da pandemia da Covid-19. Desde 23 de março que as escolas estão fechadas, os vistos suspensos e que a aglomeração de pessoas é desaconselhada.

Para já, ainda não existe uma proibição de circulação nas ruas, apesar de o estado de emergência assim o permitir. Helena Mateus Kida, ministra da Justiça, Assuntos Constitucionais e Religiosos de Moçambique, justifica a decisão tendo em conta que o país ainda não está na fase de "lockdown" (recolher obrigatório). "Continuamos sim a circular, mas o que queremos é criar condições para que nos movimentemos menos, só em caso de extrema necessidade", acrescentou a governante. 

Medidas de prevenção impostas pelo Governo:

- Estão proibidas as aglomerações de mais de 20 pessoas, assim como todos os eventos públicos e privados, incluindo cultos religiosos.
- É proibido o transporte de passageiros em mototáxis e bicicletas. Os transportes públicos devem transportar um máximo de um terço da sua capacidade.
- Os mercados formais funcionam entre as 6h e as 17h, sendo obrigatória a adoção de medidas de prevenção, incluindo o uso de máscaras entre os comerciantes. Ainda não foi divulgada qualquer medida direcionada ao comércio informal. 
- Estão encerrados os estabelecimentos culturais, de diversão e de lazer.
- Estão interditas as visitas aos estabelecimentos penitenciários.
- Nos estabelecimentos hospitalares, só são permitidas duas visitas por dia a cada doente. As visitas a pacientes contaminados com o novo coronavírus estão interditas. 
- Como em todas as aglomerações de pessoas, nas cerimónias fúnebres só podem estar 20 pessoas. É obrigatório o uso de máscaras. Se o morto for uma vítima da Covid-19, o número de pessoas que pode estar presentes baixa para dez.
- As instituições públicas e privadas continuam a funcionar, devendo ser observadas cumulativamente as medidas de prevenção e controlo da Covid-19. 
- O número de trabalhadores presenciais deve ser reduzido para pelo menos um terço, na proporção de rotatividade de serviço de 15 em 15 dias.
- Os documentos de identificação e outros expirados continuarão válidos até ao dia 30 de junho.

Garantias de proteção dos cidadãos:

O Estado disponibiliza informação atualizada sobre a Covid-19 nos seguintes acessos: 
- Página oficial na internet sobre a Covid-19: https://covid19.ins.gov.mz/ 
- Plataforma PENSA: *660#
- Plataforma Alo Vida: 84146/ 82149/ 1490
- E-mail para contacto: covid19@ins.gov.mz

Estabelecimento comercial em Maputo, a capital de MoçambiqueFoto: DW/R. da Silva

Angola: Medidas acessíveis 

Angola está desde 27 março em estado de emergência, que está em vigor até 11 de abril. É o país onde é mais fácil para o cidadão comum encontrar a lista completa de medidas para prevenção e controlo da propagação da pandemia da Covid-19. As informações estão acessíveis online no Diário da República (DR). 

Medidas de prevenção impostas pelo Governo:

- As pessoas só podem circular e permanecer na via pública para adquirir bens e usufruir de serviços essenciais.
- É proibido sair do país por qualquer meio e circular entre as províncias, exceto em casos de extrema necessidade e urgência. 
- Ninguém pode recusar a realização dos testes obrigatórios, sob pena de prática de crime de desobediência.
- Serviços públicos e estabelecimentos comerciais privados não essenciais estão fechados, assim como todas as escolas públicas e privadas.
- Os mercados públicos, formais ou informais, mantêm-se em funcionamento, entre as 6h e as 13h, exclusivamente para a comercialização de produtos essenciais.
- É permitida a venda ambulante individual de bens essenciais, mas são proibidos os mercados informais de rua que impliquem a concentração de pessoas.
- Estão interditos eventos, atividades, reuniões e manifestações que concentrem mais de 50 pessoas.
- Fecham discotecas, museus, zonas balneares e outros espaços desportivos, culturais e de lazer. Atividades deste tipo na via pública também estão interditas. 
- Estão suspensos os cultos e celebrações religiosas na sua dimensão coletiva em todos os lugares de culto.
- Estão interditas as visitas a estabelecimentos prisionais e hospitalares.
- Os transportes coletivos, rodoviários e ferroviários estão a funcionar com serviços mínimos. Transportes públicos e privados têm um limite máximo de um terço de passageiros em simultâneo em relação à sua capacidade. Fica proibida a prestação de serviços de mototáxi.

Garantias de proteção dos cidadãos:

- Estão proibidos os despedimentos com fundamento na ausência dos trabalhadores do local de trabalho.
- Cidadãos particularmente vulneráveis à infeção pelo novo coronavírus com vínculo laboral com entidades públicas ou privadas estão dispensados da atividade laboral presencial. 
- Se a entidade empregadora assim o definir, os trabalhadores podem estar sujeitos ao regime de trabalho em domicílio.
- São proibidos os despejos de inquilinos nos contratos de arrendamento para fins habitacionais. O inquilino continua a ter de pagar a renda devida.
- São válidos os documentos oficiais, como bilhete de identidade e visto de trabalho, mesmo que caducados.

O transporte público foi restringido em alguns países dos PALOPFoto: DW/R. da Silva

Guiné-Bissau: Pagamento de seguro de vida 

Umaro Sissoco Embaló, dado como vencedor das eleições presidenciais pela Comissão Nacional de Eleições (CNE), decretou no sábado passado (28.03) o estado de emergência, que vai vigor até 11 de abril.

Não está restringida a liberdade de circulação a jornalistas, elementos das forças de defesa e segurança, da saúde, operadores das bombas de combustíveis, farmácias, bancos, comércio e finanças.

Medidas de prevenção impostas pelo Governo:

- A circulação de pessoas no país só é possível entre as 7h e as 11h para compra e venda de bens essenciais. É obrigatório lavar as mãos e entrar de máscara nos estabelecimentos abertos.
- É proibida a entrada ou saída do território nacional, salvo exceções previstas no Diário da República. 
- A especulação de preços será punida com o dobro da multa prevista na lei e está proibida a venda ambulante.
- Farmácias devem estar abertas 24 horas.
- Pessoas infetadas com o novo coronavírus ou com suspeita da doença devem ficar em isolamento obrigatório.  
- Os locais de culto estão encerrados e as cerimónias tradicionais estão proibidas.
- Estão interditas aglomerações com mais de cinco pessoas.
- Todos os transportes urbanos, interurbanos e mistos estão proibidos de circular.
- As viaturas particulares podem circular, mas apenas com metade da capacidade.
- Está suspenso o direito à greve que possa comprometer o funcionamento de setores essenciais.
- Estão dispensados todos os funcionários públicos não essenciais, podendo ser chamados para desempenhar funções de prevenção da Covid-19.

Garantias para a população:

- É proibido o despedimento de pessoas com fundamento na sua ausência do local de trabalho.
- Todos os agentes envolvidos no processo de combate à pandemia vão ter seguro de vida pago pelo Estado.
- Linhas gratuitas de assistência: 1313 (Orange) do Serviço Nacional de Proteção Civil, 1919 (MTN) do Ministério da Saúde Pública, 2020 (Orange) do Ministério da Saúde Pública.
- Assistência alimentar, médica e medicamentosa em caso de necessidade.

São Tomé e Príncipe: o país mais rápido a agir

Apesar de ser o único dos PALOP que não regista nenhum caso do novo coronavírus, São Tomé e Príncipe foi o primeiro a decretar o estado de emergência. Em vigor desde 20 de março, o prazo terminava a 3 de abril, mas foi prorrogado esta quarta-feira (01.04) por mais 15 dias. A resolução aprovada pela Assembleia Nacional prevê a prorrogação "por períodos sucessivos" até a metade de junho. 

As ligações marítimas e aéreas entre as duas ilhas do arquipélago continuam a realizar-se, mas com menos frequência. O Governo Regional do Príncipe apresentou uma resolução ao Governo para suspender esta ligação, mas foi rejeitada a 25 de março. O Conselho de Ministros reforçou, contudo, as medidas de controlo sanitário nos aeroportos e portos de São Tomé e do Príncipe.

Medidas de prevenção impostas pelo Governo:

- É proibida a entrada no país de balões de fardo (roupas usadas) para venda no mercado informal são-tomense.
- Estão suspensos todos os voos comerciais e privados provenientes do exterior.
- Todas as escolas públicas e privadas do país estão encerradas.
- Estão proibidas todas as concentrações públicas de caráter cultural, recreativo, religioso, desportivo e lúdico.
- Está suspenso o desembarque de tripulantes e passageiros de navios de mercadoria e de cruzeiro provenientes do exterior, nos portos de São Tomé e do Príncipe.
- Os cidadãos nacionais e estrangeiros residentes, que regressarem ao país, serão sujeitos a quarentena domiciliária obrigatória.
- O abastecimento de materiais e consumíveis hospitalares, em regime de urgência, será acautelado por voos fretados para o efeito.

Garantias dadas pelo Governo:

- O estoque de combustíveis está assegurado para os próximos meses.
- O mercado está abastecido e vão chegar novos carregamentos de víveres.
- Linha de emergência 115: Contactar de imediato em caso de sintomas como febre, tosse, dor de garganta, insuficiência respiratória e secreções nasais. 
- Linhas alternativas: serviços de Epidemiologia do Ministério da Saúde, através dos terminais telefónicos 222 5217, 993 0655, 991 1007, 984 5556, 990 3846 ou 991 8120.

Poucas pessoas circulam nas ruas em Cabo VerdeFoto: DW/A. Semedo

Cabo Verde: Apoios ao setor informal 

O Presidente cabo-verdiano, Jorge Carlos Fonseca, declarou o estado de emergência no país no passado domingo (29.03) até 17 de abril. O primeiro-ministro de Cabo Verde, Ulisses Correia e Silva, esclareceu que, durante este regime de exceção, "não é apenas sensibilização ou pedido para ficarem em casa". "Agora é obrigatório ficar em casa. É a lei que impõe", diz. 

O primeiro-ministro cabo-verdiano explicou que não vai colocar pessoas em filas para entregar dinheiro ou bens alimentares. Para prevenir os riscos de contágio, os subsídios serão pagos através de contas bancárias. "As cestas básicas de assistência alimentar serão entregues em casa dos beneficiários. Os cuidados aos idosos serão prestados em suas casas", explicou. 

Medidas de prevenção da Covid-19 em vigor impostas pelo Governo:

- Estão encerrados todos os serviços e empresas públicas não essenciais, podendo recorrer-se ao teletrabalho e ao trabalho a partir de casa. Em nenhuma circunstância ficarão os trabalhadores prejudicados no seu vínculo laboral e no seu salário.
- Todas as escolas foram encerradas.
- Os mercados municipais de venda de produtos agroalimentares deverão funcionar com um número reduzido de vendedores, conforme a determinação das câmaras municipais.
- É proibida a venda ambulante de produtos nas ruas.
- Estão suspensos os voos e ligações marítimas interilhas, salvo situações excecionais devidamente autorizadas pela autoridade de proteção civil.
- Os serviços de restauração podem manter-se abertos exclusivamente para efeitos de entrega a domicílio entre as 10h e 21h. Outros serviços de fornecimento de bens essenciais podem manter a atividade até as 20h.

Garantias para a população:

- Atribuição do Rendimento Social de Inclusão Emergencial a 2.788 famílias em situação de pobreza extrema.
- Assistência alimentar a 22.500 famílias cujo rendimento se situa abaixo do salário mínimo ou sem qualquer fonte de rendimento.
- Atribuição do Rendimento Solidário para 30 mil trabalhadores do Regime Especial das Micro e Pequenas Empresas (REMPE) e do setor informal.
- Reforço das ações de cuidados ao domicílio destinados a idosos e pessoas dependentes que vivem isolados.
- Criação de linhas de crédito especiais para apoiar as empresas e aumentar a sua liquidez, com garantias do Estado que podem chegar aos 100% do financiamento, com carência de capital e de juros até seis meses e amortização de quatro a cinco anos.
- Está assegurado o pagamento em prestações do IVA e da retenção na fonte e a suspensão e alargamento dos prazos de execuções fiscais.
- A suspensão coletiva de trabalho será paga a 70% do salário bruto, sendo que o empregador assegura 35% do pagamento e a Segurança Social (INPS) os outros 35%.
- A linha de emergência é a Linha Verde Covid-19: 8001112. 

A informação presente neste artigo não dispensa a consulta dos informes oficiais e dos diplomas legais de cada país. 

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