Para HRW, prisão de médico serve para silenciar críticas na Guiné Equatorial
8 de maio de 2012 A justiça da Guiné Equatorial condenou, na segunda-feira (07.05), o médico Wenceslao Mansogo a três anos de prisão, na sequência da morte de uma paciente durante uma cirurgia.
Wenceslao Mansogo é médico e considerado agora um preso de consciência pela organização Amnistia Internacional.
Está atrás das grades, no estabelecimento prisional de Bata, a capital económica da Guiné Equatorial que fica na parte continental do país, localizada entre Camarões e Gabão. Mansogo foi detido a 09.02, na sequência da morte de uma paciente durante uma cirurgia, na sua clínica privada naquela cidade.
A sentença, anunciada esta segunda-feira (07.05), condena Mansogo a três anos de prisão, ao pagamento de uma indemnização à família da vítima de 5 milhões de francos CFA (7.500 euros) e de 1,5 milhões ao Estado (2.300 euros), além de ficar impedido de exercer medicina durante a pena e de ter a sua clínica encerrada.
Membro da oposição
Mansogo, que é também crítico ao governo do país, foi acusado de negligência médica e de profanação de cadáver. Mas, mais tarde, um relatório médico terá concluído que não houve profanação e que a morte foi causada por um ataque cardíaco da paciente - o que iria contra a acusação de negligência.
Por isso, para a organização de defesa dos direitos humanos Human Rights Watch, o julgamento é uma farsa, como disse o representante Reed Brody: "A condenação tem sido resultado de um processo judicial que é uma farsa, o que mostra que os partidos políticos estão totalmente hostilizados. É uma condenação que não resiste a uma análise séria e que devia ser anulada", acredita o jurista.
Wenceslao Mansogo é um ativista e responsável pelo dossiê de direitos humanos no principal partido da oposição do país, a Convergência para a Social Democracia, cujos membros são regularmente detidos e intimidados.
Nesse sentido, para a Human Rights Watch, a condenação de Mansogo é uma manobra para o governo do presidente Teodoro Obiang silenciar uma voz crítica. "É um julgamento claramente oportunista, destinado a afastar Mansogo do cenário político", afirma Brody. "Nós examinamos de perto o julgamento e a condenação não se justifica pelas circunstâncias da morte da paciente. Para nós, o governo de Obiang tem aproveitado as circunstâncias da morte dessa paciente para tomar represálias contra um dos principais críticos", explica.
Temor de represálias
A organização de defesa dos direitos humanos está também preocupada com possíveis represálias contra os advogados de Mansogo. Segundo a HRW, um deles tem sido, alegadamente, sucessivas vezes ameaçado pelo pai da paciente que perdeu a vida durante a cirurgia; o outro tem visto ameaçada a sua licença para praticar advocacia por causa dos argumentos críticos contra o governo que usou em tribunal.
Os advogados vão recorrer da sentença. Reed Brody, da Human Rights Watch, não baixa os braços mas reconhece que será difícil a justiça voltar atrás, pois o sistema jurídico da Guiné Equatorial não é independente. Os tribunais, segundo Brody, "têm intervenção direta do presidente para proteger os seus interesses pessoais. Os advogados que têm sido ativos em direitos humanos têm sido hostilizados. E o presidente, pela Constituição, tem um controlo quase total, é o presidente do Conselho Supremo de Magistratura e nomeia os outros membros", diz o advogado norte-americano.
A HRW ainda citou que a International Bar Association, que representa os advogados de todo o mundo, considerou, após uma visita à Guiné Equatorial em 2003, que os tribunais não são independentes nem imparciais.
Mansogo já escreveu uma carta a pedir ajuda à UNESCO, Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura.
Sem água e sem eletricidade
Neste momento, Mansogo está na prisão de Bata, onde não existe água canalizada ou própria para consumo, a eletricidade é esporádica e a comida inadequada.
Apesar de o tribunal ter garantido direito total de visitas, o médico só teve ainda permissão para receber os seus advogados e a esposa. Além disso, a 18.04, agentes policiais entraram na sua cela e confiscaram bens como computador, livros, rádio e canetas.
Segundo especialistas, a Guiné Equatorial regista elevados níveis de corrupção e fracas condições socioeconómicas, apesar de possuir um dos mais elevados Produtos Internos Brutos do mundo.
Este episódio belisca o respeito pelos Direitos do Homem, condição que é considerada essencial para a adesão à Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP), à qual o país de Teodoro Obiang deseja há muito poder integrar.
Autora: Glória Sousa
Edição: Renate Krieger / António Rocha