Parlamento guineense deve iniciar sessão ordinária sem PAIGC
Iancuba Dansó (Bissau)
29 de junho de 2020
Crise política e maioria no Parlamento devem ser temas discutidos na sessão que inicia esta segunda-feira (29.06). PAIGC declara que não participará e que "estado de terror" na Guiné-Bissau inviabiliza o Parlamento.
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A sessão ordinária do Parlamento terá início esta segunda-feira (29.06) e deverá determinar de que lado está a maioria dos deputados. O Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC) venceu as eleições legislativas de março de 2019, mas os partidos que atualmente governam o país se opõem à devolução da governação ao PAIGC e alega ter maioria parlamentar para governar.
A Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO) é mediadora da crise e sugeriu a solução do impasse até o dia 22 de maio, considerando que o PAIGC tem a maioria. O candidato considerado vencedor das presidenciais de 2019 pela Comissão Nacional de Eleições (CNE), Umaro Sissoco Embaló, também deu prazo até 18 de junho para o entendimento, mas a polémica continua.
Mesmo antes de arrancar, a sessão já se adivinha tensa: numa carta enviada na sexta-feira (26.06) ao presidente da Assembleia Nacional Popular, Cipriano Cassamá, a que a DW África teve acesso, o grupo parlamentar do PAIGC afirma que procedeu "a uma profunda análise da situação política vigente no país" e concluiu que "está posta em causa a realização da sessão ordinária cujo início está marcado para 29 de junho".
Parlamento guineense deve iniciar sessão ordinária sem PAIGC
"Uma farsa"
O analista político Rui Landim critica a foram que a sessão está a ser organizada. "Não passa de uma farsa democrática, não há a expressão da liberdade dos deputados e dos atores políticos com as suas convicções. Porque já se conseguiu - através de coação física e mental, através da ameaça de morte - fazer com que apareça uma farsa, a qual os deputados apoiaram".
A agência Lusa publica que o vice-presidente do PAIGC, Cipriano Cassamá, confirmou que o partido não participará na sessão. Se isso realmente ocorrer e a maioria estiver do seu lado, não haverá sessão por falta de quórum para o início dos trabalhos.
Perante este impasse, o presidente da Rede Nacional das Associações Juvenis (RENAJ), Seco Duarte Nhaga, pede mais responsabilidade aos deputados: "É verdade que se pode esperar da próxima sessão parlamentar muita tensão, pelo desenho que estamos a ver. Nós enquanto organizações da juventude, estamos a apelar aos atores políticos, sobretudo aos deputados, que sejam capazes de ter maturidade política suficiente para ajudar o país a sair deste imbróglio", considera Nhaga.
Ameaça de dissolução
Sem entendimento entre os partidos e esgotados os prazos dados pela CEDEAO e por Umaro Sissoco Embaló para formar um Executivo, os olhos estão postos no Parlamento dividido em dois blocos que reivindicam a maioria parlamentar. Sissoco Embaló admitie a possibilidade de dissolver o Parlamento, aguardando, para já, os resultados da sessão plenária.
Nas ruas de Bissau, a população espera o fim do impasse e que se inicie a resolução dos problemas concretos do país. "Acho que os deputados devem trabalhar para o avanço do país. A Guiné-Bissau não pode ficar assim, todos os deputados devem trabalhar. Eu acho que essa sessão (parlamentar) deve trazer alegria ao povo guineense", disse um universitário ouvido pela reportagem da DW África.
Para Rui Landim a solução para a crise na Guiné-Bissau passa pela reposição da ordem constitucional. "O governo que ganhou as eleições deve retomar e aguardar-se depois a resolução do contencioso eleitoral (eleições presidenciais). Quando tudo isto for resolvido, vamos avançar. Mas há um princípio constitucional de que o governo surge como resultado das eleições legislativas e o partido mais votado é convidado a formar o governo".
Farpas e elogios: Frases das eleições na Guiné-Bissau
Principais partidos políticos, sociedade civil e comunidade internacional acompanham de perto contagem de votos na Guiné-Bissau. CNE só divulga resultados na quarta-feira (13.03), mas PAIGC já canta vitória.
Foto: Getty Images/AFP/SEYLLOU
PAIGC
O PAIGC declarou-se, na segunda-feira (11.03), vencedor das eleições legislativas de 10 de março na Guiné-Bissau. O porta-voz do partido João Bernardo Vieira garantiu que o povo conferiu ao PAIGC os destinos do país. No domingo, após votar, o líder do PAIGC, Domingos Simões Pereira, disse que estas eleições representam "um momento de viragem" para que, na Guiné-Bissau, "o império da lei vingue".
Foto: DW/F. Tchumá
MADEM-G15
Após o anúncio do PAIGC, o Movimento para a Alternância Democrática frisou que ninguém ganhou as eleições com maioria absoluta e que também fará parte do próximo Governo do país. As declarações de Braima Camará no domingo, dia das eleições, foram das mais críticas, pois o líder do MADEM-G15 acusou o primeiro-ministro de "usar dinheiro público para corromper líderes de opinião no dia de reflexão".
Foto: DW/J. Carlos
PRS
O Partido da Renovação Social disse, esta terça-feira, que "é falsa a informação da maioria folgada que o PAIGC sustenta para semear a confusão"."Nenhuma das forças políticas atingiu sequer a barra dos 40 deputados", disse Vítor Pereira. No domingo, depois de votar, Alberto Nambeia, líder do PRS, disse que esta votação constitui um "balão de oxigénio" para o povo, que quer mudanças no país.
Foto: DW/B. Darame
FREPASNA
Baciro Djá considera que era o candidato com mais experiência nestas eleições e, por isso, o justo vencedor. No entanto, esta segunda-feira, o líder do partido Frente Patriótica para a Salvação Nacional (FREPASNA) foi o primeiro a reconhecer a derrota no pleito. "Consideramos que o nosso resultado foi péssimo e a responsabilidade máxima é minha, enquanto presidente do partido", disse.
Foto: Presidency of Guinea-Bissau
Comissão Nacional de Eleições (CNE)
Pouco depois do arranque do pleito, no domingo, José Pedro Sambú, presidente da CNE, disse aos jornalistas que o processo estava a decorrer num "clima de transparência e sem sobressaltos". O mesmo cenário foi reportado pela porta-voz da comissão, ao final do dia. Felizberta Vaz garantiu ainda que os "pequenos problemas" que surgiram foram resolvidos. A CNE divulga os resultados esta quarta-feira.
Foto: CNE
Presidente da República
Em declarações aos jornalistas, depois de votar, no domingo, José Mário Vaz garantiu que os observadores estavam "surpresos" pela positiva com a Guiné-Bissau. O Presidente guineense pediu à imprensa para que passasse lá para fora essa "grande imagem" da Guiné-Bissau como um país onde "não há problemas". "Considero a Guiné-Bissau hoje campeã da liberdade", disse.
Foto: Getty Images/AFP/Seyllou
Primeiro-ministro guineense
Também no domingo, o primeiro-ministro guineense disse estar emocionado com a concretização de um processo eleitoral "difícil e intenso", no qual foi "necessária a intervenção da comunidade internacional". Aristides Gomes acrescentou ainda que, apesar das dificuldades, este foi um processo cheio de "pedagogia".
Foto: Präsidentschaft von Guinea-Bissau
Organização das Nações Unidas
David McLachlan-Karr, enviado das Nações Unidas à Guiné-Bissau, tem estado a reportar, com frequência, o ambiente vivido no país nestas eleições, nas redes sociais. Esta segunda-feira, o representante da ONU deu os parabéns à população guineense que, "em todo o país, saiu [às ruas] para votar pacificamente e com muito orgulho cívico".
Foto: DW/B. Darame
Comunidade dos Países de Língua Portuguesa
Também a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), na pessoa de Luiz Villarinho Pedroso, acompanhou de perto a votação. No domingo, dia da eleição, o chefe da missão da CPLP disse que estas eleições foram um "exercício cívico exemplar", que decorreu com a "maior tranquilidade e normalidade". O balanço preliminar do escrutínio será feito ao longo desta terça-feira (12.03).
Foto: DW/N. dos Santos
CEDEAO
À semelhança da ONU e da CPLP, também a CEDEAO deu nota positiva às eleições guineenses. Numa conferência de imprensa, esta segunda-feira (11.03), Kadré Désiré Ouedraogo, chefe da Missão de Observação da CEDEAO, disse que as legislativas no país decorreram "de forma pacífica e transparente". Acrescentou ainda que espera que "todos [os partidos] aceitem os resultados".
Foto: DW/B. Darame
União Africana
Após o encerramento das urnas na Guiné-Bissau, Rafael Branco, chefe da Missão de Observação Eleitoral da União Africana destacou a forma tranquila com que decorreu o processo e salientou a "participação cívica notável".
Foto: DW/Nélio dos Santos
Liga Guineense dos Direitos Humanos
Também as organizações locais fizeram chegar elogios. À semelhança do que foi dito pela CNE, Augusto Mário da Silva, presidente da Liga Guineense dos Direitos Humanos, disse ter havido registo de "algumas falhas", mas "que foram imediatamente supridas". Tirando os atrasos na abertura das urnas em algumas mesas e trocas de cadernos eleitorais, "o processo decorreu de forma regular", disse.
Foto: DW/B. Darame
Sociedade Civil
Por último, a Célula de Monitorização do Processo Eleitoral salientou, esta segunda-feira, que "os eleitores compareceram em massa para exercer o seu direito de voto". Este grupo de monitorização das eleições, composto por 420 pessoas, espalhadas por todo o país, saudou também "a boa presença das forças de segurança nos centros de votação observados".