Debate parlamentar sobre carros de luxo não é para já
Leonel Matias (Maputo)
21 de junho de 2017
A compra de 17 viaturas de luxo continua a agitar a política moçambicana. Bancadas da oposição pediram um debate sobre o assunto, mas não há indicação de que isso possa acontecer nos próximos dias.
Publicidade
Nas ruas, nos cafés, nas redes sociais, é um dos temas de que mais se fala: a compra de 17 carros da marca Mercedes-Benz. As viaturas foram adquiridas para os membros da Comissão Permanente do Parlamento e custaram ao Estado o equivalente a cerca de três milhões e quinhentos mil euros.
É um exagero e até uma ofensa, afirmam vários cidadãos ouvidos pela DW África - sobretudo, porque Moçambique atravessa uma das piores crises económicas e financeiras da sua história, que se agravou em 2016 na sequência da suspensão da ajuda internacional com a descoberta de dívidas milionárias não declaradas contraídas por três empresas com garantias do Estado, sem o conhecimento do Parlamento.
"É aquilo que se chama de luxo na miséria", comenta o cidadão Helénio Ferreira. "O país está aflito, está em crise, e um grupinho usando o nome do povo vai passear em carros de luxo."
A cidadã Hélia Isabel pergunta: "De que vale atribuírem Mercedes a algumas pessoas enquanto outras estão a sofrer problemas de transporte?"
Pedido de debate parlamentarAs bancadas da oposição no Parlamento, da Resistência Nacional Moçambicana (RENAMO) e do Movimento Democrático de Moçambique (MDM), querem que a Comissão Permanente discuta o assunto e negam qualquer envolvimento na decisão de atribuição das viaturas de luxo.
21.06.2017 Moçambique - carros de luxo - MP3-Mono
A DW África apurou que o debate do assunto, a ser realizado na Comissão Permanente, não deverá acontecer antes de julho, uma vez que os deputados encontram-se a trabalhar nos seus círculos eleitorais e aquele órgão não tem nenhuma sessão convocada para os próximos dias.
Entretanto, o relator da bancada do MDM, Venâncio Mondlane, está a recolher assinaturas junto dos deputados para um abaixo-assinado opondo-se às viaturas, devido à crise que o país atravessa. Mas, até agora, a iniciativa só foi apoiada por nove dos 250 deputados.
Mercedes justificam-se?
O deputado António Muchanga, que é igualmente porta-voz da RENAMO, diz que se está a levantar um falso problema em torno do caso das viaturas de luxo: "Não cabe nem à Assembleia da República, nem à presidente do Parlamento [Verónica Macamo] escolher as marcas de viaturas protocolares para o órgão."
Muchanga explica que, depois de mais de 12 anos sem novas viaturas, é "lícito" renovar a frota do Parlamento, "à semelhança do que aconteceu nos outros Ministérios e instituições do Estado." Além disso, acrescenta o deputado, quem decidiu comprar os Mercedes "foi o Governo e não a Assembleia."
"Por que não se questiona as três viaturas que os Juízes Conselheiros têm, que os Ministros têm, e só se questionam as dos deputados?", interroga Muchanga.
No início do mês, o Director Nacional de Orçamento, Rogério Nkomo, considerou igualmente ser "legítimo que os membros da Assembleia da República sejam transportados por carros protocolares daquele nível", à semelhança do que acontece com membros de outros órgãos de soberania do Estado. Mkomo disse ainda que a decisão é anterior à crise que se acentuou em 2016.
País pobre com táxis de luxo
Táxis e autocarros da Mercedes-Benz definem o cenário nas ruas de Bissau. Quase todos os taxistas deste país pobre conduzem viaturas da construtora alemã de carros topo da gama, sobretudo modelos a gasóleo dos anos 80.
Foto: DW/B. Darame
Táxis da Mercedes-Benz por todo o lado em Bissau
Nas estradas da Guiné-Bissau, país situado na África Ocidental, prevalecem carros da marca Mercedes-Benz. Apesar deste ser um dos países mais pobres do mundo, ocupando a 12ª posição a contar do fim no índice de desenvolvimento humano das Nações Unidas, quase todos os taxistas conduzem viaturas da Daimler, construtora alemã de carros topo da gama.
Foto: DW/B. Darame
Modelos resistentes a gasóleo
Os modelos mais resistentes são também os mais procurados. Ao contrário dos modelos modernos, os mais antigos podem ser reparados pelos proprietários e condutores sem conhecimentos de informática. Quase a totalidade dos transportes públicos de Bissau, com os seus 400 000 habitantes, é operada com táxis coletivos e mini-autocarros da marca Mercedes-Benz.
Foto: DW/B. Darame
Amado conduz este Mercedes-Benz desde 1999
Um tio que emigrou para a Alemanha em 1997 enviou este Mercedes para Bafatá, no leste do país, para apoiar a família. Em 1999, o carro foi levado para a capital, Bissau. Desde então serve de ganha-pão ao taxista Amado. As receitas chegam para pagar o almoço e o jantar a toda a família.
Foto: DW/B. Darame
Todos os táxis são táxis coletivos
Tal como todos os taxistas em Bissau, também Amado recolhe sempre vários passageiros que querem ir mais ou menos para o mesmo lado. Os táxis de Bissau estão quase sempre em movimento. Se ainda há um lugar livre, pode-se mandar parar o táxi. Mas o destino deve ser próximo daquele dos restantes passageiros. Também é possível ter o uso exclusivo do táxi, mas é mais caro.
Foto: DW/B. Darame
Painéis dos anos 80
Uma apreciação do interior da viatura revela instrumentos clássicos dos anos 80. Este é o interior de um modelo 190D da série Mercedes-Benz W201. Entre 1982 e 1993 foram produzidos cerca de 1,8 milhões de exemplares deste predecessor da atual classe C. Olhando com atenção deteta-se no lado direito da imagem uma bandeira alemã. Este género de símbolos é muito popular entre os taxistas.
Foto: DW/B. Darame
Oficina da rua
Muitos táxis já têm mais de um milhão de quilómetros de rodagem, e, por isso, sofrem de numerosos defeitos. A reparação torna-se assim num negócio rentável, no qual se especializaram várias oficinas da rua. Sobretudo os jovens aprendem aqui como reparar os modelos da Mercedes-Benz, ocupação que lhes garante o sustento.
Foto: DW/B. Darame
Carros canibalizados
Hoje em dia é fácil obter em Bissau todas as peças sobressalentes dos modelos mais comuns da Mercedes-Benz. Elas não são importadas da Alemanha, mas extraídas dos numerosos táxis cujas carroçarias já não resistem ao uso. As viaturas são canibalizadas e usadas como depósito de peças de reposição. Neste caso foi extraído o bloco completo do motor para ser inserido noutro táxi.
Foto: DW/B. Darame
Investimento conjunto
Sete guineenses juntaram-se para comprar este táxi Mercedes-Benz. Com a matrícula, 42-11-CD, é um dos táxis mais conhecidos da cidade. No fim do mês, o condutor paga o aluguer aos proprietários. Quando o negócio anda de vento em popa, sobra o equivalente a 75 euros para cada um. O que na Guiné-Bissau é uma pequena fortuna. O rendimento médio per capita no país é inferior a 50 euros mensais.
Foto: DW/B. Darame
O modelo para carreiras de longo curso
O modelo 240TD da série 123 foi construído de 1975 a 1986, e é conhecido pelo nome de "sete plass" (sete lugares) na Guiné-Bissau. Este carro é considerado muito resistente e usado, sobretudo, para carreiras de longo curso. Este táxi coletivo faz a carreira de Bissau para Ziguinchor, na Casamansa (Casamance), no vizinho Senegal. A publicidade no para-brisas revela a sua origem.
Foto: DW/B. Darame
Furgonetas da Mercedes para rotas fixas
Enquanto os pequenos táxis coletivos têm rotas flexíveis, as grandes furgonetas da Mercedes-Benz cumprem carreiras fixas. É o caso deste mini-autocarro do tipo 210D ("Mercedes Transporter"), chamado de "toca-toca", que faz a ligação entre o centro da cidade o Aeroporto Internacional Osvaldo Vieira em Bissau, como se pode ler na placa que diz “Aeroporto”.
Foto: DW/B. Darame
Miríade de tipos
Também há vários tipos de mini-autocarros, mas a preferência dos motoristas pelos modelos da Mercedes-Benz é evidente. Os carros desta marca têm a fama de ser resistentes. O furgão do tipo 210D foi construído na fábrica de Bremen, no norte da Alemanha, entre 1977 e 1995. Deste modelo de nome “Bremer Transporter” foram fabricados 970.000 unidades. Hoje ele é construído sob licença na Índia.
Foto: DW/B. Darame
A importação é sempre de segunda mão
Tanto as furgonetas amarelas e azuis que servem de mini-autocarro como os táxis azuis e brancos são geralmente importados em segunda mão. Normalmente os carros oriundos da Europa entram em África via Banjul, cidade portuária na vizinha Gâmbia. Daí seguem via sul do Senegal e norte da Guiné-Bissau para a capital, Bissau. Onde são pintados nas cores típicas.
Foto: DW/B. Darame
Parte integrante do cenário de Bissau
Na imagem, vários táxis pintados em azul e branco seguem numa estrada secundária de terra batida em Bissau. Os táxis da Mercedes-Benz são hoje parte integrante do cenário da capital da Guiné-Bissau. Como as viaturas são muito resistentes e fáceis de reparar, é muito provável que os modelos dos anos 80 e do início da década 90 ainda possam ser admirados por muito tempo nas ruas de Bissau.