Guineenses radicados em Portugal exigem fim das obras que colocam em risco biodiversidade das Lagoas de Cufada, a maior reserva de água doce do país. Governo diz que construção vai avançar.
Publicidade
A maioria dos guineenses radicados em Portugal não quer ver erguida uma projetada central termoelétrica dentro da área protegida do Parque Natural das Lagoas de Cufada, situado na região de Quinará, no sul da Guiné-Bissau.
O sentimento é de "muita indignação", como constatou a DW África durante uma conferência realizada na sexta-feira (10.02), na Fundação Calouste Gulbenkian, em Lisboa, para debater alternativas e travar a construção, que viola, entre outras, as leis de proteção das áreas protegidas e da terra.
Peça para online - Lagos de Cufada em risco - MP3-Stereo
O parque que concentra a maior reserva de água doce da Guiné-Bissau abrange ecossistemas de zonas húmidas e de florestas de interesse patrimonial excecional, além de ter uma zona de pesca como único meio de subsistência da população.
Segundo o ativista e sociólogo guineense, Miguel de Barros, os prejuízos ambientais serão enormes se o investimento avançar. O projeto patrocinado pelo Governo tinha de obedecer à realização de estudos prévios de impacto ambiental, e de viabilidade económica e financeira, mas nada disso foi feito.
"Sobretudo, era necessário transparência em termos do que é o investimento em si e como obedece, por exemplo, o código de investimento público, a lei da terra, a lei de avaliação de impacto ambiental e o decreto da criação de área protegida, que salvaguarda a não concessão de terras no interior do Parque de Lagoas de Cufada", explica.
Miguel de Barros, que também é diretor-executivo da ONG Tiniguena, ressalta que o investimento tem interesses obscuros e não traz vantagens para a população.
"Como é que uma central a gasóleo para um país que não é produtor de petróleo tem capacidade de fornecer energia, independentemente do tipo de impacto – emissão de gases, do barulho e do impacto no lençol freático? Qual é a capacidade de compra de energia que as populações têm em relação ao preço e nível de investimento feito ao repôr a oferta que depois vão fazer?", questiona.
A construção da central financiada pela Índia e orçada em 18,7 milhões de euros prevê a desflorestação de mais de nove hectares de terra. Especialistas advertem que a intervenção humana pode contaminar a água e o solo e afetar a rica biodiversidade da região.
"Para além de chimpazés, existem outros mamíferos. Existem outros grandes animais, mas que já vão desaparecendo. Ocasionalmente, ainda se observa um búfalo, um elefante, mas esses animais já são muito ameaçados", explica o biológo português, Paulo Catry, investigador do ISPA – Instituto Universitário de Lisboa.
Governo diz que obras vão avançar
Em declarações recentes à agência Lusa, o ministro da Energia, Florentino Pereira, garantiu que a construção da central é para avançar, mesmo não tendo sido feito estudos de impacto ambiental. Ele disse que se as obras que vão garantir fornecimento de energia no sul do país pararem os custos serão "incalculáveis". Pereira, no entanto, afirmou que o lençol freático não será afetado e que não houve grande desmatação.
Um dos opositores à ideia da central térmica, o economista guineense Eduardo Fernandes, considera, por sua vez, que conservar a natureza traz ganhos.
"Não desaparece um determinado número de espécies, vamos ter a garantia de água doce na região e as populações vão continuar a ter alimentos e uma fauna diversificada. Portanto, há ganhos a longo prazo maior do que o imediatismo de uma central elétrica", argumentou.
Os defensores do Parque Natural das Lagoas de Cufada querem alternativas sustentáveis e pedem ao Governo para parar as obras, fazer estudos de impacto e tornar público o acordo estabelecido com a empresa indiana. Além disso, querem que a produção energética seja de energia limpa fotovoltáica, para evitar o desbravamento da floresta.
A diáspora, na opinião de Miguel de Barros, pode desempenhar um papel importante de alerta aos atores políticos e da própria comunidade internacional, na lógica de exigir responsabilidades ao Estado guineense relativamente à preservação de espaços e de recursos produtivos indispensáveis à estratégia de desenvolvimento sustentável da Guiné-Bissau.
Nigéria: Auto-estrada no meio da floresta?
A floresta Ekuri, no sul da Nigéria, uma das últimas florestas tropicais intactas do país, está em perigo. O governo local quer construir uma estrada de seis faixas a atravessar a vegetação. A população está indignada.
Foto: DW/A. Kriesch
Protesto no paraíso
Até agora, nenhum meio de comunicação internacional veio até esta pequena aldeia, na floresta Ekuri. "É a primeira vez que alguém nos ouve", diz um dos habitantes que espontaneamente organizaram um protesto. O governo do estado de Cross River, no sul da Nigéria, quer construir uma auto-estrada gigante, no coração da floresta. Estes manifestantes temem perder a casa e os meios de subsistência.
Foto: DW/J. P. Scholz
Sem luz e sem estradas
Aqui, muitas pessoas sentem que foram deixadas ao abandono: Foram elas que tiveram de construir as pontes que dão acesso à aldeia. Não há água canalizada, nem eletricidade. Antes das últimas eleições, houve um político que os visitou - de helicóptero. Os habitantes dizem que ele ofereceu dinheiro e fez várias promessas. Mas, depois das eleições, nunca mais apareceu.
Foto: DW/J. P. Scholz
Terras confiscadas
Os habitantes receberam a notícia no início do ano. Ao ler o jornal, descobriram que não só o governo regional planeava construir uma auto-estrada no estado de Cross River, como também expropriar todas as terras num perímetro de 10 quilómetros em redor da nova rodovia.
Foto: DW/J. P. Scholz
A primeira super-estrada da Nigéria
A estrada deverá ligar um novo porto em Calabar, a capital do estado de Cross River, ao norte da Nigéria - o plano é construir uma das estradas mais modernas de África, com 260 quilómetros, seis faixas e internet de alta velocidade para todos os condutores. O projeto custará 800 mil milhões de nairas, quase quatro mil milhões de euros. Não se sabe ainda ao certo como será financiada.
Destruindo o verde da floresta
Algumas árvores começaram a ser cortadas mesmo sem se saber como o projeto iria ser pago. O governo local nem esperou pelo estudo de impacto ambiental, exigido por lei. Entretanto, o estudo já deu entrada, mas não cumpre as normas internacionais, informa o Ministério nigeriano do Ambiente.
Foto: DW/A. Kriesch
Bulldozers à espera
O Ministério ordenou que se parasse de imediato o abate de árvores antes de receber o estudo de impacto ambiental e depois dos protestos de ambientalistas e habitantes. Os bulldozers estão parados na floresta, à espera de "luz verde".
Foto: DW/A. Kriesch
Natureza ímpar
Na floresta Ekuri habitam animais ameaçados de extinção, como o mandril ou o gorila de Cross River. Há aqui mais de 1.500 espécies de plantas. Esta é uma das florestas tropicais mais diversas do planeta.
Foto: DW/A. Kriesch
"Estão a esconder alguma coisa"
Odigha Odigha é ex-presidente da Comissão Florestal de Cross River e está agora a tentar travar a construção da auto-estrada, com a organização "Coligação pelo Meio Ambiente" - "Ao todo, são 520.000 hectares de terras que serão nacionalizadas, 25% da área deste estado", diz Odigha. "Ainda ninguém nos disse por que estão interessados numa área tão grande - estão a esconder alguma coisa."
Foto: DW/A. Kriesch
Comércio de madeira em vez de desenvolvimento?
Alguns ativistas e habitantes suspeitam que, além da construção da estrada, há também interesse em comercializar a valiosa madeira da floresta. Por isso é que não se expande a estrada principal que já existe, dizem. A nova estrada gigante serviria, assim, como pretexto para poder cortar a madeira e vendê-la ao exterior, a preços inflacionados.
Foto: DW/A. Kriesch
Governo local desmente
A ministra da Informação de Cross River nega. "Vamos plantar duas árvores por cada árvore cortada", diz Rosemary Archibong. Mas continua a não ser claro por que é necessário nacionalizar 10 quilómetros de cada lado da rodovia. "As pessoas deverão beneficiar do desenvolvimento ao longo da estrada, por exemplo através da agricultura", responde Archibong. "Mas esse tema ainda vai ser debatido."
Foto: DW/A. Kriesch
Habitantes continuam protesto
Os habitantes da floresta Ekuri queixam-se que ninguém falou com eles. Margret Ikimu está desiludida com a política: "Primeiro, deviam melhorar esta estrada decrépita que passa por aqui", diz. "O governo regional já está há um ano no poder e ainda não vimos mudanças. E agora querem levar o único que nos resta, a floresta."