É uma questão que vem muitas vezes à tona em Moçambique: afinal, as manifestações e reuniões dos partidos devem ou não ser autorizadas pelas autoridades? RENAMO em Cabo Delgado diz que costuma enfrentar vários problemas.
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O delegado em Cabo Delgado do maior partido da oposição em Moçambique, a Resistência Nacional Moçambicana (RENAMO), acusa as autoridades locais de regularmente tentarem impedir as atividades do partido na província.
Manuel Alex aponta vários casos de repressão das atividades da RENAMO, ocorridos nos últimos meses: "A 14 de junho, no distrito de Quissanga, tivemos um comício que seria orientado pelo chefe de mobilização provincial, e apareceu em plena reunião a força da polícia a impedir a reunião, alegadamente porque não houve despacho", afirma em entrevista à DW.
Partidos moçambicanos podem manifestar-se sem autorização?
"Em Metuge, aconteceu o mesmo cenário [a 20.07]: um chefe da localidade tentou impedir uma reunião, sem nenhuma alegação. E registámos os mesmos acontecimentos em Namuno. A própria administradora diz que não se pode realizar uma reunião no local público da sede, alegadamente porque ela não tinha autorizado", acrescenta Alex.
Em fevereiro, apoiantes da RENAMO tentaram marchar na cidade de Pemba, para celebrar a eleição de Ossufo Momade como presidente do partido, mas também foram impedidos pelas autoridades policiais.
Questionada pela DW, a polícia não quis gravar qualquer entrevista. Fonte do Comando Provincial da Polícia da República de Moçambique (PRM) em Cabo Delgado referiu apenas que não compete à corporação proibir reuniões ou manifestações - embora, segundo a polícia, essas manifestações devam ser autorizadas por entidades competentes.
O que diz a Lei?
A Constituição da República de Moçambique prevê, no artigo 51, que, "todos os cidadãos têm direito à liberdade de reunião e manifestação". E a lei número 9/91 de 18 de julho regula este direito: "A manifestação não carece de qualquer autorização nos termos da lei. Todos os cidadãos podem, de forma pacífica e livre, exercer o seu direito de reunião e manifestação sem que precisem de uma autorização", explica o jurista António Júnior.
No entanto, é preciso informar as autoridades de que uma reunião ou manifestação vai ter lugar, refere o jurista Arlindo Muririua. "Em princípio, devem indicar o dia, o trajeto que vão seguir, escrever para os comandos da PRM que uma manifestação vai ter lugar - não para ser reprimida, mas para a que a polícia possa garantir a segurança da mesma", diz.
Segundo a lei, só são proibidas manifestações que atentem contra a lei, a moral, a ordem e a tranquilidade públicas - ou que possam "ofender a honra e consideração devidas ao Chefe de Estado e aos titulares dos órgãos do poder do Estado, sem prejuízo do direito à crítica".
O jurista Tomás Vieira Mário é peremptório: "Qualquer bloqueio à manifestação deve ser fundamentado. Por exemplo, por razões de segurança. Exemplo: 'hoje na cidade haverá obras públicas na estrada e não há condições para vocês se manifestarem'. Não pode haver outra razão que não seja essa."
RENAMO: Autoridades desconhecem a lei
Para o delegado político provincial da RENAMO em Cabo Delgado, Manuel Alex, as autoridades têm impedido as atividades do partido por puro desconhecimento da lei.
"As instâncias [de direito] devem capacitar e dar melhores informações, porque a lei está clara e todos temos de a cumprir", sugere Alex.
20 Anos de Paz em Moçambique: Uma viagem
A 4 de outubro de 1992, FRELIMO e RENAMO assinaram o Acordo Geral de Paz, pondo fim a 16 anos de guerra civil em Moçambique. Apesar da paz, a guerra civil continua a marcar a vida de muitos moçambicanos.
Foto: Marta Barroso
A guerra presente todos os dias
A 4 de outubro de 1992, FRELIMO e RENAMO assinaram o Acordo Geral de Paz, pondo fim a 16 anos de guerra civil em Moçambique. Apesar da paz, a guerra civil continua a marcar a vida de muitos moçambicanos. Joula estava grávida de oito meses quando uma mina anti-pessoal lhe arrancou um pé em 1991. Na noite anterior, a RENAMO tinha atacado a aldeia e plantado minas em redor.
Foto: Marta Barroso
De armas a enxadas... ou cadeiras
Desde 1996, o projeto "Armas em Enxadas" dá um novo destino ao material bélico que destruiu milhares de vidas durante a guerra civil. O objetivo da iniciativa, lançada pelo Conselho Cristão de Moçambique, é criar, com as armas, obras de arte com mensagens de paz. Muitas peças foram encontradas pelo país, outras foram recolhidas a privados.
Foto: Marta Barroso
Ataques inesperados
São as mesmas armas que há 20 anos eram usadas para atacar seres humanos como estes refugiados em Chamanculo, perto da capital, Maputo, em 1992. Chamanculo nunca recuperou da chegada de milhares de refugiados da guerra civil. Ainda hoje, é um bairro pobre. Foi aqui que nasceram figuras ilustres do país como Maria de Lurdes Mutola.
Foto: DW/Cristina Krippahl
Ruas desertas em Maputo
A guerra, que se arrastou por 16 anos, atrasou o desenvolvimento do país. Também a vida social sofreu, até mesmo na capital. Engarrafamentos eram, durante a guerra e nos primeiros anos seguintes, algo raro como se pode ver nesta fotografia do centro de Maputo de 1992.
Foto: DW/Cristina Krippahl
Filhos da guerra
Em 1990, Moçambique era considerado o país mais pobre do mundo. Em 2011, ocupava o lugar 184 entre 187 Estados no Índice de Desenvolvimento Humano do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, PNUD. 20 anos depois de assinada a paz, os moçambicanos continuam a viver, em média, 50 anos.
Foto: DW/Cristina Krippahl
Filhos da paz
20 anos depois do Acordo Geral de Paz, ainda há muito que fazer no combate à pobreza em Moçambique. As províncias do Niassa, de Maputo, Cabo Delgado e Tete (na imagem) são, segundo o Programa da ONU para o Desenvolvimento, PNUD, as que têm maior incidência de pobreza no país.
Foto: Marta Barroso
Casa de Espera
Iniciativas como esta na aldeia de Vinho, no Parque Nacional da Gorongosa, província de Sofala, contribuem para diminuir a mortalidade infantil e materna. Atualmente, em Moçambique cerca de 500 mães morrem por cada 100 mil crianças nascidas vivas. Para evitar que isso aconteça na aldeia de Vinho, a Casa de Espera assiste as mulheres grávidas das redondezas na preparação dos partos.
Foto: Marta Barroso
Economia dominada por megaprojetos
A paz possibilitou megaprojetos, como o da exploração de carvão em Moatize, Tete. De futuro, a esperança é de que os rendimentos destes projetos beneficiem mais a população. Devido aos incentivos fiscais de que gozam as multinacionais ligadas a eles, o Estado moçambicano deixa de ganhar mais de 200 milhões de dólares por ano, segundo o Instituto de Estudos Sociais e Económicos (IESE).
Foto: Marta Barroso
Carvão, a euforia de Tete
74 toneladas de carvão já estão carregadas nesta transportadora que pode levar até 400 toneladas. O carvão da província central de Tete tem vindo a atrair investidores nacionais e internacionais à procura do "El Dorado" que tem limitado a diversificação da economia nacional na segunda década de paz em Moçambique.
Foto: Marta Barroso
Cahora Bassa...
Durante a guerra civil, as linhas de transmissão de Cahora Bassa foram alvo de ataques da RENAMO. Hoje, a barragem funciona em pleno. Cahora Bassa tem uma capacidade instalada de 2.075 megawatts, a maior parte da energia é exportada para os países da região: 70% para a África do Sul e 5% para o Zimbabué. Apenas um quarto da eletricidade aqui produzida é consumida em Moçambique.
Foto: DW/M. Barroso
... um elefante branco para esta área do país?
Ainda há poucas casas em redor de Cahora Bassa com acesso regular à eletricidade. Para o economista moçambicano Carlos Castel-Branco do IESE, dever-se-iam estender as bases do desenvolvimento do país às aldeias e vilas em torno da barragem para que também aqui a vida económica se transformasse num elemento de estímulo para o investimento.
Foto: Marta Barroso
Gentes ligadas
A reabilitação das infraestruturas permite agora uma maior mobilidade e fomenta o comércio interno. A linha férrea de Sena liga a província de Tete, no interior de Moçambique, à cidade portuária da Beira. No tempo da guerra civil, foi encerrada e acabou por ser completamente destruída. Nos últimos anos, o corredor ferroviário foi reabilitado para escoar sobretudo o carvão da região de Tete.
Foto: Marta Barroso
Gentes apertadas
O comboio é um dos meios de transporte mais baratos em Moçambique. Em fevereiro de 2012, a Linha de Sena abriu a passageiros em toda a sua extensão. A reconstrução foi feita por troços e acabou por tomar muito mais tempo que o previsto, porque o consórcio indiano responsável pelas obras não cumpriu diversos prazos. Grande parte do dinheiro veio do Banco Mundial.
Foto: Marta Barroso
Há esperança em Moçambique
Idalina Melesse viajou de comboio pela primeira vez em 2012. Durante a guerra civil, os ataques impediram-na de se mover dentro do país. Desde então e até à reabertura da Linha de Sena, não tinha tido dinheiro para longas viagens. A Linha de Sena e outras infraestruturas não só unem moçambicanos, mas devolvem-lhes a liberdade de movimento e a facilidade de comunicação confiscadas pela guerra.