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"Paz política podre" na Guiné-Bissau

Maria João Pinto
21 de novembro de 2016

Diretor do Instituto Português de Relações Internacionais e de Segurança prevê "mais do mesmo" após nomeação do primeiro-ministro Umaro Sissoco e defende que eleições são a única solução para a crise guineense.

Guinea-Bissau Umaro Sissoco und José Mário Vaz
Primeiro-ministro Umaro Sissoco (esq.) e Presidente José Mário VazFoto: DW/B. Darame

Umaro Sissoco Embaló foi nomeado pelo Presidente guineense, José Mário Vaz, para liderar o quinto governo da legislatura iniciada em 2014, marcada por uma forte instabilidade política.

A nomeação do general na reserva das Forças Armadas, de 44 anos, surge depois de os dirigentes guineenses terem assinado em outubro o Acordo de Conacri, um entendimento que prevê a criação de um Governo com todos os partidos do Parlamento para durar até ao final da legislatura. O acordo foi alcançado sob mediação da Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO). 

Paulo Gorjão, diretor do IPRISFoto: DW/Joao Carlos

Umaro Sissoco promete fazer tudo ”para acabar com as querelas” entre as forças políticas. No entanto, continua a faltar consenso. O Partido Africano da Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC), que venceu as eleições de 2014, já declarou que rejeita a escolha do novo primeiro-ministro, que considera um "sinal da implantação de uma ditadura”. O partido União para Mudança (UM) também já se demarcou do próximo Governo, por considerar que a nomeação de Sissoco é uma decisão unilateral do Presidente guineense.

O diretor do Instituto Português de Relações Internacionais e de Segurança (IPRIS), Paulo Gorjão, fala numa "paz política podre” na Guiné-Bissau e defende que a realização de eleições é a única solução para o país.

DW África: O que esperar do novo líder do Executivo guineense?

Paulo Gorjão (PG): Penso que se pode esperar mais do mesmo. Mais um ciclo, a continuidade da instabilidade política, na medida em que não reúne nenhum consenso. Era isso que se exigia no acordo pré-definido e esta solução não tem qualquer apoio do PAIGC. Não vejo que estejam minimamente restauradas as condições para haver estabilidade política na Guiné-Bissau.

DW África: Sissoco anunciou que vai encontrar-se com todos os partidos para "acabar com as querelas políticas”. Acha que será capaz de o fazer?

PG: Acho que não. Evidentemente, terá reuniões com os diversos partidos políticos, só que, muito simplesmente, a sua nomeação não reúne o consenso desses mesmos partidos. Em circunstância alguma se pode esperar uma cooperação franca e leal das forças políticas. [Umaro Sissoco] estará em larga medida dependente do Presidente da República. É essa a sua lealdade, a sua legitimidade. Não espero que o PAIGC venha a aceitar estabelecer uma relação de cooperação com o novo primeiro-ministro. 

DW África: Já o Presidente da Assembleia Nacional Popular (ANP), Cipriano Cassamá, prometeu total colaboração com o novo primeiro-ministro e anunciou que os trabalhos no Parlamento devem recomeçar esta semana. Neste cenário, acha que é possível?

PG: Não sei se é possível esta semana, mas essa declaração corresponde ao que era expectável que ele, formal e institucionalmente, fizesse. Não me surpreende que o tenha dito nestes termos e não me surpreende que, eventualmente, a ANP recomece os seus trabalhos. No entanto, não creio que estejam reunidas as condições para que a ANP possa trabalhar de forma substantiva. Tomo isso como uma declaração de intenções.

Entrevista Paulo Gorjão OL - MP3-Mono

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DW África: Quais devem ser então os próximos passos?

PG: Há muito tempo que defendo que este impasse só tem uma solução: eleições. Independentemente de serem eleições antecipadas ou de ocorrerem apenas em 2018, aquilo a que vamos assistir é o protelar de uma paz política podre. Não vejo que haja alternativa a este imbróglio que não seja a convocação de eleições para que se possa encontrar uma nova correlação de forças entre a Presidência, a ANP e o PAIGC, que permita retomar um caminho mínimo de estabilidade. Deste ponto de vista, esta solução [a nomeação de Umaro Sissoco] vai exatamente no sentido contrário. Corresponde ao adiamento de uma solução eficaz para a situação em que a Guiné-Bissau se encontra.

DW África: Com todos estes problemas internos, essa solução tem de envolver a comunidade internacional?

PG: Quanto mais abrangente e inclusivo for o envolvimento da comunidade internacional, melhor será para a Guiné-Bissau. Há algum tempo que a CEDEAO assumiu as rédeas da situação, sem que se tenha encontrado qualquer solução minimamente estável. Penso que a CEDEAO tem de aumentar os seus esforços. Esta solução vai precisamente contra o que havia sido acordado na última tentativa de mediação entre as partes, com os intervenientes da CEDEAO. A própria Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) tem de ser chamada a ter um papel que não tem tido nos últimos dois anos. Em última instância, a própria Organização das Nações Unidas. Já vimos e está mais do que confirmado que os intervenientes na Guiné-Bissau, por si só, não conseguem encontrar uma solução.

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