O ativista trabalhou muitos anos na direção do Comité Coordenador Moçambique-Alemanha (KKM) e investiu em projetos de diálogo cultural entre artistas moçambicanos e alemães.
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Os mais cem dias de prisão na Turquia acabaram para o ativista de direitos humanos alemão, Peter Steudtner, considerado um alemão de "coração moçambicano". Nos anos 90, Steudtner integrou um projeto de reintegração social de ex-crianças soldados na Ilha de Moçambique. Nos anos seguintes, ele também trabalhou como fotógrafo em Moçambique.
Nas primeiras horas desta quinta-feira (26.10), o berlinense de 46 anos foi libertado da prisão turca sob fiança, junto com outros sete colegas, também acusados por Ankara de apoiar um grupo terrorista armado.
Ativista alemão de "coração moçambicano" solto na Turquia
Após ser solto da prisão de Silivri, nos arredores de Instambul, o ativista alemão Peter Steudtner conversou com a comunicação social, que o aguardava do lado de fora. "Estamos todos felizes com a saída. Aliviados por poder voltar para as nossas famílias, para os nossos amigos. Temos uma gratidão imensa com tantas pessoas: os que nos ajudaram com as questões legais, os que lutaram por nós a nível diplomático e os que, por solidariedade, estiveram ao nosso lado", disse bastante emocionado.
Solidariedade e amizade
Sempre às 18 horas locais da Alemanha, durante todos os dias desses quase quatro meses do cárcere de Steudtner, a paróquia Gethsemane, que ele frequenta com sua família em Berlim, cantava várias canções em vigília pelos presos na Turquia. À mesma hora, Steudtner cantava as mesmas canções em sua cela.
Durante a última reunião na cidade alemã de Bielefeld, o Comité Coordenador Moçambique-Alemanha (KKM) também cantou a mesma música para apoiar os 11 ativistas de direitos humanos aprisionados.
Tabea Benisch, gerente do KKM, organização não-governamental em que Steudtner foi muito ativo, contou que, enquanto viveu em Moçambique, Steudtner estava sempre pronto para conversar, não importava o quão ocupado ele estivesse. "Ele é muito comprometido politicamente com as pessoas em Moçambique. Steudtner é uma pessoa muito importante para nós da KKM," revelou Benisch.
Jornada de vida
Ativo durante muitos anos na direção do KKM, o pacifista investiu muito em projetos de diálogo cultural entre artistas moçambicanos e alemães. Ele também trabalhou na ONG alemã Inkota-Netzwerk com projetos de desenvolvimento em Moçambique.
Outro projeto importante de Steudtner é a plataforma "Reencontro familiar". O blog "Reencontro Familiar" foi feito por ele e pelo alemão-moçambicano, Manuel Siegert, para reunir os filhos de moçambicanos e alemães radicados na Alemanha que perderam o contato com a família em Moçambique.
Tabea Benisch disse que tudo começou quando as pessoas procuraram Steudtner com o pedido de reencontrar seus familiares, fosse em Moçambique ou na Alemanha. "Então, Peter começou a levantar seus contatos nos dois países com o objetivo de reunir essas pessoas. Ele acompanhou pessoalmente duas crianças que cresceram na Alemanha em uma viagem a Moçambique para reencontrarem seus pais", lembra.
Maratona na prisão
Desde a prisão, Steudtner, cuja companheira de vida e os dois filhos vivem em Berlim, escreveu quatro cartas públicas. Nelas, ele descreveu sua vida sob custódia. A atitude dos funcionários turcos era respeitosa, a comida era boa e adequada. Para manter-se em forma, Steudtner corria numa área de 28 metros quadrados. No mesmo dia em que a maratona de Berlim aconteceu, o "coração moçambicano” também correu. Mas, devido a limitações de espaço, apenas 7 metros, ele cumpriu uma meia maratona. Foram 22 km correndo em círculos.
Liberdade provisória
Nesta quinta-feira (26.10), Steudtner pôde voltar para a família em Berlim. Também foram libertados, provisoriamente, o especialista em Tecnologia da Informação sueco, Ali Gharavi, e outros seis ativistas. No entanto, eles foram libertados sob fiança. O processo contra Steudtner e seus colegas terá continuidade no dia 22 de novembro. Todos os 11 ativistas foram presos no dia 5 de julho na Turquia, enquanto faziam um curso de segurança informática e segurança de dados. Também a diretora da Amnistia Internacional da Turquia, Idil Eser, foi libertada na noite anterior.
Alemanha e Turquia
A prisão do ativista piorou a relação já conturbada entre a Turquia e a Alemanha. O Governo alemão considerou um absurdo a acusação de que Steudtner apoiava uma milícia terrorista. À época da prisão, em julho deste ano, o chefe da diplomacia alemã, Sigmar Gabriel, decidiu interromper as férias para manter consultas urgentes sobre "as ações e medidas a tomar devido à intensificação dramática das ações [de repressão] turcas".
Sigmar Gabriel disse então que era necessário que o Governo turco compreendesse de imediato a indignação do Governo alemão. "As nossas exigências são muito claras em relação ao caso de Peter Steudtner e, desta vez, sem derivações diplomáticas", declarou.
Ao saber da libertação do ativista, o ministro dos Negócios Estrangeiros saudou a decisão do tribunal turco. "Estou satisfeito que o tribunal de Istambul tenha retirado a acusação contra Peter Steudtner. Este é um sinal encorajador, um primeiro passo", comentou o ministro.
20 Anos de Paz em Moçambique: Uma viagem
A 4 de outubro de 1992, FRELIMO e RENAMO assinaram o Acordo Geral de Paz, pondo fim a 16 anos de guerra civil em Moçambique. Apesar da paz, a guerra civil continua a marcar a vida de muitos moçambicanos.
Foto: Marta Barroso
A guerra presente todos os dias
A 4 de outubro de 1992, FRELIMO e RENAMO assinaram o Acordo Geral de Paz, pondo fim a 16 anos de guerra civil em Moçambique. Apesar da paz, a guerra civil continua a marcar a vida de muitos moçambicanos. Joula estava grávida de oito meses quando uma mina anti-pessoal lhe arrancou um pé em 1991. Na noite anterior, a RENAMO tinha atacado a aldeia e plantado minas em redor.
Foto: Marta Barroso
De armas a enxadas... ou cadeiras
Desde 1996, o projeto "Armas em Enxadas" dá um novo destino ao material bélico que destruiu milhares de vidas durante a guerra civil. O objetivo da iniciativa, lançada pelo Conselho Cristão de Moçambique, é criar, com as armas, obras de arte com mensagens de paz. Muitas peças foram encontradas pelo país, outras foram recolhidas a privados.
Foto: Marta Barroso
Ataques inesperados
São as mesmas armas que há 20 anos eram usadas para atacar seres humanos como estes refugiados em Chamanculo, perto da capital, Maputo, em 1992. Chamanculo nunca recuperou da chegada de milhares de refugiados da guerra civil. Ainda hoje, é um bairro pobre. Foi aqui que nasceram figuras ilustres do país como Maria de Lurdes Mutola.
Foto: DW/Cristina Krippahl
Ruas desertas em Maputo
A guerra, que se arrastou por 16 anos, atrasou o desenvolvimento do país. Também a vida social sofreu, até mesmo na capital. Engarrafamentos eram, durante a guerra e nos primeiros anos seguintes, algo raro como se pode ver nesta fotografia do centro de Maputo de 1992.
Foto: DW/Cristina Krippahl
Filhos da guerra
Em 1990, Moçambique era considerado o país mais pobre do mundo. Em 2011, ocupava o lugar 184 entre 187 Estados no Índice de Desenvolvimento Humano do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, PNUD. 20 anos depois de assinada a paz, os moçambicanos continuam a viver, em média, 50 anos.
Foto: DW/Cristina Krippahl
Filhos da paz
20 anos depois do Acordo Geral de Paz, ainda há muito que fazer no combate à pobreza em Moçambique. As províncias do Niassa, de Maputo, Cabo Delgado e Tete (na imagem) são, segundo o Programa da ONU para o Desenvolvimento, PNUD, as que têm maior incidência de pobreza no país.
Foto: Marta Barroso
Casa de Espera
Iniciativas como esta na aldeia de Vinho, no Parque Nacional da Gorongosa, província de Sofala, contribuem para diminuir a mortalidade infantil e materna. Atualmente, em Moçambique cerca de 500 mães morrem por cada 100 mil crianças nascidas vivas. Para evitar que isso aconteça na aldeia de Vinho, a Casa de Espera assiste as mulheres grávidas das redondezas na preparação dos partos.
Foto: Marta Barroso
Economia dominada por megaprojetos
A paz possibilitou megaprojetos, como o da exploração de carvão em Moatize, Tete. De futuro, a esperança é de que os rendimentos destes projetos beneficiem mais a população. Devido aos incentivos fiscais de que gozam as multinacionais ligadas a eles, o Estado moçambicano deixa de ganhar mais de 200 milhões de dólares por ano, segundo o Instituto de Estudos Sociais e Económicos (IESE).
Foto: Marta Barroso
Carvão, a euforia de Tete
74 toneladas de carvão já estão carregadas nesta transportadora que pode levar até 400 toneladas. O carvão da província central de Tete tem vindo a atrair investidores nacionais e internacionais à procura do "El Dorado" que tem limitado a diversificação da economia nacional na segunda década de paz em Moçambique.
Foto: Marta Barroso
Cahora Bassa...
Durante a guerra civil, as linhas de transmissão de Cahora Bassa foram alvo de ataques da RENAMO. Hoje, a barragem funciona em pleno. Cahora Bassa tem uma capacidade instalada de 2.075 megawatts, a maior parte da energia é exportada para os países da região: 70% para a África do Sul e 5% para o Zimbabué. Apenas um quarto da eletricidade aqui produzida é consumida em Moçambique.
Foto: DW/M. Barroso
... um elefante branco para esta área do país?
Ainda há poucas casas em redor de Cahora Bassa com acesso regular à eletricidade. Para o economista moçambicano Carlos Castel-Branco do IESE, dever-se-iam estender as bases do desenvolvimento do país às aldeias e vilas em torno da barragem para que também aqui a vida económica se transformasse num elemento de estímulo para o investimento.
Foto: Marta Barroso
Gentes ligadas
A reabilitação das infraestruturas permite agora uma maior mobilidade e fomenta o comércio interno. A linha férrea de Sena liga a província de Tete, no interior de Moçambique, à cidade portuária da Beira. No tempo da guerra civil, foi encerrada e acabou por ser completamente destruída. Nos últimos anos, o corredor ferroviário foi reabilitado para escoar sobretudo o carvão da região de Tete.
Foto: Marta Barroso
Gentes apertadas
O comboio é um dos meios de transporte mais baratos em Moçambique. Em fevereiro de 2012, a Linha de Sena abriu a passageiros em toda a sua extensão. A reconstrução foi feita por troços e acabou por tomar muito mais tempo que o previsto, porque o consórcio indiano responsável pelas obras não cumpriu diversos prazos. Grande parte do dinheiro veio do Banco Mundial.
Foto: Marta Barroso
Há esperança em Moçambique
Idalina Melesse viajou de comboio pela primeira vez em 2012. Durante a guerra civil, os ataques impediram-na de se mover dentro do país. Desde então e até à reabertura da Linha de Sena, não tinha tido dinheiro para longas viagens. A Linha de Sena e outras infraestruturas não só unem moçambicanos, mas devolvem-lhes a liberdade de movimento e a facilidade de comunicação confiscadas pela guerra.