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"Pobre, rica Angola": a imagem do país em vésperas de eleições

António Cascais25 de agosto de 2012

Como é que os media na Europa - e na Alemanha - acompanham a "realidade" angolana? Os temas em destaque são a má distribuição das riquezas do país e a repressão dos movimentos contestatários da sociedade civil.

Angola rica, Angola pobre - Angola país de Contrastes. Na foto: praia de LuandaFoto: AP

Aproxima-se, a passos largos, o dia 31 de agosto, dia das eleições angolanas. O povo vai eleger os seus representantes na Assembleia Nacional e também o Presidente e Vice-Presidente da República. Um dos temas que dominam a campanha eleitoral é a deficitária distribuição dos recursos, num do países potencialmente mais ricos do mundo. Os observadores internacionais - e também os alemães - não deixam de salientar o abismal contraste entre a riqueza do presidente e dos que lhe são próximos, e a miséria e as carências a que está sujeito o cidadão comum angolano. Questionam, nomeadamente: Num país riquíssimo em petróleo e noutros recursos, como é possível haver tantas carências?

País rico, população miserável


Johannes Beck, chefe da redação em língua portuguesa da DW, numa das suas últimas reportagens, escolheu incluir a música do Raper MCK para descrever o estado de espírito de muitos angolanos, sobretudo dos mais jovens, que sentem um enorme amargo devido à má distrubuição das riquezas geradas pelo petróleo, recurso que - afinal - é de todos os angolanos e não deveria beneficiar apenas alguns.

Na perspetiva europeia e alemã Angola dispõe de excelentes condições para erradicar a pobreza no seu território: Johannes Beck recorda que Angola continua a registar um dos maiores índices de crescimento económico do mundo, crescimento esse que chegou a atingir níveis recorde de mais de 20 por cento, entre 2005 e 2007.

As exportações de Angola dependem quase exlusivamente do petróleoFoto: AP

MCK: As riquezas beneficiam apenas uma dúzia de angolanos

Em entrevista à DW África o músico MCK queixa-se de que o crescimento do PIB angolano "beneficia apenas uma dúzia de angolanos". MCK salienta que "a única coisa que está à vista são algumas construções, o crescimento do betão."

De facto, não passa despercebido na Europa que Luanda, a capital angolana, é uma espécie de "eldorado" para empresas de construção civil portuguesas, brasileiras e chinesas. Constróiem-se novas estradas e auto-estradas e linhas de caminhos de ferro. Cresce a procura de novos escritórios e apartamentos.

O petróleo é - por assim dizer - o "motor" da economia angolana. O que muitos aqui na Europa ainda não registaram é o facto de Angola ser - neste momento o segundo maior exportador de crude de todo o continente africano, depois da Nigéria, lembra o Johannes Beck da DW. Por outro lado isso também significa que Angola depende demasiado do petróleo. 98 por cento das exportações angolanas baseiam-se precisamento nesse produto.

Acresce que são poucos os angolanos que - mais uma vez - beneficiam do boom. A grande maioria continua a viver em musseques, sem condições mínimas; sem eletricidade pública, sem água e sem saneamento. A taxa de mortalidade infantil continua a ser uma das mais elevadas de todo o mundo: Uma em seis crianças angolanas morre antes de atingir a idade de cinco anos. Um valor três vezes pior do que - por exemplo - o da Namíbia, país vizinho.

"Rapper" MCK, uma das vozes críticas de AngolaFoto: MCK

Agualusa: Injustiça pode provocar explosão social

O escritor José Eduardo Agualusa confirma que "Angola é provavelmente o país onde o fosso social é maior em todo o mundo." Em entrevista à DW o escritor salienta ainda que Angola é também o pais "onde os ricos expõem a sua riqueza mais exuberantemente. E isso poderá provocar uma explosão social. Esse perigo existe."

Em vésperas de eleições o MPLA parece reagir ao descontentamento, a avaliar pela retórica oficial do partido. "Crescer mais e distribuir melhor" - é este o slogan do partido de José Eduardo dos Santos nesta campanha eleitoral.

Será que o MPLA vai conseguir mais uma vez conquistar a confiança dos angolanos? Na Europa duvida-se da capaciade do partido do poder em levar a cabo reformas verdadeiras. Foram demasiados os casos e exemplos de má governação, denunciados a nível internacional: o fundo monetário Internacional, por exemplo, denunciou o desaparecimento de cerca de 42 mil milhões de dólares em receitas do petróleo angolano nos últimos 5 anos.

José Eduardo Agualusa é um dos mais conhecidos escritores angolanosFoto: Jordi Burch

ONG Open Society: Ninguém monitoriza a Sonangol

O governo angolano - é certo - rejeita as acusações, dizendo que com o dinheiro foram pagas obras públicas, mas nunca conseguiu especificar quais as obras nem conseguiu dizer concretamente quanto custaram.

Sizaltina Cutaia da ONG Open Society Angola lamenta que "em Angola não há possbilidades de saber números certos. Nem o ministério das Finanças nem o ministério do Petróleo têm controlo sobre como as receitas são administradas pela petrolífera pública Sonangol. Ninguém monitoriza a Sonangol neste momento e isso não está certo."

Manuel Vicente foi chefe da Sonangol e ocupa atualmente a pasta da economia no governo angolanoFoto: picture alliance/Lori Waselchuk

Carbono Casimiro: Queremos uma governação mais justa

O "rapper" Carbono Casimiro é considerado um dos jovens contestatários à liderança de José Eduardo dos Santos mais ativos em Angola. Ele é um dos interlocutores de alguns meios de comunicação social europeus, inclusivé da DW, e não se cansa de denunciar o facto dos membros do movimento juvenil de que faz parte estarem a ser "vítimas de repressäo por parte do regime angolano: "não sabemos até que ponto eles poderäo fazer mal a alguns de nós. Nós näo somos violentos, queremos apenas uma governacäo mais justa para esse povo que tanto merece.“

Manifestação contra o regime angolano em Benguela, Angola, em fevereiro de 2012Foto: DW

Movimentos juvenis utilizam telemóveis e redes sociais

Na Europa, o movimento juvenil angolano contra os 32 anos de regime ininterrupto de José Eduardo dos Santos é regularmente comparado à denominada "primavera árabe" que derrubou regimes aparentemente sólidos como o da Tunísia, do Egito ou da Líbia. Ao mesmo tempo reconhece-se que as manifestações em Luanda não atingem, nem de longe as dimensões registadas em 2011 no norte de África.

As autoridades reagem com repressão: Manifestação contra o regime angolano em Benguela, Angola, em fevereiro de 2012Foto: DW

Os protagonistas são jovens e usam alcunhas como "Libertador", "Mbanza Hanza" ou "Ikonoklasta". Comunicam via telemóvel e utilizam as redes sociais. As autoridades têm reagido de forma agressiva: com repressão, prisões e ataques físicos, perpetrados por milícias, alegadamente financiadas por círculos ligados ao regime angolano, segundo se pode lêr em diversos artigos sobre Angola publicados na Alemanha e noutros países europeus.

Luaty Beirão: Quero escorraçar o MPLA daquele trono

O Rapper Luaty Beirão - melhor conhecido pelos nomes artísticos de "Ikonoklasta" ou "Brigadeiro Matafrakus" - é outro dos jovens contestatários que dão regularmente entrevistas a meios de comunicação europeus. Com os angolanos própriamente ditos comunicam sobretudo através das suas músicas e de mensagens distribuidas nas redes sociais. Luaty Beirão - recorde-se - é filho de um destacado membro do MPLA e ex-chefe da Fundação Eduardo dos Santos: João Beirão. Conhece - como diz - muito bem o MPLA. No seu último comunicado distribuido na rede social facebook, não deixa dúvidas que o objetivo principal destas eleições para o movimento juvenil e estudantil de que faz parte, é o derrube do partido no poder: "Quero escorraçar o MPLA daquele trono. Eu cresci com eles aí e agora estou farto. Eu quero mudança. Eles criaram um sistema imundo, cheio de falhas, cheio de vícios, por isso eu voto contra o MPLA.“

A contestação e oposição ao regime angolano existe. E o facto não passa despercebido também fora de Angola. A verdadeira dimensão e influência dos movimentos de contestação ficará mais clara depois das eleições de 31 de agosto, dizem unânimemente os observadores.

Luaty Beirão "Rapper" angolano, mais conhecido pelos pseudónimos "Ikonoklasta" ou "Brigadeiro Matafrakus"Foto: Luaty Beirão

Autor: António Cascais
Edição: António Rocha


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