Política alemã de migração questionada na Feira de Frankfurt
21 de outubro de 2016A Feira do Livro de Frankfurt, a maior do mundo, decorre de 17 a 23 de outubro na Alemanha. É um mundo dentro de outro, pavilhões gigantes, corredores intermináveis, com um aparato de segurança a cada duzentos metros. É dominada por leituras, apresentações, debates e exposições, é também um lugar de contactos para escritores, editores, jornalistas e outros interessados. Foi num dos vários cafés do recinto que encontramos o etíope Antenen Kebede, organizador de feiras do livro no seu país e jornalista da TV Nahoo.
Está na feira a convite da embaixada alemã em Addis Abeba e não escondeu o seu deslumbramento: "Sinto-me muito pequeno, fiquei muito espantado em ver como o livro é repeitado neste continente e nes país, fiquei com uma inveja boa, queria o mesmo para o meu povo e para o meu continente. Não consigo explicar o que sinto..."
Migração, o assunto
Recentemente a chanceler alemã esteve na capital etíope, no fim de um périplo por alguns países africanos. Em Addis Abeba, Angela Merkel apelou à União Africana, lá sedeada, a cooperar para o fim da migração para a Europa. A nova política alemã para África está orientada para isso: estancar a migração. Os esforços não são poucos, afinal a pressão para isso na Alemanha é muito grande. O tema foi igualmente levado a feira do livro de Frankfurt, e mereceu grande destaque.
Para o jornalista etíope Antenen Kebede, o que hoje aflige os europeus é apenas uma consequência dos seus atos: "Coisas inesperadas acontecem e os problemas voltam para ti, é o que está a acontecer atualmente no mundo. Eles afetaram-nos quando retiraram os nossos recursos naturais no passado e não nos ajudaram a avançar no comércio internacional, nas políticas internacionais contra a pobreza e coisas do género. Os africanos são convidados a ser apenas receptores e não a sermos um continente competitivo. Por causa disso, o problema da pobreza e da educação não pode ser resolvido".
E Kebede conclui que "assim as pessoas emigram para países melhores na Europa, os EUA. Temos de parar de culpar".
Racismo e desigualdades é que são o problema
No stand de Portugal encontramos o alemão Michel Kegler. Ele é tradutor de obras literárias em língua portuguesa para o alemão. Domina a literatura dos PALOP e conhece bem os mais conceituados escritores. Tinha acabado de moderar um evento no stand. Mas o nosso interesse desta vez não era os PALOP, a migração era o assunto.
Michel Kegler está certo de que "a migração não é um problema. O problema é o racismo e desigualdade económica". E recorda uma passagem: "Alguém na televisão, num dos inúmeros debates, disse: somos um milhão de habitantes e chega um milhão, e eu duvido que sejam um milhão, mas dizem que são um milhão. Imagina uma festa com oitenta pessoas e chega mais uma, qual é o problema? O problema é a falta de boa vontade de uma parte dessa sociedade em lidar com isso. Nós temos um grande problema com fascistas e com burocracias. O resto é hipocrisia."
O tradutor não poupa críticas à nova política alemã contra migração e lembra que hoje, nos discursos, se torna difícil estabelecer a fronteira entre refugiados e migrantes. No final, o tema migração, ou refugiado, mesmo alargado ao contexto literário desemboca sempre em política. Uma política que aliás já trouxe custos políticos a chanceler Angela Merkel e ao seu partido, CDU.