É já uma triste tradição em Angola: populares são despejados das suas casas pelas autoridades e abandonados sem recursos. Aconteceu mais uma vez, no município da Baía Farta, em Benguela.
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Um total de 135 famílias viu-se desalojado das suas casas, no dia 15 do novembro, no sul da província de Benguela. Os despejos foram levados a cabo pelas autoridades locais sem comunicação prévia aos populares. Estes acabaram por ser transferidos para zonas montanhosas em condições indignas.
As famílias viviam no bairro atlântico, vulgo Maboque, que pertencia a uma fábrica estatal de conservas, paralisada há mais de 30 anos. O Governo Provincial de Benguela explicou que está a desalojar as famílias para dar lugar a um investimento privado. Mas a ação de despejo criou problemas graves aos habitantes.
O desespero dos desalojados
Um dos populares, Miguel Bento, disse à DW que foram transferidos para zonas montanhosas sem condições de sobrevivência: "Lá não há água, lá não há peixe. Há muita gente que vai dormir com fome. Há crianças a morrer de fome. Vou falar mesmo a verdade. A minha casa também foi partida".
Outra grande preocupação é a presença de animais venenosos, diz Miguel Bento: "Há muitos bichos, muita cobra e lacrau. Vou fazer como? A minha criança não pode dormir no chão. Estamos constantemente a matar cobras e lacraus".
Angola: Os contrastes de um gigante petrolífero
O "boom" do petróleo ainda não é para todos. Ao mesmo tempo que Angola oferece oportunidades de investimento a empresas nacionais e estrangeiras, mais de um terço da população vive com menos de um dólar por dia.
Foto: DW/R. Krieger
Lama no cotidiano
O bairro Cazenga é o mais populoso de Luanda – ali, vivem mais de 400 mil pessoas numa área de 40 quilômetros quadrados. Em outubro de 2012, chuvas fortes obrigaram muitos habitantes a andar na lama. Do Cazenga saíram muitos políticos do partido governista angolano MPLA. "Uma das prioridades de políticos pobres é a riqueza rápida", diz o economista angolano Fernando Heitor.
Foto: DW/R. Krieger
Dominância do MPLA
Euricleurival Vasco, 27, votou no MPLA nas eleições gerais de agosto de 2012: "É o partido do presidente. Desde a guerra civil, ele tenta deixar o poder, mas a população não deixa". Críticos dizem que José Eduardo dos Santos não cumpriu nenhuma promessa eleitoral, como acesso à água e à eletricidade. Mas o governo lançou um plano de desenvolvimento em novembro para dar esses direitos à população.
Foto: DW/R. Krieger
Economia informal em Angola
Muitos angolanos esperam riqueza do chamado "boom" do petróleo. Mas grande parte da população é ativa na economia informal, como estas vendedoras de bolachas na capital, Luanda. Segundo a ONU, 37% da população vivem com menos de um dólar por dia. Elias Isaac, da organização de defesa dos direitos humanos Open Society, considera este um "contrassenso" entre "crescimento e desenvolvimento".
Foto: DW/R. Krieger
Uma infraestrutura de fachada?
A capital angolana Luanda é considerada uma das cidades mais caras do mundo. Um prato de sopa pode custar cerca de 10 dólares num restaurante, o aluguel de um apartamento mais de cinco mil dólares por mês. A Baía de Luanda é testemunho constante do "boom" do petróleo: guindastes e arranha-céus disputam quem é mais alto.
Foto: DW/Renate Krieger
O "Capitólio" de Angola
Próximo à Baía de Luanda, surge a nova sede do parlamento angolano. O partido governista MPLA vai ocupar a maior parte dos 220 assentos: elegeu 175 deputados em agosto de 2012. Por outro lado, o MPLA perdeu 18 assentos em comparação à eleição de 2008. A UNITA, maior partido da oposição, ganhou 32 assentos em 2012 – mas tem pouco espaço...
Foto: DW/R. Krieger
O presidente no cotidiano de Luanda
…porque, segundo críticos, o presidente José Eduardo dos Santos (numa foto da campanha eleitoral) "domina tudo": o poder Executivo, o Judiciário e o Legislativo, diz o economista Fernando Heitor. José Eduardo dos Santos também parece dominar muitas ruas de Luanda: em novembro de 2012, quase todas as imagens eram da campanha do partido no poder, o MPLA.
Foto: DW/R. Krieger
Dormir nos carros
Os engarrafamentos são frequentes em Luanda. Por isso, muitos funcionários que moram em locais mais afastados já partem para a capital angolana de madrugada. Ao chegarem em Luanda, dormem nos carros até a hora de ir trabalhar – juntamente com as crianças que precisam ir à escola. A foto foi tirada às 06:00h da manhã perto do Palácio da Justiça em novembro de 2012.
Foto: DW/R. Krieger
A riqueza em recursos naturais de Angola
Angola é o segundo maior produtor de petróleo da África, mas também tem potencial para se tornar um dos maiores exportadores de gás natural. A primeira unidade de produção de LNG – Gás Natural Liquefeito, em inglês – foi construída no Soyo, norte do país, mas ainda está em fase de testes. A fábrica tem uma capacidade de produção de 5,2 milhões de toneladas de LNG por ano.
Foto: DW/Renate Krieger
Para acabar com a dependência do petróleo...
A diversificação da economia poderia ser uma solução, diz o Fundo Monetário Internacional (FMI). O governo angolano criou um fundo soberano do petróleo para investir no país e no estrangeiro, e para ter uma reserva caso haja oscilações no preço do chamado "ouro negro". Uma alternativa, segundo especialistas, poderia ser a agricultura, já que o petróleo só deve durar mais 20 ou 30 anos.
Foto: DW/R. Krieger
Angola atrai estrangeiros
Vêem-se muitas placas em chinês e empresas chinesas em Angola. Os chineses são a maior comunidade estrangeira no país. Em seguida, vêm os portugueses, que em parte fogem à crise económica europeia. Depois, os brasileiros, por causa da proximidade cultural. Todos querem uma parte da riqueza angolana ou investem na reconstrução do país.
Foto: DW/R. Krieger
Homem X Asfalto
Para o educador Fernando Pinto Ndondi, o governo angolano deveria investir "no homem e não no asfalto". Há cinco anos, Fernando e sua famíla foram desalojados da ilha de Luanda por causa da construção de uma estrada. Agora vivem nestas casas precárias. O governo constrói novas casas para a população. Porém, os preços, a partir de 90 mil dólares, são altos demais para a maior parte dos angolanos.
Foto: DW/Renate Krieger
Para onde vai o dinheiro?
O que aconteceu com 32 mil milhões de dólares lucrados pela empresa petrolífera estatal angolana Sonangol entre 2007 e 2011? Um relatório do FMI constatou, em 2011, que faltava essa soma nos cofres públicos. A Sonangol diz ter investido o dinheiro em infraestrutura. Elias Isaac, da Open Society, diz que o governo disponibiliza mais informações – o que "não é sinônimo de transparência".
Foto: DW/R. Krieger
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Laurinda Chivela, 61 anos, que vivia no bairro da Maboque desde 1979, também lamentou a forma como foram desalojados pelas autoridades sem aviso prévio: "Estamos a sentir-nos mal porque saímos de lá. Já não sabemos o que fazer".
Ao explicar a ação de despejo a jornalistas, o governador de Benguela, Isaac dos Anjos, disse que está prevista a construção de habitações para as populações: "As famílias vão ser retiradas dali para que lhes seja conferido maior conforto de serviço e de trabalho. Vivem em acampamentos coloniais, sem confortos, sem infraestruturas de saneamento básico. Estamos a construir um empreendimento de grande valia, com casas de banho, com incorporação de redes de pescas”.
Governador promete ajuda… para o ano
Quanto à falta de condições em que vivem as cerca de mil pessoas realojadas, o governador disse: "Se ficarem um tempo ao relento não faz mal, vale a pena o sacrifício para nós termos uma obra a ser apresentada ainda no decorrer do próximo ano". Acrescentou que gostaria de poder avançar já com as obras em dezembro, "mas não posso. Vou fazer no próximo ano".
As declarações do governador provincial, Isaac dos Anjos, não agradaram ao secretário do partido CASA-CE em Benguela, Francisco Viena, que acusou o Governo de ser insensível e desumano: "Infelizmente, o Governo, ao invés de criar primeiro as condições, desalojaram as pessoas, estão a viver ao relento, estão a submeter as pessoas ao abandono”. Para Viena, trata-se de uma violação grave dos direitos humanos: "Eu penso que o partido do Governo acaba de revelar que já não olha para as pessoas como seres humanos”, disse Viena à DW.