PALOPs vivem conflito e instabilidade económica mas poucos refugiados desses locais chegam à Alemanha. Conflitos económicos e políticos não têm o mesmo status de guerra, diz politólogo.
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A Alemanha vivencia uma das maiores ondas de migração de sua história e tem buscado adaptar sua política migratória. Apenas em 2016 foram 170 mil pedidos de asilo neste país. Mas apesar de alto, este número sofreu uma queda de 66% frente ao meio milhão do primeiro trimestre do ano anterior.
A maioria de refugiados vem de países árabes. Em entrevista à DW, o politólogo moçambicano Paulino Miguel, explicou porque há tão poucos refugiados lusófonos na Alemanha. Ele esteve em Bona, na Deutsche Welle (25.11), por ocasião do simpósio "Não deixar ninguém. A agenda 2030 como missão política e social a nível local" (tradução livre). Segundo o especialista:
"Da África lusófona têm chegado poucos refugiados porque estes países não estão em guerra. Embora haja mais refugiados angolanos do que moçambicanos devido à influência da República Democrática do Congo (RDC) e países vizinhos em conflito", diz Miguel.
O politólogo, também imigrante na Alemanha, vive nesse país há mais de duas décadas e chegou por meio de uma cooperação entre Moçambique com a antiga República Democrática da Alemanha (RDA). Atualmente, ele vive em Stuttgart, na Alemanha, e trabalha para o "Fórum das Culturas” (em tradução livre) com projetos sobre migração, diáspora e cooperação para desenvolvimento.
Política Migratória
A atual política de imigração para refugiados - que separa refugiados económicos dos refugiados de guerra, por exemplo - não deveria existir dessa maneira; acredita Paulino Miguel. Segundo ele "ser 'refugiado' já implica falta de direitos iguais”.
Quando um país está em guerra há zonas que não são diretamente afetadas pelos conflitos ou perseguições. Mas são afetados porque o negócio interno é destruído, as estradas tornam-se impossíveis de trafegar e a água não abastece todas as localidades.
"No caso da Síria, por exemplo, não se luta por toda parte. Porém, todas as pessoas que ali vivem são afetadas pelas dificuldades que surgem da guerra”, explica Paulino Miguel. Nestas circunstâncias as pessoas são indiretamente abrangidas pelas questões económicas e pela falta de infraestrutura.
Por isso, os refugiados de países em conflitos políticos e económicos poderiam ser melhor considerados nas políticas migratórias, acredita o politólogo. Nestes países, pessoas podem ser presas porque não há liberdade de imprensa ou chegam a morrer por causa da pobreza e "igualmente sofrem, pois há desigualdade", explica Miguel.
"O termo ‘refugiado' existe porque há desigualdade na sociedade – que sempre tem a ver com o poder que não se quer dividir. Vimos o exemplo concreto de Moçambique e Angola. Com as desigualdades ali existentes alguns são obrigados a deixar o país", explica.
Dinamizar a economia
28.11.2016 Refugiados lusófonos na Alemanha - MP3-Mono
Paulino Miguel reitera, por outro lado, a importância da ajuda para se dinamizar a economia de países em conflitos económicos, para além da cooperação internacional, que ajudariam a amenizar a saída de pessoas de seus países para tentar a vida Europa, por exemplo.
E, vivendo na Alemanha há mais de duas décadas, o politólogo moçambicano acredita que desde sua chegada muita coisa já mudou.
"Até os anos 2000 a situação dos refugiados aqui na Alemanha era muito difícil porque o país não reconhecia o estrangeiro como o faz hoje. Eles [estrangeiros] eram sempre vistos como pessoas apenas de passagem", conclui.
Refugiados: começar de novo no Uganda
Quem saiu dos países vizinhos para procurar uma vida melhor no Uganda pode construir uma casa, ter um emprego ou até ter um terreno só para si. Este é o resultado das decisões das autoridades do país.
Foto: DW/S. Schlindwein
Uma política liberal para os refugiados
O Uganda é um dos países com políticas mais liberais em relação aos refugiados. Cerca de meio milhão de pessoas de países vizinhos devastados pela guerra, como a República Democrática do Congo, Sudão do Sul, Somália ou Burundi, procuram abrigo no Uganda. Cerca de 100 pessoas chegam aos campos do sudoeste do país todos os dias.
Foto: DW/S. Schlindwein
Do Burundi ao Uganda, passando pelo Ruanda
Atualmente, refugiados, principalmente do Burundi, procuram abrigo no Uganda. Em julho de 2015, o burundês Pierre Karimumujango foi para o Ruanda, com a sua mulher e os seus três filhos. "Vivíamos em campos sobrelotados. É difícil conseguirmos ter estabilidade lá", diz. A partir daí, continuaram a sua viagem para o Uganda de autocarro.
Foto: DW/S. Schlindwein
Terem a sua própria terra
"Não tínhamos nada quando chegamos, sem ser as roupas que tínhamos no corpo", diz Karimumujango. O Alto Comissariado para os Refugiados das Nações Unidas deu-lhe utensílios de cozinha, vasilhas de água, tendas e alimentos. O Governo do Uganda deu um pedaço de terra a cada família, onde poderiam construir uma casa e cultivar alimentos. O agricultor burundês plantava mandioca.
Foto: DW/S. Schlindwein
Ajuda exterior
Os recém-chegados recebem roupa em segunda mão, geralmente doações da Europa. O Alto Comissariado para os Refugiados das Nações Unidas e várias organizações não-governamentais internacionais ajudam a fornecer bens aos refugiados. O Uganda é um país pobre e, sem ajudas, seria fortemente abalado pela grande onda de refugiados.
Foto: DW/S. Schlindwein
Uma cidade só para refugiados
O campo Nakivale no sudoeste do Uganda é o maior do país. Mais de 100 mil refugiados vivem numa área de cerca de 180 km² - é quase uma cidade. A terra, localizada na seca e praticamente inabitada savana, pertence ao Governo, que distribui as parcelas pelos refugiados, que podem construir as suas próprias casas.
Foto: DW/S. Schlindwein
Uma nova vida, junto aos compatriotas
Em Nakivale, os refugiados vivem em "distritos", de acordo com o seu país de origem. Desde o início da crise no Burundi no último ano, cerca de 22 mil burundeses procuraram asilo no Uganda. No campo de refugiados criaram uma "Pequena Bujumbura", batizada em honra à capital do seu país. Alguns deles vêm para o Uganda com todos os seus pertences e poupanças, para que possam começar uma nova vida.
Foto: DW/S. Schlindwein
Um novo mercado de trabalho
O centro de Nakivale é como uma pequena cidade: é possível encontrar carpinteiros, oficinas, alfaiates, cabeleireiros, lojas e farmácias. Muitos refugiados tentam retomar as profissões que tinham nos seus países de origem e há quem traga bens e ferramentas consigo e crie novos empregos.
Foto: DW/S. Schlindwein
Refugiados como fator económico
Um moleiro burundês trouxe consigo o seu moinho para o Uganda. Michel Tweramehezu, de 16 anos, também do Burundi, ficou feliz por encontrar um trabalho no campo. "Não há muito para fazer aqui", afirma. O Governo do Uganda vê os refugiados como um potencial ativo económico, não é necessário visto de trabalho. Tudo aquilo de que precisam é ter um papel ativo numa área económica.
Foto: DW/S. Schlindwein
As políticas poderosas da África Oriental
Yoweri Museveni, Presidente do Uganda, gosta de se apresentar como o 'avô da região' e mantém um conjunto de políticas fortes, onde os refugiados têm um papel de relevo. Ativistas da oposição e rebeldes dos países vizinhos estão no meio daqueles que procuram refúgio no Uganda, que está ciente das dimensões políticas das medidas que adota em relação aos refugiados.
Foto: DW/S. Schlindwein
Desporto contra o ódio
Nos campos, os conflitos continuam: os Hutus e os Tutsis, do Ruanda, continuam a viver em diferentes distritos de Nakivale. Desentendimentos ocorrem com frequência, e é aí que a polícia do campo tem de atuar e mediar. O desporto é uma das formas usadas para reconciliar os povos. As competições de breakdance, um centro para a juventude e uma estação de rádio também ajudam a reduzir a violência.
Foto: DW/S. Schlindwein
Escassez de quase tudo
Olive Nyirandambyza saiu do leste da República Democrática do Congo (RDC) em 2007. Cinco dos filhos da mulher com 38 anos nasceram em Nakivale. Ela recebe 50 kg de milho mensalmente do Programa Alimentar Mundial das Nações Unidas. "Muitas vezes, não é suficiente e o meu marido tem de ir até à cidade trabalhar para os ugandenses", diz. Falta-lhe sabão, produtos de higiene e medicamentos.
Foto: DW/S. Schlindwein
Nos campos, só há escolaridade básica
A maioria dos habitantes de Nakivale são crianças em idade escolar. Há seis escolas primárias públicas e gratuitas no campo, geridas pelo Estado. Não há escolas mais avançadas e os estudantes do secundário têm de percorrer grandes distâncias até à aldeia mais próxima. A escola é privada e a maioria das famílias não consegue pagar as propinas.
Foto: DW/S. Schlindwein
Gado como forma de rendimento
Alguns refugiados, como os Banyamulenge do leste da RDC, os Tutsi do Ruanda ou os do Burundi, trazem as suas cabeças de gado com eles para Nakivale. Nos campos férteis de erva que circundam o campo de refugiados encontram bastante alimento. Para muitas famílias, o gado funciona como contas bancárias vivas. Para pagar as propinas escolares, as vacas são vendidas no mercado de gado de Nakivale.
Foto: DW/S. Schlindwein
É difícil regressar a casa
Ndahayo Ruwogwa acredita que irá morrer no Uganda. Aos 69 anos, perdeu o seu braço direito durante a guerra na RDC, o seu país natal. Vive em Nakivale há 13 anos, com a sua família de 13 pessoas. "Ao menos, há paz no Uganda. Temos a oportunidade de ter uma nova vida", diz. "O meu país continua em guerra. Provavelmente, nunca poderei regressar".