José Langa, do Observatório Ambiental para as Mudanças Climáticas, estranha que Moçambique tenha sido excluído da cimeira de líderes sobre o clima. Os mais afetados deviam entrar neste debate, defende o ambientalista.
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Mais de 40 chefes de estados e governos mundiais participam da Cimeira de Líderes sobre o Clima convocada pelo Presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, que arrancou esta quinta-feira (22.04) e termina hoje.
Em vários países, ativistas ambientais acusam as grandes potências de inação para reduzir a emissão de gases de efeito estufa, numa altura em que as consequências das alterações climáticas já são assinaláveis em muitos países, como é o caso de Moçambique.
De acordo com o Índice de Risco Climático Global, publicado anualmente pela organização não-governamental (ONG) GermanWatch, Moçambique ocupa o primeiro lugar na lista dos países mais vulneráveis às alterações climáticas, depois de ter sido afetado em 2019 (último ano analisado) pelos ciclones Idai e Kenneth, que fizeram cerca de 700 mortos.
No próximo domingo (25.04) assinalam-se dois anos da passagem do ciclone Kenneth por Moçambique. O país também está em risco de ser atingido pelo ciclone Jobo, que poderá afetar principalmente a província de Cabo Delgado.
Os mais afetados deviam ser ouvidos
José Langa representante do Observatório Ambiental para as Mudanças Climáticas (ObservA), estranha que o país tenha sido excluído desta cimeira.
"É triste porque parece que os nossos apelos, de que mais sofre, não chegam a quem tem o poder. Mas era interessante que nós como os mais afetados entrássemos neste debate", diz.
O ativista defende que chegou a hora de os países mais poderosos olharem para as populações mais vulneráveis às mudanças climáticas.
"Não vamos parar de continuar a pedir socorro em relação às mudanças climáticas, investindo em estudos científicos que vão mostrando, o quanto estamos a sofrer, mas principalmente o descaso de quem provoca esta questão das mudanças climáticas", afirma José Langa.
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União contra o aquecimento global
No primeiro dia do evento, os líderes mundiais apelaram ao comprometimento de todos contra o aquecimento global.
O secretário-geral das ONU, António Guterres, desafiou os governos mundiais a tomarem a sério a questão das alterações climáticas. "O mundo está em alerta vermelho. Estamos à beira do abismo. Temos de ter a certeza de que o próximo passo está na direção certa. Os líderes de todo lado devem tomar medidas", apelou.
"Os sinais são inequívocos. O custo da inação continua a aumentar", reconheceu o anfitrião da cimeira, Joe Biden. O Presidente americano comprometeu-se a reduzir para metade a poluição de gases com efeito de estufa nos EUA até 2030. E lançou um apelo aos demais líderes mundiais. "Esta é a década em que temos de tomar decisões que evitem as piores consequências de uma crise climática."
A nova promessa de Biden veio depois de a administração Trump ter se retirado do Acordo de Paris sobre o clima. Os Estados Unidos voltaram a aderir ao acordo logo após a tomada de posse de Biden.
A chanceler alemã, Angela Merkel, assegurou que o seu país continuará a fazer a parte que lhe compete na luta contra o aquecimento global. "A Alemanha já reduziu as emissões de dióxido de carbono em 40% em relação aos níveis de 1990. Até 2030 queremos ter pelo menos 55% menos emissões do que em 1990", destacou.
Aquecimento global: Caminhamos para o fim da agricultura tradicional?
No Corno de África, países como a Eritreia estão a registar padrões meteorológicos cada vez mais irregulares, colocando em causa a subsistência dos agricultores.
Foto: DW/M. Belloni
Agricultura: um modo de vida
As alterações climáticas têm um impacto irreversível nas comunidades que dependem do ambiente natural para as necessidades básicas. Na Eritreia, estima-se que cerca de 80% da população são agricultores de subsistência, que cultivam principalmente sorgo, trigo e milho. Esses agricultores são vulneráveis a mudanças nos padrões climáticos, que podem devastar a produção de alimentos.
Foto: DW/M. Belloni
Colher fora de horas
Durante os últimos anos, a Eritreia, tal como o resto do Sudeste Africano, sofreu flutuações climáticas exacerbadas pela tendência de aquecimento dos oceanos, o chamado "El Niño". As chuvas caíram, inesperadamente, na Eritreia, em outubro do ano passado, o que levou o governo a aconselhar os agricultores a colherem mais cedo.
Foto: DW/M. Belloni
Stock de alimentação vulnerável
"Se não tivessem reagido, ou não tivessem reagido com base na colheita tradicional, provavelmente perderiam a colheita", diz Peter Smerdon, do Programa Mundial de Alimentos. Embora o "El Niño" seja um evento complexo e de ocorrência natural, pesquisas científicas sugerem que o aquecimento global fará com que este evento cíclico ocorra com mais frequência e intensidade.
Foto: DW/M. Belloni
Consenso sobre as alterações climáticas
A maioria das comunidades científicas concorda que mudanças significativas a longo prazo no sistema climático da Terra ocorreram e estão ainda a ocorrer de forma mais célere que no passado. Prevê-se que a continuação das emissões para a atmosfera terrestre provoquem um maior aquecimento, afetando África com temperaturas elevadas e aumentando a variabilidade sazonal das chuvas.
Foto: DW/M. Belloni
Consequências económicas globais
"As pessoas nos países mais ricos devem estar preocupadas com os efeitos da mudança climática no Corno de África", afirma Challiss McDonough, do Programa Alimentar Mundial. "A mudança climática é uma das principais causas da fome global, perdendo apenas para os países doadores. Por isso, investir no clima e na redução do risco de desastres faz sentido do ponto de vista económico".
Foto: DW/M. Belloni
Ainda de pé
A árvore de sicómoro tem um simbolismo significativo na Eritreia. Os anciãos costumavam reunir-se debaixo destas enormes árvores centenárias, para discutir questões importantes e leis comunitárias. Muitas destas árvores foram derrubadas durante a colonização e a guerra. As que ainda restam têm de enfrentar os efeitos da mudança climática.
Foto: DW/M. Belloni
Praias ameaçadas
"Um dos impactos das mudanças climáticas numa região costeira é a elevação do nível do mar, que aumenta a probabilidade de desastres relacionados com inundações, como marés altas, que podem eliminar uma safra inteira", diz Smerdon. Além disso, acrescenta, "a intrusão de água salgada devido à mudança climática pode aumentar a erosão e a salinidade dos solos, prejudicando a fertilidade da terra."
Foto: DW/M. Belloni
Corais em perigo
A costa deslumbrante da Eritreia inclui recifes de coral, um fator potencial de turismo, se sobreviverem no estado actual. "Até há alguns anos atrás, este pedaço de mar estava cheio de corais, mas no ano passado morreram todos", revela um mergulhador da Eritreia à DW. "A temperatura do mar estava muito alta. Ao mesmo tempo, os pescadores dependem dos recursos do oceano para comércio.
Foto: DW/M. Belloni
À procura de um caminho
As alterações climáticas na Eritreia são evidentes noutros locais. "Enquanto trabalhava na América Central, na África Oriental e no Médio Oriente, falei sempre com pessoas mais velhas, especialmente agricultores, e a mensagem deles é comum", diz Sam Wood, da Save the Children na Etiópia. "Os padrões climáticos estão a tornar-se menos previsíveis e, quando vem a chuva, é muito ou muito pouco."